Um desabafo: a semana académica
Esta é a minha última semana académica enquanto estudante (pelo menos deste curso). Já fui buscar a minha camisola, com um doloroso bordado de "finalista" na parte detrás - e os sentimentos em relação a isto são mistos e paradoxais; é a saudade e o alívio, a tristeza e a alegria.
Já há dois anos que digo "não" a todos os meus amigos e colegas que tentam arrastar-me para todos os rituais académicos praticados durante esta semana. Mas este ano - precisamente por ter "finalista" bordado na camisola - os incentivos foram maiores que nunca e vieram de todas as frentes. Para ir à queima, para ir à missa, para ir à serenata, para ir ao cortejo. Durante dois anos resisti a tudo, com todos os argumentos que tinha na manga e que, para mim, eram mais do que suficientes para não marcar presença. Mas este ano toda a gente parece querer dar-me o pack de finalista completo, com tudo o que tenho direito - mesmo que isso vá contra tudo o que sempre tenha dito até aqui.
E eu confesso: sinto-me frágil o suficiente para ceder à cadeia dos "não's" que tenho vindo a utilizar até aqui. As razões que vivem em mim para negar tudo o que tenho vindo a negar continuam mais do que válidas, mas também sinto que os outros acabam por desistir de mim por causa disso - e eu não os posso condenar. É chato estar sempre a convidar alguém para algo e essa pessoa estar continuamente a rejeitar. E também sei que quando me dizem que querem que eu tenha "uma experiência universitária completa" (a coisa que mais tenho ouvido na última semana), o dizem de coração e com a maior das boas vontades - só se esquecendo que é precisamente contra a minha vontade, contra aquilo que sou, contra aquilo em que acredito.
Ainda assim e por toda a avalanche de mensagens que recebi sobre isto, este ano abri a brecha para deixar entrar novas experiências e para poder dizer a todos: "pronto, eu fui!". Vou o cortejo por minha vontade, algo que já tinha prometido o ano passado, mas nunca me passou pela cabeça ponderar sequer ir à Queima das Fitas. E a verdade é que, por estes dias, tenho pensado nisso - por ser o meu ano de finalista e nunca ter posto lá os pés (e não tencionar voltar), por ter tanta gente a dizer-me para ir e viver a experiência, por (surpreendentemente) quererem a minha companhia e porque, de facto, já me sinto mal por despejar tantos "não's" por tantas aldeias. Ainda não me decidi, com todos estes prós e contras a puxarem por mim em sentidos opostos, e porque sei que - no fundo - farei isso pelos outros e não por mim; porque sei que, na noite em que for, vou chegar a casa doente e revoltada com o que vi, triste por não ter conseguido viver o momento como os outros que me rodeiam e por me sentir permanentemente um estorvo chato para os que me acompanham, que não sabe desfrutar este tipo de momentos na sua plenitude. Este ano é a queima, mas noutros anos - em que as minhas convicções e crenças não eram tão fortes e eu cedia com mais facilidade - foi outra coisa qualquer: e o resultado era sempre, sempre o mesmo. Até ao dia em que decidi que não valia a pena tentar mais.
Mas tendo em conta que abri a possibilidade, cada um me vai dando os seus pareceres e opiniões. Quem me conhece diz-me para ir com amigos, com quem confio e que partilhem um pouco da minha mentalidade - mas o que as pessoas em geral não parecem perceber é que eu não gosto de todo o ambiente criado à volta deste tipo de eventos, em que a "diversão" não é sequer a palavra de ordem: é o álcool, são as drogas, é a degradação em estado puro. Tudo meios para atingir um fim que eu não entendo mas que me vejo obrigada a respeitar - e sou muito mais feliz desde que, a partir de há uns meses para cá, "deitei a toalha ao chão" e desisti de "evangelizar" as pessoas neste sentido. Hoje em dia não me pronuncio sobre o culto do álcool e das drogas, até porque a maioria das pessoas com quem me dou sabem a minha posição - e, neste momento, só peço que me respeitem a mim como eu tento fazer com os outros.
Hoje, quando levei a minha novíssima camisola de curso para o escritório e as minhas colegas se aperceberam que era para esta semana académica, começaram logo a divagar sobre os "bons tempos" em que se perdiam entre shots naquelas barraquinhas. Vi-me obrigada a dizer que nunca tinha ido à queima e que, ainda para mais, não bebia álcool. Senti, nos olhares de algumas delas, algum julgamento (para além da óbvia surpresa) - como quem diz "olha mais uma mosquinha morta". Para mim, foi como pôr álcool em cima de uma ferida que já há algum tempo estava esquecida.
Faço-me rodear de tão pouca gente que todos eles acabam por saber a minha posição em relação a tudo isto; sabem que não vale a pena explicar, que não vale a pena tentar demover-me e, acima de tudo, que tudo isto é movido por razões pessoais suficientemente poderosas e dolorosas para as minhas convicções nunca se deixarem abater. E hoje, explicar tudo de novo - por superficial que essa explicação tenha sido - para pessoas que ainda me conhecem mal, mexeu realmente comigo. É fácil conquistar as pessoas quando se é "fixe", quando se tem comportamentos que estão na moda e são comuns e aceites; seria muito melhor eu dizer que me ia embebedar na queima e que tinha comprado o passe semanal e fazer com que todas elas me mostrassem e contassem os seus momentos loucos dos seus "bons velhos anos". Mas não. Eu sou a conservadora, a chata, a "idosa" daquele escritório, que em vez de beber mais álcool numa semana do que elas bebem num mês, bebeu menos álcool na vida inteira do que elas bebem numa semana. Nesta faceta, sou uma "mosquinha morta". E nestes dias, em que olham para mim só por este meu lado conservador, dói-me particularmente a alma. Porque eu sou muito mais que tudo isto.