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Entre Parêntesis

Tudo o que não digo em voz alta e mais umas tantas coisas.

05
Nov22

Santorini, a ilha instagram

Foi em grande parte por causa das ilhas gregas que escolhemos este cruzeiro. Na verdade, a ideia era já o termos feito: em 2020 tínhamos marcado, com a Celebrity Cruises, um cruzeiro com uma rota muito semelhante a esta, que iríamos fazer com os meus pais, mas que acabou por ser cancelado devido ao Covid. Dois anos depois decidimos apostar no mesmo cavalo - ainda que numa empresa diferente e numa viagem só a dois - e foi da maneira que tivemos uma experiência diferente.

A primeira de quatro paragens na Grécia seria Santorini - talvez a ilha com mais hype de todas. E eu, que não gosto de criar suspense, vou pôr já as cartas em cima da mesa: Santorini é uma ilha ao bom estilo das influencers de instagram. Porque vive da imagem e não do conteúdo; porque é bonita para a foto, mas fraca na vivência - e implica que se escolha bem o ângulo, para não vermos a realidade. Foi, para nós, a maior desilusão de toda a viagem.

O cais do porto de Santorini não é grande o suficiente para albergar um barco como o que viajamos, por isso o navio fica ao largo da ilha e as pessoas vão saindo em tranches, através de botes, para chegar até terra. Isto já não era novidade para mim - no cruzeiro anterior, quando parámos no Montenegro, já tinha acontecido o mesmo. A saída do navio é, por isso, mais demorada e complicada - mas muito pior é o que vem a seguir. Enquanto percorremos, de barquinho, as centenas de metros que nos separam de terra, vamos namorando aquela escarpa enorme, pintada de branco, que se estende à nossa frente. A questão é como chegar lá acima.

 

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A vista do navio para a ilha. Ligeiramente à esquerda pode ver-se o topo cheio de casas brancas - e, com zoom, percebem o caminho que pode ser feito na escarpa para chegar lá acima

 

Mal aportamos é difícil gerir o caos de pessoas que se forma num espaço tão pequeno. Mas rapidamente se percebe que para ir para o topo da ilha só há três soluções: ou se vai de teleférico, cuja fila de espera naquele momento rondava uma hora (para se ter uma noção, transporta cerca de 35 pessoas a cada 4 minutos - o nosso barco tinha 4 mil passageiros, por isso é só fazer a conta); ou se vai de burro, por uma escadaria íngreme; ou se sobe, a pé, através dessa mesma escadaria. Como queríamos aproveitar o tempo da melhor forma possível (e por isso não tencionávamos esperar na fila) e a subida de burro estava totalmente fora de questão, escolhemos a terceira opção. A penantes. E que mau que foi.

Primeiro porque é duro: tanto eu como o Miguel estamos em boa forma física, mas subir 600 degraus debaixo de mais de 30ºC, sem sombras e na hora de pico do calor, foi muito complicado. Segundo porque as condições da escadaria são más, tanto ao nível da infraestrutura (muito escorregadias) como de limpeza. O que nos leva ao terceiro ponto, porque é lógico que os pobres burros e cavalos defecam e urinam pelo caminho sendo que, com aquela temperatura, todos os cheiros ficam ainda mais intensos (outra coisa que não passa pela beleza do instagram), tornando-se nojento e intolerável passar em alguns locais com as narinas abertas. Já para não falar do quão degradante é ver aqueles animais a serem obrigados, de forma consecutiva, a subir e a descer aquela ravina - cansados, extenuados, a suarem do pêlo como se de gente escrava se tratasse. É degradante, triste e perigoso - até porque aqueles cascos gastos e maltratados, em conjunto com a pedra polida das escadas, faz com que os bichos escorreguem enquanto descem as escadas. Isto para além das vezes em que passam por nós desgovernados, obrigando toda a gente a desviar-se e encostar-se à parede se não se quer ser "passado a ferro". Evitei, sequer, olhar para eles - porque, honestamente, as lágrimas vinham-me aos olhos, e eu nada podia fazer a não ser boicotar aquele tipo de negócio, que devia mesmo ser proibído. Que se lixem as tradições: aqui em Portugal também achavam muita graça a pôr espetos em touros e agora vê-se cada vez menos este tipo de espetáculos. Era bom que as entidades competentes ganhassem tomates e acabassem com este tipo de negócios de uma vez por todas - e dotassem a ilha de serviços e estruturas competentes, não dependentes de animais, já que não estamos no século XIX.

E isto leva-me à primeira conclusão que tirei sobre esta ilha: Santorini não tem condições para receber barcos daquela dimensão. Não tem estrutura para escoar tanta gente. E, como cereja no topo do bolo... não tem razões para receber a quantidade de pessoas que recebe por ano. Se possui umas águas com um azul incrível? Sim. Se tem uma baía muito bonita que dá gosto apreciar? Também. Se reúne muito mais que isso? Não, de todo. Vale tanto como um photo stop numa qualquer cidade bonita: vale a pena a paragem para tirar a foto, mas depois segue-se viagem. Daí ser, para mim, a ilha instagram.

 

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Uma das primeiras imagens que se tem da ilha, e a mais triste: a exploração dos burros e dos cavalos para subir a escarpa

 

Aquela subida acabou por condicionar todo o tempo que passamos na ilha: serviu-me de muito pouco a boa forma física, porque como a grande maioria dos turistas, acabei a escadaria a parecer que estava em fase final de trabalho de parto, a respirar com dificuldade e a ver se conseguia um bocadinho de ar extra que me enchesse os pulmões, me baixasse o ritmo cardíaco e me fizesse parar de suar em bica. Não o sabia, mas entre o esforço e o sol em excesso, penso que apanhei uma insolação, que me deitou para a cama horas a fio no dia seguinte, como se um camião me tivesse passado por cima. 

A verdade é que chegamos rabugentos e com a mente pouco aberta para a "pobreza" que encontramos lá em cima. O final da escadaria é uma espécie de marina de Vilamoura em forma de ruelas estreitas: lojas de souvenirs e roupas, cafés e restaurantes. Denominador comum? Os preços e pouca simpatia. Foi o sítio mais caro onde estivemos: ímans a cinco euros, coca-colas a sete (das pequenas!), roupas e joias que nem valia a pena espreitar a etiqueta. Se quisessem parar para ganhar fôlego junto a um montra, vinham logo perguntar se estavam interessados em algo - se a resposta fosse negativa, pediam rapidamente que desimpedissem o caminho a outros que fossem potenciais compradores. Horrível.

Em todos os guias turísticos a cidade de Oia é a que tem mais destaque - mais do que a cidade, o seu pôr-do-sol (mais uma vez, tudo para o instagram). Mas de Fira, onde aportamos - que se situa mais ao menos a meio da ilha - até Oia, que fica no extremo, ainda é meia hora de carro - e as irrigações dos transportes públicos são muito fracas em Santorini. E se há coisa que é sagrada, num cruzeiro, são as horas: não pode haver derrapagens, sobressaltos ou problemas. Todos os (potenciais) problemas, atrasos ou sustos têm de ser antecipados; as coisas têm de ser obrigatoriamente feitas com tempo e temos de dar margem para que algo possa correr mal - e, ainda assim, chegarmos a tempo do "all aboard". Havia gente nos grupos de facebook do cruzeiro a ponderar ver o pôr-do-sol em Oia, mas para nós estava mais do que fora de questão (na verdade, acho que não foi sequer exequível, uma vez que o pôr-do-sol era ainda muito tardio na altura, mas não fui testemunha de alguém ter ficado fora do barco só para poder tirar a foto mais famosa de toda a Grécia). Podíamos ter feito uma visita guiada mas, para apenas uma tarde (só chegamos à ilha pelas 14h e tínhamos de sair antes das 21h), o conteúdo das tours e o seu preço elevado (como tudo naquela terra), preferimos abdicar da visita a esta parte da ilha e ficar por Fira, a capital.

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O nosso barco naquela baía que rodeia a ilha de Santorini

 

Dos vários guias que pesquisei nas semanas anteriores à nossa partida, nenhum tinha um roteiro definido ou prático do que visitar - mencionavam algumas igrejas (todas as que encontramos estavam fechadas, com excepção de uma), o vulcão (Nea Kameni, uma ilha vulcânica com baías de água quente, que não tínhamos tempo de visitar), a "rua dourada" (Ypapantis street) onde se encontram as lojas mais caras da região e pouco mais. Posto isto, optamos simplesmente por ir andando e nos perdermos nas ruelas da cidade, para tentarmos entender qual era a magia de tudo aquilo - e a razão pela qual tanta gente gostava daquela ilha.

A verdade é que não percebemos. É de facto bonito ver a escarpa pintada de branco, cheia de edifícios caiados, que contrastam com aqueles azuis, do céu e a água, cada um mais puro que o outro. Mas é isso - e praticamente "só isso". O outro lado da ilha - que erradamente, como todas as outras pessoas, não fotografei por sentir que não era "conteúdo fotografavel" - é árido e quase desértico, sem interesse ou beleza natural. A vertente cultural... é quase inexistente. O que é que se faz em Santorini? Come-se em restaurantes onde se paga a peso de ouro? Apanham-se banhos de sol em páteos de dez metros quadrados, onde depois teremos a oportunidade de nos refrescarmos num tanque a que chamam piscina, com quatro metros quadrados? É para isso que se paga milhares de euros por semana? É para podermos ter uma foto numa piscina infinita, em cima daquela escarpa, apanhando a água e um bom bocado da ilha - e se calhar fazê-lo ao pôr-do-sol, para termos a certeza que vai ser a foto com mais likes do ano? É um fenómeno que não entendo. 

 

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A cúpula de uma igreja - dos ex-libris da ilha por terem as suas cúpulas pintadas de azul

 

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E escarpa pintalgaa de branco, com os edifícios caiados, seus páteos e piscinas

 

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O interior de um hotel típico em Santorini: um páteo com cadeiras para apanhar sol e um tanque para tomar banho; havia outros maiores, com piscinas decentes, mas a maioria era deste género

 

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Gostamos de ver as igrejas com as cúpulas azuis, de tirar algumas fotos bonitas e de apreciar as vielas quase labirínticas de Fira, mas depressa nos cansamos - até porque o sol não deu tréguas e tornava muito difícil o passeio, numa cidade onde as sombras quase não existiam. Ainda parámos para beber uma coca-cola num restaurante e demos uma última volta na praça Theotokopouloue, onde visitamos a Catedral Ortodoxa, que é pequena mas bonita. Depois, sem grande vontade de continuar por ali perdidos e desta vez já sabendo ao que íamos, decidimos descer os 600 degraus, desta vez que de forma pausada, sem pressas e apreciando a vista e o caminho - desta vez bem mais calmo, dada a hora e o fluxo de turista que já havia diminuído drasticamente.

 

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O exterior da Catedral Ortódoxa, na praça Theotokopouloue

 

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No interior da Catedral Ortodoxa

 

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Detalhe da cúpula no interior da Catedral Ortodoxa

 

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Os burros só fazem cerca de 85% a 90% da escadaria - o restante tem mesmo de ser feito a pé, percorrendo todas as lojas e restaurantes. Aqui vê-se o topo da "fila", na parte de cima da escarpa, com os donos dos burros à espera de negócio

 

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A fila alonga-se durante muitos metros - e muitos degraus. São centenas de burros e cavalos que são explorados para este negócio. Na foto, atrás, consegue ver-se o teleférico

 

E assim terminou a nossa breve passagem por Santorini, que só me faz destacar aquilo que para mim é mais uma das melhores coisas dos cruzeiros: nos sítios que não gostamos de conhecer e visitar, há sempre a hipótese de ficar dentro do barco e de desfrutar de todas as atividades que eles lá oferecem (na verdade, pelos grupos do facebook, apercebemo-nos que esta é uma paragem que muita gente "dispensa" - e agora percebemos porquê). Para além disso, como Santorini é caro, é também um bom exemplo das muitas vantagens que se tem em fazer este estilo de viagem - conseguimos ter uma ideia do que a ilha tem para oferecer e não fomos obrigados a pagar um balúrdio pela estadia (e acreditem - os hotéis são caríssimos!), a pagar restaurantes (almoçámos e jantamos no barco) nem a ficar mais tempo em terra do que aquele que achamos necessário. Quando ficámos cansados, apanhamos o bote de volta ao barco e demos como finalizado este ponto de paragem. 

Acho que é perceptível que não ficamos fãs de Santorini, mas por tudo o que mencionamos acima, foi óptimo tê-la conhecido no âmbito de um cruzeiro - até porque, na verdade, era um destino que nos aguçava a curiosidade e que já tínhamos até posto em cima da mesa para passar umas férias mais longas. Foi da forma a que não viemos ao engano, ficando ao mesmo tempo a conhecer mais um destino - e, no final de linha, podendo riscá-lo da lista dos futuros planos de férias. Poder fazê-lo sem gastar nenhuma fortuna nem muito tempo foi como matar dois coelhos de uma só cajadada - algo que já me tinha acontecido com a Finlândia (que também não adorei...) e que se tornou, rapidamente, numa das coisas que mais gosto neste estilo de férias.  

 

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A descer todos os santos ajudam - mas, mesmo assim, custou bastante - os joelhos que o digam, de tanta tração que fizeram!

 

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No bote que nos levaria de regresso até ao barco. Até sempre, Santorini!

22
Out22

Roma, uma cidade com história em cada esquina

Quem me segue há alguns anos sabe que sou uma grande adepta de cruzeiros. Já tinha feito dois - podem ler tudo o que escrevi sobre eles na através das duas tags que criei na altura, "Cruzeiro no Báltico" e "Cruzeiro no Adriático" - e convenci o Miguel a fazer aquele que foi o meu terceiro (o primeiro dele). Não foi fácil inicialmente, pois este estilo de viagem tem sempre colada a ideia de que é para velhos e é tudo uma chatice - mas depois dos meus vastos relatos lá o convenci. Acho que a fase que atravessávamos jogou a meu favor: apesar de, algures em Abril, o fantasma do Covid já estar mais esbatido, o setor dos cruzeiros ainda atravessava uma fase muito crítica devido à pandemia; penso que todos nós nos lembrámos de ver nas notícias o terror que foi quando houve surtos em vários navios e isso marcou amplamente o ramo da navegação. Os barcos passaram mais de um ano parados e altamente condicionados nas suas rotas, tendo um prejuízo gigante. Isso fez com que, na altura em que os países começaram a levantar as barreiras, eles estivessem em ânsias para vender passagens - e, para isso, fizeram grandes promoções, nomeadamente para os cruzeiros de 2022, que já estavam ali ao virar da esquina e cuja incerteza ainda batia à porta. Ainda hoje há boas promoções - se querem fazer uma viagem destas, continua a ser uma boa altura para aproveitar - mas dada a altura em que marcámos, conseguimos fazer um óptimo negócio.

A parte difícil veio depois: escolher. Primeiro a rota, depois a companhia. Se já leram o texto sobre as Maldivas, devem ter percebido que o Miguel é extensivo nas pesquisas que faz, querendo sempre que tudo corra pelo melhor; para isso procura e retira tanta informação sobre as opções disponíveis que, a certa altura, nem sabe o que fazer com tudo o que recolheu. Eram vários fatores que queríamos conjugar: ele queria navegar num barco grande e recente, eu queria viajar numa companhia com a qual tivesse confiança. Para além disso, gostava que um de nós ficasse a conhecer, pelo menos, um sítio novo. Apontámos logo para o Mediterrâneo - o que, apesar de excluir logo uma série de hipóteses, não ajuda imenso, pois é dos locais mais navegados, com imensas opções de rota. Fomos atraídos pela ideia das ilhas gregas e, pouco depois, decidimos navegar no Escape, da Norweiggian Cruise Line, companhia da qual eu já tinha recebido boas referências. Eu já tinha navegado com a Royal Caribbean e a Celebrity, por isso achei que seria bom ter mais uma empresa no repertório - e a verdade é que gostamos muito. Como disse acima, usufruímos de uma série de boas promoções; todas as companhias tinham campanhas, com diferentes ofertas, mas quase todas interessantes e algo semelhantes. No nosso caso, com a marcação de um quarto com varanda a um preço mais simpático que o habitual, ainda conseguimos extras como 150 minutos de internet (que, no barco, é paga a preço de ouro), desconto de 50% em excursões para um dos viajantes, dois jantares em restaurantes temáticos (pago aparte), o pack mais barato de bebidas, que permitia que bebêssemos "à pala" qualquer bebida até um determinado valor (que felizmente incluía Coca-Cola, a única bebida que ingerimos para além da água durante todo o cruzeiro) e, não menos importante, as viagens de avião. Quanto à rota, partiríamos de Roma e zarparíamos logo para a Grécia, onde após um dia de navegação (e supostamente o único), visitaríamos Santorini, Atenas, Mykonos e Corfu - e eu faría o meu "check" na Grécia, país onde nunca tinha ido; depois pararíamos em Malta e, a seguir, partíamos para a parte italiana do cruzeiro, em que o plano era atracar em Messina, na Sicília, depois em Nápoles e por fim Livorno (para eventualmente visitar Florença). Como lerão nos textos seguintes, este roteiro sofreu alterações - e não foram para melhor. Mas "first things first".

A viagem começou de Roma, onde fomos com pouca coisa planeada - gosto sempre de ter roteiros feitos e prontos antes dos passeios, mas nenhum de nós conseguiu dedicar o tempo que queria a esta causa. Nas semanas anteriores eu tinha recolhido informação sobre os sítios onde íamos passar (o que visitar, onde comer, etc.) , mas nunca cheguei a tempo de fazer uma lista ou um top dos locais a visitar. Foi tudo muito em cima do joelho e isso stressou-me - assim como o facto de já não estar habituada à pressão temporal que um cruzeiro acarreta, pois são poucas horas em cada sítio e é preciso estabelecer prioridades e fazer escolhas. Na noite anterior a partirmos para Roma, sentamo-nos hora e meia no sofá e, com recurso aos guias que tinha recolhido, fizemos um roteiro onde tentamos optimizar o tempo e as pernas, vendo o maior número de monumentos que conseguíssemos e andando o menos possível (e, como tal, "perdendo" menos tempo entre locais de interesse). Quando nos fomos deitar, a cabeça não me deixou sossegar: porque devia ter marcado mais uma noite em Roma, porque o nosso roteiro era demasiado ambicioso tendo em conta o tempo que tínhamos, porque assim não íamos ter tempo para ver nada de forma decente e "ai que não sei quando é que vou voltar a ter oportunidade de visitar Roma, devia ter planeado isto com mais tempo, que negligente". Enfim, foi um desassossego. Isto aliado ao facto de estarmos a atravessar, à época, umas noites quentíssimas, de nos termos de levantar às 4h da manhã para ir para o aeroporto e - sejamos sinceros - por eu estar em ânsias por fazer finalmente mais uma grande viagem, só dormi um par de horas na noite que antecedeu a partida. Foi um pontapé de saída mais complicado, mas que nas horas seguintes não viria a ser facilitado.

Como os nossos vôos foram marcados pela companhia de cruzeiros não tínhamos em nossa posse as reservas completas, apenas os dados base que serviriam para fazer o check-in no aeroporto. Faríamos escala em Madrid, num vôo operado pela AirEuropa, e seguiríamos para Itália pela Alitalia - foi a nossa estreia em ambas as companhias. As escalas não eram generosas em termos de tempo, mas exequíveis. Pior foi quando chegámos ao aeroporto e se abateu um nevoeiro cerrado, que começava a atrasar vôos de forma sucessiva. Pior: por alguma razão que nos é alheia (e que, supostamente, também era ao funcionário que estava no balcão), não nos conseguiram fazer o check-in para Roma. Tentamos fazê-lo online, ligámos para o apoio telefónico da companhia, mas nada feito: ninguém conseguia dar a nossa entrada no avião. As indicações que nos deram foi para ir aos balcões das companhias, quando chegássemos à capital italiana, de forma a resolver o problema - mas, para isso, era necessário chegar a tempo e não perder o avião. 

E apesar de termos saído com uns 45 minutos de atraso no Porto, conseguimos: fomos dos primeiros a sair do avião e fomos a abrir até ao balcão da companhia mais próxima... que estava fechado. Interpelamos umas hospedeiras de bordo, que nos sugeriram ir para a porta de embarque e falar com as colegas que lá estivessem; pelo caminho ainda parámos num balcão de informações, onde nos disseram perentóriamente que tínhamos de sair da zona de embarque, fazer o check-in normalmente, passar de novo na segurança e embarcar - o que, no tempo que tínhamos, era digno de um filme Missão Impossível. Decidimos arriscar e esperar na fila para o vôo - e quando as hospedeiras chegaram, traziam dois bilhetes na mão. Eram os nossos. Não sei se foi o funcionário do guichê em Portugal que fez chegar a mensagem ou se foi pelo telefonema para a central, mas alguma coisa aconteceu ali para nos trazerem os bilhetes. Foi um alívio - e, pelos vistos, não é uma situação pouco comum, pois dizem que as plataformas da AirEuropa e da Alitalia não são compatíveis, apesar de terem uma parceria (e ambas deitam as culpas uma à outra pelo sucedido). Como de costume, quem fica a perder somos nós - e, se tivéssemos feito o que nos haviam sugerido, provavelmente teríamos perdido o avião. Não foi uma situação simpática e fez-me ficar com muito pouca vontade de voltar a voar nestas companhias.

Mas a verdade é que chegámos a Roma - e, connosco, a mala de porão (uff, um alívio!). Ainda no aeroporto comprámos bilhetes para o Leonardo Express, que faz sem paragens a ligação entre o aeroporto e o centro da cidade. No dia anterior, para além da rota apressada, tínhamos também tratado de comprar bilhetes para o comboio que, no dia embarque do cruzeiro, nos levaria do terminal central de Roma até Civitaveccia, onde estava atracado o nosso barco; no entanto, como não sabíamos ao certo as horas a que aterraríamos (entre atrasos e malas, nunca se sabe com o que contar), preferimos adquirir o bilhete na zona das chegadas do aeroporto. A compra foi rápida e prática, assim como a viagem, que foi muito tranquila e surpreendentemente silenciosa.

Chegados a Roma Termini, seguimos a pé para o nosso hotel. Marcamos um sítio próximo desta zona de forma propositada, para estarmos com boa acessibilidade ao metro e aos comboios - é uma prática que costumo ter, mas precavenho-me sempre, pesquisando sobre a zona em questão. Por alguma razão que desconheço, as redondezas de muitos terminais de comboios não são propriamente simpáticas, sendo locais muitas vezes "mal frequentados", onde prevalece um sentimento de insegurança. Daquilo que pesquisei, não é o caso de Roma - e como tal decidimos ficar num hotel que ficava a cerca de 15 minutos a pé (embora não aconselhe que o façam - os passeios e estradas ali à volta não estão preparadas para quem traz malas grandes - de tal forma que, à ida, preferimos ir de táxi), o The Radical Hotel. Ao contrário da maioria dos hotéis na capital italiana, não tem uma traça antiquada; embora eu ache graça ao estilo clássico, confesso que nem sempre me inspira confiança (vem-me sempre o cheiro a velho à memória, com a qual não simpatizo), pelo que preferimos um hotel atual e que nos pareceu prático e bem localizado. Fica num segundo andar de um prédio antigo, com direito a elevador de ferro e a um terraço comum com os outros moradores do edifício; o quarto era pequeno mas confortável, a casa de banho era grande tendo em conta o tamanho da habitação. O pequeno-almoço foi servido no quarto e o serviço foi muito amistoso. Gostámos.

Depois de pousarmos as malas demos início ao roteiro que havíamos traçado no dia anterior - fizemos apenas uma paragem antes de começarmos a caminhada, para recuperarmos energias de uma noite mal dormida e de uma viagem atribulada: estava na hora de comermos alguma coisa. Por sorte, percebemos que uma das pizzarias mais bem cotadas das redondezas era literalmente abaixo do nosso hotel. Era o sítio mais humilde e mais mal decorado da cidade, mas acreditamos que seria bom; eram 16h, o restaurante estava às moscas, mas aceitaram servir-nos, naquele que foi um maravilhoso lanche ajantarado, numa das melhores pizzas que comi na vida (também podia ser da fome... nunca saberemos!). Escolhemos um pouco às cegas, uma vez que o menu estava em italiano e a funcionária também não falava outra língua - mas, pelo que percebemos, comemos a verdadeira pizza romana - com uma massa estaladiça e salgadinha, sem tomate (adorei esta parte!), com um formato retangular e claramente maior do que o necessário para uma só barriga, com o fiambre frio colocado no topo.. e comida à mão. A verdade é que estava óptima - e nós saímos com as energias renovadas. O restaurante chamava-se Habemus Pinsa.

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O início do nosso roteiro era na Appian Line, o ponto mais próximo do nosso hotel. Esta foi a primeira auto-estrada do mundo, que ligava Roma ao porto de Brindisi. Não sei se fomos induzidos em erro pelo Google Maps, mas parámos numa rua normal - ou pelo menos assim nos pareceu. Supostamente há um parque arqueológico com alguns monumentos, mas passou-nos ao lado. Como não tínhamos tempo a perder com grandes pesquisas e este não era um dos pontos obrigatórios, seguimos caminho para a próxima paragem: a Basílica Santa Maria Maggiore. A entrada é gratuita. É uma igreja bonita (embora os assentos sejam horríveis, muito pouco consonantes com o ambiente de toda a igreja e estraguem um pouco a sua imagem) com uma capela particularmente vistosa e, acima de tudo, com uma cripta invulgar, que ainda por cima é visitável. É a maior das 26 igrejas em Roma dedicadas à Virgem Maria.

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Numa secção aparte da igreja principal, com uma cúpula muito bonita

 

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Dentro da cripta, onde se encontra uma enorme estátua de Pio IX em forma de túmulo

 

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Dentro da Igreja de Santa Maria Maggiore

 

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Fachada de Santa Maria Maggiore

 

Dali partimos para o grande marco de Roma: o Coliseu. Pelo caminho passamos pelo Monte Ópio - um grande parque público com aquilo que, à primeira vista, são fragmentos de monumentos antigos que, infelizmente, não estão assinalados nem bem tratados. E isto é Roma: história em toda a parte. Há locais no mundo em que tudo é aproveitado para o turismo, todas as tradições e vestígios de antepassados são transformados em marcos... já ali, havendo tanta coisa bonita e importante a que prestar atenção, tudo o resto se torna banal. Aquele parte albergava as Termas de Trajano e as ruínas do palácio de Nero - mas só o soube numa pesquisa posterior, pois não há indicações neste sentido. Pelo caminho, junto a um campo de basquetebol, tirámos as nossas primeiras fotos junto ao Coliseu - é um local com menos gente e com uma vista privilegiada para o monumento. O Coliseu é monumental, a obra-prima de Roma; o seu estado semi-degradado mas, simultaneamente, bem conservado (há partes da fachada onde já houve claramente grandes intervenções) tem uma mística particular. Como é que se construiu aquilo sem gruas, sem máquinas? Como é que aquele edifício chegou a ter uma espécie de teto, sendo uma área tão grande? É lindo e incrível e a sua visita, ainda que no exterior, é obviamente obrigatória. Diz o ditado, com um início completável à vontade do freguês, que "é como ir a Roma e não ver o Papa". Que me perdoe o pontífice, mas crime é ir a Roma e não ver o Coliseu (acabei de ganhar um passe grátis para o inferno, não foi?).

 

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À saída do Monte Ópio, junto ao campo de basquetebol, num local cheio de boas "abertas" entre árvores para tirar bonitas fotografias

 

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Como escrevi acima, fazer um cruzeiro implica fazer escolhas, pois o tempo em cada local é muito limitado. Doeu ter de tomar algumas decisões - e em Roma então, custou-me muito! - mas optamos por não entrar em nenhum dos grandes monumentos da cidade. Eu já tinha visitado o Coliseu, em 2017, numa visita anterior à capital italiana, também a propósito de um cruzeiro (ler aqui); na altura não conheci Roma, limitei-me a sair de um autocarro para visitar o Coliseu e voltar a entrar para ir à Basílica de São Pedro, no Vaticano. Fizemo-lo no âmbito de uma visita guiada, que aproveitava a manhã do dia do vôo para se conseguir conhecer alguma coisa da cidade onde o barco atracava no seu destino final, mas que não permitiu sequer que déssemos uma volta a pé pela cidade. Apesar do Miguel nunca ter visitado, decidimos que a entrada ficaria para outras núpcias, pois não dava tempo para fazer visitas e completar o roteiro que tínhamos definido. 

Demos a volta às imediações, o que contemplou a visita ao Arco de Constantino (mesmo junto ao Coliseu) e ao Fórum Romano - este último é um enorme complexo de edifícios, onde se podem passar umas belas horas a absorver história e a imaginar o que seria Roma Antiga. De fora não se vê grande coisa, mas é o suficiente para deixar o bichinho - e é um dos locais onde quero muito ir, quando voltar à capital italiana. Sinto que muitas vezes, quando visitamos ruínas, somos obrigados a puxar bastante pela imaginação para tentar projetar o que ali se passou (não é preciso ir muito longe, basta pensar em Conímbriga - num exercício que embora possa se interessante, não deixa de ser complexo, dado o nível de degradação dos espaços). Mas ali é diferente: a imponência e o bom estado de conservação de muitos edifícios permite-nos idealizar com facilidade como é que era ali a vida antigamente. Diria que é dos locais a visitar com tempo e, de preferência, com visita guiada. 

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Arco de Constantino

 

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Arco de Constantino

 

Os próximos pontos do roteiro indicavam paragens em Santa Maria em Cosmedin e San Nicola in Carcere - mas, por alguma razão, decidimos passá-los à frente. Mas, Roma sendo Roma, presenteou-nos com outras coisas bonitas - que, aparentemente, tem escondidas em cada esquina - que nos deixaram maravilhados. A primeira, logo à saída do Coliseu, foi o Foro di Nerva (o Fórum de Nerva), que foi o último dos fóruns imperiais de Roma. Apesar de ainda ter estruturas bem visíveis, o estado de degradação aqui já é considerável. Penso que parte deste fórum é, hoje em dia, usado em espetáculos; não é visitável, mas é visto a partir da rua, sendo por isso gratuito. Voltamos a alterar a nossa rota quando, a partir das ruínas, vemos um edifício imponente que não constava na nossa lista: tratava-se de Il Vittoriano, um monumento projetado no final do século XIX em homenagem a Vítor Emanuel II, o primeiro rei da Itália unificada. É um monumento muito grande, que cresce em altura à medida que nos vamos aproximando dele, e é impossível passar despercebido tendo em conta ser tão branco e imponente. Pelo que percebi, é um edifício mal amado - e até gozado, de tal forma que lhe chamam "bolo de casamento" devido à sua forma e cor. Só depois é que soube que tem um elevador panorâmico, que permite ver Roma de lá de cima (bilhete: 22€). Este é, mais uma vez, é um exemplo perfeito do que é a capital italiana (e, na verdade, Itália no geral): um monumento desta envergadura é quase completamente ignorado nos guias. E não é por ser feio - é por ser "só mais um", num universo gigante de infraestruturas históricas que Roma tem para oferecer. 

 

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Foro di Nerva

 

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Foro di Nerva

 

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Il Vittoriano

 

Rumamos ao Panteão, que foi o primeiro local onde encontramos mais gente. Este é um edifício pesadão, sem grandes linhas ornamentais que apeteça observar com atenção - mas com uma imponência que mete respeito. Também à posteriori vimos um documentário sobre a sua construção e é impressionante pensar como é que, antes de Cristo, tiveram a capacidade de construir uma cúpula daquele tamanho (a maior a ser construída antes dos tempos modernos). Este monumento já estava fechado quando lá passamos, mas é possível visitá-lo. Não foi, de todo, dos que mais me encantou.

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Panteão

 

Next stop, Piazza Navona. É uma praça que faz juz aquilo que nos vem à mente quando nos falam em Itália: um sítio grande e cheio de movimento, recheado de vendedores de rua, cafés e restaurantes, sempre com um cheirinho a cultura inconfundível - tem vários edifícios imponentes, entre eles o Palazzo Pamphilli e a Igreja de Santa Agnes, assim como duas fontes.  A que chama mais à vista é a Fontana dei Quattro Fiumi, com um obelisco ao centro, que fica em frente à igreja. É dos locais onde é bom passar um bocadinho de tempo, sentar a beber um café (sabendo que se vai lá deixar meio salário só por uma chávena de cafeína provavelmente mal tirada, mas tendo em mente que aquilo que se está verdadeiramente a pagar é a vista) e perceber a dinâmica da cidade - que foi o que eu não fiz, pois estava em modo contra-relógio. Ainda assim, é o sítio ideal para nos imaginarmos num filme do Woody Allen, com tantas vidas a acontecer por ali.

 

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Igreja de Santa Agnes

 

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Fontana dei Quattro Fiumi

 

Daqui saímos para a Praça de Espanha, que ainda hoje alberga a embaixada deste país. Mais do que a praça, aquilo que é reconhecido é a sua escadaria. Eu ainda não sabia, mas seria aqui que veria um pôr-do-sol para mais tarde recordar - dos mais bonitos que vi no contexto de uma cidade. Não fizemos de propósito para estar lá àquela hora, mas diria que é uma boa recomendação: ver o sol a descer sobre a cidade, com aquele laranja a casar com a cor dos edifícios, tornando a cidade ainda mais quente... é lindíssimo. Há momentos que guardamos mas que, enquanto os vivemos, não valorizamos ou achámos que seria algo digno de memória; outros, como foi este caso, são um autêntico rebuçadinho, que embrulhamos e guardamos diretamente no coração, sabendo de antemão o sabor doce que sentiremos quando um dia voltarmos atrás e abrirmos o papel de embrulho daquela recordação.

Se a vista da cidade era bonita àquela hora, diria que o local em si não saía favorecido, estando a envolvência um pouco escura e só o topo da igreja cheio de luz - a pouca que ainda restava do dia. A verdade é uma: a vista de baixo da escadaria, a própria Praça de Espanha, não me ficou na memória - com excepção da quantidade monumental de turistas que lá estavam, dependurados numa fonte sem grande interesse (que me perdoe a Fontana della Barcaccia, que à luz de tantas outras na cidade, sai ofuscada), mas guardada por duas mulheres polícia que apitavam mal alguém se empoleirava ou deitava alguma coisa na água. Que triste mundo este, em que temos de ter pessoas destacadas para supervisionar o comportamento de visitantes numa cidade estrangeira.

E este é, na verdade, um ponto crítico da cidade: Roma é suja. Muito suja. É lixo em tudo quanto é canto; copos de gelado, guardanapos sujos, garrafas de vidro e plástico, máscaras... enfim. Como é que uma capital desta envergadura deixa a situação chegar a este extremo (será que foi sempre assim?) ou como é que consegue reverter isto (será possível?), eu não sei - mas é mau. E triste. Já o seria em qualquer sítio, mas piora tendo em conta o contexto em que Roma se insere: uma cidade linda, com monumentos de cair o queixo ao virar de cada esquina, mas que peca nas pequenas coisas. De que vale termos os edifícios restaurados, as paredes pintadas e os mármores polidos se o chão parece sempre saído de um festival de verão?

 

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Pelas ruas de Roma

 

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Pelas ruas de Roma (se eu mostrasse esta foto sem contexto, não diriam logo que estava em Itália? Estas cores topam-se à distância e proporcionam à cidade uma mística própria e quente, que eu adoro)

 

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Em frente à escadaria espanhola

 

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A Praça de Espanha atolhada de gente. Na foto a Fontana della Barcaccia

 

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A Igreja da Santíssima Trindade dos Montes, no topo da escadaria

 

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O sol a esconder-se por detrás de Roma

 

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No topo da escadaria, a apreciar o mais bonito dos pôr-do-sol

 

Da praça de Espanha são poucos metros até ao ponto mais overrated da cidade: a Fontana di Trevi. Este foi, sem dúvida, o sítio mais lotado por onde passámos - e, se querem que vos diga, sem merecer. É só mais uma fonte bonita - "mais uma" porque estamos em Roma e não nos faltam fontes para apreciar - e o festival que montam à volta desta em particular faz com que perca qualquer magia que até possa ter. É impossível chegar sequer perto dela. As centenas de pessoas sentadas nos bancos à volta da fonte, com tantas outras a posar para a foto, em permanente destaque em frente àquelas águas, fez com que este fosse apenas um photo stop e um local de passagem. Não é agradável estar ali; não se consegue absorver a beleza das coisas quando há um barulho ensurdecedor à nossa volta, quando estamos constantemente a ser empurrados e abalroados. É demasiado. Por isso, escusam de me perguntar se pedi desejos ou atirei moedas; limitei-me a arranjar um buraco onde coubesse durante trinta segundos, a tirar uma fotografia e a desandar rapidamente para um local mais calmo e acolhedor. Se querem visitar a Fontana di Trevi, façam-no quando a noite já for longa ou bem cedo pela manhã - só assim poderão usufruir daquilo que vão ver.

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Fontana di Trevi

 

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Fontana di Trevi

 

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O caos instalado na Fontana di Trevi

 

No que diz respeito a monumentos, o nosso dia ficou por aqui. Depois de um banho bem merecido - suámos muito, muito, muito, o que seria um prenúncio para toda a viagem - fomos jantar a um restaurante chamado Signorvino, que também serve de enoteca; passámos à porta quando íamos para o hotel e gostamos do aspeto, mas não foi nada de brilhante. Será certamente uma melhor experiência para amantes de vinho - o que não é o nosso caso, tendo em conta que nenhum de nós bebe álcool. Aproveitamos o resto da noite para dar uma volta nas redondezas do nosso hotel e apreciar uma Roma menos turística, absorvendo a verdadeira energia da cidade. 

O plano era sair bem cedo no dia seguinte - a ideia era já estar na rua pelas 7h da manhã. Mas com um dia como o anterior, com stress entre aeroportos e muitos quilómetros nas pernas, não conseguimos sair tão cedo como planeado - até porque não era boa ideia ficar KO precisamente antes de entrarmos para o barco. Assim, mesmo tendo derrapado mais de uma hora, eram 8h e pouco e estávamos a sair para o Vaticano. Se tivéssemos ido cedo, faríamos o caminho a pé (50 minutos do nosso hotel) e era da forma que conhecíamos mais uma parte da cidade, a uma hora em que o movimento turístico ainda não é exagerado; como falhámos o plano, fomos de Uber, encurtando o caminho para pouco mais de 10 minutos. Os Uber e os táxis têm uma parceria em Roma - na aplicação, podem até escolher até o que preferem, sendo os táxis um bocadinho mais baratos, o que é muito fixe!

Eu queria ir cedo porque tinha a experiência da minha última visita, em que esperamos mais de uma hora para entrar na Basílica de São Pedro. Tendo em conta a temperatura do dia anterior e o nosso tempo limitado, não me pareceu boa ideia correr o risco de voltar a ficar na fila ad eternum. A igreja abre às 7h mas às 9h, hora a que entramos, não havia fila considerável - nem dez minutos demorámos, sendo o processo é mais longo devido à revista dos pertences que é feita à entrada. E, apesar de ser um "cromo repetido", mal entrei, soube a razão porque quis voltar e mostrar ao Miguel este local. Não é preciso ser religioso para o achar magnífico. É de uma grandiosidade estonteante, mas de uma minúcia incrível no mais pequeno detalhe - e este contraste torna-a numa das mais belas igrejas do mundo, pelo menos das que já visitei. Acho que há outras, em Itália, que eventualmente lhe fazem sombra (não quero dar muitos spoilers, mas a Catedral de Santa Maria del Fiore, em Florença é... wow!), mas esta terá sempre um lugar no topo das preferidas. Para quem é crente, todo o simbolismo religioso serve como um bónus a tudo aquilo que se vê - e acredito que, tal como Fátima, tenha uma mística especial. Ir ao Vaticano não é, para mim, turismo religioso - é só mais um ponto que temos de visitar se queremos conhecer alguns dos mais belos edifícios de Roma, em que a Basílica de São Pedro tem entrada direta. A Capela Sistina, supostamente, também - mas pela segunda vez consecutiva falhei a sua visita.

 

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À entrada, num local onde habitualmente as filas já são intermináveis. Nesta altura já com um lenço a fazer de saia - por uma questão de respeito, não se deve mostrar os ombros nem os joelhos dentro da igreja

 

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Este "lençol" de mármore no topo de uma porta é qualquer coisa de espetacular. Como é que se torna uma pedra numa estrutura aparentemente maleável? 

 

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A lista dos Papas sepultados na Basílica

 

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Na praça principal do Vaticano

 

O último sítio por onde passámos, no regresso ao hotel, foi o Castel Sant'Angelo - que também pode ser visitado, uma vez que é agora um museu (mas que também ficou de fora das nossas opções). É um edifício construído uma centena de anos antes de Cristo e serviu primeiramente como mausoléu e, depois, como fortaleza militar. Mesmo junto ao rio Tibre, dizem que tem uma vista muito bonita sobre a cidade.

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Castel Sant'Angelo

 

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Nesta fase as horas já apertavam e voltamos ao hotel, onde tínhamos pedido que nos guardassem as malas, em passo rápido. Desta vez, e como já sabíamos o caminho sinuoso que teríamos pela frente, decidimos apanhar um táxi para ir para a estação de Termini. Fomos cedo, com tempo para almoçar, e ainda bem - o cais onde estava o nosso comboio era o mais distante, a quase dez minutos de caminho; demoramos ainda mais tempo a chegar lá porque o fluxo de pessoas que chegou era tanto que formava uma corrente impossível de penetrar quando se ia no sentido contrário. Com uns encontrões pelo caminho e, certamente, um ou outro insulto, lá conseguimos chegar - e a viagem até Civitavecchia foi tranquila.

O pior veio a seguir. Quando comprámos o bilhete de comboio havia a possibilidade de adquirir um bilhete duplo, com uma viagem de autocarro incluída até ao terminal dos barcos. Mas, quando lá chegámos, havia centenas de pessoas perdidas e ninguém para ajudar. Os autocarros que lá estavam também eram muito poucos - e os que havia ou não eram da companhia correta ou recusavam-se a levar-nos, alegando que só podiam levar pessoas que viajassem num ou outro barco (que nunca era o nosso). Tínhamos uma hora de check-in definida para entrar no barco, mas estávamos com tempo - e eu dei a infeliz sugestão de irmos a pé até ao cais. Por isso, daqui vai a dica mais preciosa para todos aqueles que façam cruzeiros a partir de Roma: nunca se aventurem sozinhos pelo terminal de cruzeiros romano - demorem o tempo que precisem, apanhem um autocarro ou táxi, ou agilizem com a companhia de navegação. Mas nunca se aventurem sozinhos pelo porto! Nunca!

A sinalização é inexistente e a informação é nula, assim como a vontade de ajudar de quem lá passa; foram mais de duas horas até chegarmos ao barco (passou longamente a hora do check-in, como é lógico) e foi um caminho muito duro, confuso e enervante. Andámos quilómetros a pé com as malas atrás, sob um calor abrasador e um sol que não dava tréguas; íamo-nos juntando a outros passageiros perdidos - pessoal desesperado com a falta de informação e já com os nervos em franja, com um humor que não foi em nada ajudado pelas altas temperaturas que se sentiam, que nos tornava facilmente irritadiços e nos faziam parecer saídos de uma poça de água, encharcados da cabeça aos pés. Depois de muita espera, demasiados quilómetros, dois autocarros e de vagas tentativas de falar italiano, chegamos - literalmente! - a bom porto. Foi um alívio ver o barco e sabermos que, dali a pouco tempo, poderíamos finalmente deitar toda aquela roupa para lavar e tomar um merecido banho.

Para trás ficou Roma, que apesar de não deixar uma boa última impressão - alguém precisa de trabalhar a comunicação daquele porto, por favor! -, é simplesmente magnífica. Em retrospetiva, sinto que a capital italiana é bonita em todas as horas do dia - quer com o sol a brilhar, amarelecendo ainda mais todos aqueles edifícios de cores quentes e pastel, quer com o cair da noite, onde a iluminação ainda faz notar mais a tinta das paredes naturalmente queimada. Este tom meio outonal, conferido às cidades pela cor dos seus edifícios, é das coisas que mais gosto e me faz sentir quente, confortável, quase em casa. Isto, pintalgado com o bom gosto da decoração das lojas de rua - Roma está cheia de lojas de couros e mármores - e o cantar da língua italiana que ouvimos a cada passo... é apaixonante. E se de facto Roma tem coisas más que tem de trabalhar (o lixo, os muitos sem-abrigo que habitam as ruas), tem outras coisas muito boas - como é o caso da iluminação noturna dos monumentos e, por exemplo, os pontos de reabastecimento de água, grátis, espalhados pelo centro histórico da cidade.

Penso que apesar de todo o stress inicial de saber que não haveria tempo para ver e fazer tudo o que queríamos, aproveitamos bem o nosso tempo. E, como eu digo sempre, esta é mais uma das vantagens dos cruzeiros: o facto de não conseguirmos fazer tudo dá-nos uma boa razão para voltar. Desta vez fiquei a conhecer muito mais do que em 2017 - e espero que numa próxima consiga aprofundar tudo o que vi agora pela rama. No futuro quero muito levar o Miguel ao interior do Coliseu, quero ir ao Fórum Romano e ter a oportunidade de me sentar num café e sentir a vida da cidade; eventualmente visitar alguns locais que ficaram de fora do nosso roteiro, como a Villa Borghese, as Termas de Caracalla, o Theatro Marcello e a Ostia Antica. E, para além disso, tentar ter a mente suficientemente aberta para usufruir da verdade gastronomia italiana - porque apesar de gostar de pizzas e massas, eu sou muito "simplória" e não gosto de experimentar novas comidas, algo que devia mudar, para tentar ter uma experiência mais completa. E que melhor lugar que Itália para tentar abrir horizontes? 

Por isso... temos mesmo de voltar.

29
Set22

Uma lua-de-mel nas Maldivas

Estou a preparar-me para fazer os diários de bordo do meu último cruzeiro e vinha lançada para escrever o primeiro texto quando me cai tudo: "eu ainda não publiquei o texto sobre as Maldivas". Eu sei, não sou digna de aqui estar: devia ser despedida dos blogs com efeito imediato, tal é o ultraje: como é que se passa mais de um ano depois de uma das viagens da minha vida e eu ainda não dediquei tempo para escrever sobre ela? Na verdade, metade do texto está nos rascunhos desde Março, mas os dias foram passando e ele foi ganhando pó. Mas hoje foi o dia. Quase um ano e meio depois - quando até já o hotel mudou de nome!!! - cá estou eu, a redimir-me, e a fazer o que tem de ser feito. Gosto sempre de escrever estes textos pouco tempo depois de viajar, para garantir que deposito todas as memórias o mais frescas e verdadeiras possível, mas mais vale tarde que nunca.

 

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Quem me conhece saberá que as Maldivas não eram o meu destino de sonho para ir de lua-de-mel. Ou, pelo menos, não é o primeiro sítio que me surgiria, até por ser meio clichê. Ter duas semanas inteiras de férias, numa altura escolhida por nós (e fora de épocas de pico), é um luxo que se tem de aproveitar bem e a minha primeira opção teria sido a Austrália, uma viagem que já está na minha lista há muito tempo. Eventualmente faria um mix entre cidade e praia, mas iria certamente conhecer o outro lado do mundo.

Mas... Covid. Perante a instabilidade que se vivia (fecha-abre-confina-desconfina) o plano inicial até era ficar por cá e ir para Porto Santo. Mas decidimos arriscar - e ainda bem! Não houve muito destinos em cima da mesa mas, à partida, tudo o que era visita cultural ficou de fora: os países fechavam e abriam as fronteiras constantemente, havia regras muito restritivas em muitos deles e muitos dos locais de interesse (museus, igrejas, parques e monumentos de uma forma geral) estavam fechados, por isso não valia a pena arriscar. Mas praia... praia há sempre. Há-de haver sempre mar e conchas e mergulhos, por isso decidimos que íamos ficar de papo para o ar quinze dias no destino-rei das luas-de-mel. As Maldivas.

Até decidir o hotel foi um ano de juízo. O Miguel pesquisa as coisas até à exaustão, com uma profundidade que eu jamais teria paciência, e por isso, a certa altura, eu já estava pronta para fazer o "um-dó-li-tá" e escolher um hotel qualquer que estivesse na nossa short list. Todos eram nas Maldivas, todos tinham mar, e praia, e peixes, e raias, e cabanas e tudo e tudo e tudo. Mas ele pesquisava, ele via vídeos, ele lia reviews. Quando finalmente me disse "acho que vai ser este", eu só lhe respondi: "M-A-R-C-A, por amor de todos os santinhos"! 

Não consigo precisar quais foram os hóteis entre os quais estávamos indecisos (devia ter tomado nota para posterior consulta, mas falhei), mas acho que nunca mais me vou esquecer do nome do sítio onde ficamos: Lti Maafushivaru (agora chama-se Outrigger Maafushivaru). Não sei se foi pela perseverança e paciência do Miguel, a quem tenho de tirar o chapéu, mas o hotel era de facto espetacular. Os outros provavelmente também seriam, mas aquele foi o ideal para nós naquele momento e hoje percebemos que fizemos um bom negócio, com uma relação-preço qualidade incrível, tendo em conta o hotel e as condições oferecidas. O hotel não era novo mas tinha sido todo renovado - apanhamo-lo aquando da reabertura, ainda fresquinho, com umas condições incríveis - e percebemos meses mais tarde que os preços estavam a disparar dada a qualidade do mesmo. Ficamos lá hospedados na altura certa e fomos muito felizes lá.  

Com hotel decidido, faltava a outra parte da odisseia: a viagem. O homem via vídeos dos aviões por dentro, comparava todas as escalas e companhias... enfim! Mas, mais uma vez, acertou em cheio. Era a nossa lua-de-mel e decidimos ir em bom, nem que fosse uma vez na vida - e por isso fomos pela Qatar, aquela que dizem ser a melhor companhia do mundo. Em classe executiva. Num Boieng 777-300, que faz uma classe executiva melhor do que muitas primeiras classes. E, meus amigos, fica um conselho de amiga: não façam isto. Porque depois não vão querer outra coisa e ora desgraçam as vossas carteiras ou ficam para sempre deprimidos por cada voo "normal" que decidam fazer. Optamos por fazer Porto-Madrid pela Transavia e depois Madrid-Qatar-Malé pela Qatar Airlines. E que maravilha que foi! Não há palavras para o serviço, para o avião, para a comida, para o carinho das pessoas. É, de facto, outro nível, outro conceito diferente de viajar; aqui, a própria viagem já integra a parte boa da experiência, não é somente um meio para atingir um fim. Só tenho elogios a tecer à Qatar e sonho um dia poder repetir esta experiência.

 

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A viver o sonho a bordo da classe executiva da Qatar

 

Chegados a Malé, tudo pareceu um pouco caótico. E é aqui que percebemos uma realidade que quase todos parecemos esquecer sobre as Maldivas: apesar das ilhas paradisíacas, aquilo é um país de terceiro mundo - e as estruturas e as pessoas não deixam que isso passe despercebido. Começamos logo mal: perderam-nos a mala. Prevenidos e com medo que isto acontecesse, já levávamos uma mala de mão com uma muda de roupa e tudo o resto essencial, por isso não foi o fim do mundo. Mas a experiência deu-nos logo a conhecer uma faceta do país que, até aí, também desconhecíamos: nas Maldivas mais de 90% da população é muçulmana e estão longe de serem brandos na implantação dos seus costumes. Há muita burka, muitas regras e restrições em relação às mulheres - que se fazem sentir na capital, Malé, o que só não acontece nas ilhas porque são privadas e os turistas podem andar como querem e bem lhes apetece. Enquanto esperávamos pela mala que não chegou, o Miguel foi chamado ao guichê para o notificarem do sucedido; eu fiquei junto ao tapete, caso a mala aparecesse, mas sempre de olho nele. Depois de perceber o que é que se passava, ele chama-me e eu vou ao seu encontro - mas sou rapidamente parada por uma mulher polícia, que me questiona de forma áspera de onde sou, quando cheguei e o que vou fazer às Maldivas... sozinha. Explico que não estou sozinha, que vou ter com o meu marido que está no balcão de informações, e só ouvir a palavra "husband" foi o suficiente para a sossegar. Afinal eu tinha dono, não estava lá sozinha - por isso pude seguir. Achava que a forma como eu tinha sido tratada (vulgo: ignorada) no aeroporto do Qatar era passado, mas na verdade era só uma amostra daquilo que seriam as nossas férias. Felizmente este foi o único episódio em que fui eu a visada, mas assistimos a vários - e foi, sem dúvida, a parte que menos gostei neste país.

Mas voltemos à nossa chegada: supostamente teríamos alguém à nossa espera quando saíssemos do avião, mas o vôo chegou atrasado e tivemos de nos desenrascar. Em vez de lojas (que há muito poucas), o aeroporto está repleto de pequenos "stands" que correspondem às ilhas/resorts, onde vos dão toda a informação e vos acompanham até ao sítio onde devem levar as malas, apanhar os transfers, etc. E a ajuda é de facto preciosa, pois a confusão está (aparentemente) sempre instalada. Do aeroporto seguimos para um lounge do nosso hotel, onde esperamos (umas duas horas?) para depois apanhar, finalmente, o hidroavião. Achei que esta viagem ia ser pior que todas as outras juntas - em termos de torbulência, arranque, aterragem... mas na verdade foi tranquila. Barulhenta e apertada (o avião é minusculo e muito baixo, com cerca de 15 lugares, mas vários são ocupados pelas bagagens que não cabem no mini-porão), mas segura e sem sobressaltos. E a vista? Tudo aquilo que vemos nos filmes, nos vídeos e nas fotos é verdade: aquelas águas azuis turquesa, as areias brancas e os atóis das mais diversas formas e feitios são das coisas mais bonitas do mundo.

 

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Prestes a subir para o hidroavião

 

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Tudo muito orgânico no hidroavião - com direito a pés descalços e papel higiénico, just in case

 

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Quando finalmente aterramos (foram só três solavancos na água e já passou!), fomos deixados numa pequena plataforma em pleno mar-alto (quando digo pequena, era pe-que-na: com uns seis metros quadrados, de madeira, que abanava de forma impressionante) e seguimos depois numa pequena viagem de barco até ao resort, pois o cais da nossa ilha estava inoperacional devido a uma tempestade que tinha acontecido uns dias antes. Não fizemos grande tempo entre escalas e, ao todo, demoramos cerca de 24 horas a chegar ao destino. E, meus amigos, vale cada minuto.

Quando chegamos, a primeira coisa que nos disseram foi "welcome home!". E não é que é mesmo? Sentimo-nos em casa ali. A segunda foi "you can take your masks off, everyone is tested" (podem tirar a máscara, toda a gente está testada). Se isto já era bom de ouvir em qualquer contexto, escutar estas palavras depois de termos passado um dia inteiro com o nariz e a boca cobertos (mesmo a dormir)... soou a qualquer coisa de mágico! A questão das máscaras e da segurança foi, na verdade, mais uma das razões pelas quais escolhemos as Maldivas e este hotel em particular - porque a praia ninguém nos tira, porque o controlo para a entrada no país era apertado (o que nos dava uma boa sensação de segurança) e porque, sendo a ilha pequena (dava-se a volta a pé, sem problemas, em cerca de quinze minutos), sabíamos que iríamos estar num ambiente muito limitado e controlado, para poder desfrutar das nossas férias sem grandes stresses. Só utilizávamos máscara para ir ao buffet - de resto, estávamos sempre a respirar ar puro. Era, an verdade, muito raro cruzarmo-nos com outros hóspedes no hotel, tirando a altura das refeições.

 

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Fomos nós que marcamos tudo: viagens e hotel. E ainda bem, porque para além de (à partida) termos poupado uns trocos, isto obrigou-nos a informarmo-nos ao detalhe sobre todas as burocracias que eram necessárias para seguir viagem. Tal como nós, muitos casais seguiam em lua-de-mel no primeiro vôo que fizemos, e vários foram os que tiveram problemas com papeladas, testes covid, e etc. Em relação ao hotel, optamos por fazer uma reserva com tudo incluído. E quando é tudo, é literalmente tudo: podíamos frequentar os quatro restaurantes do hotel, usufruir de todos os bares, consumir as bebidas que quiséssemos (nisso demos zero despesas, só a beber coca-cola e água...) e utilizar o vasto mini-bar que o nosso quarto dispunha. Havia apenas duas exceções: os vinhos que havia no quarto (nem sequer era no mini-bar, era um frigorífico só com vinhos) e alguns pratos nos restaurantes, devidamente assinalados, que por serem confecionados com produtos premium (lagosta, caviar, etc.) eram cobrados a um terço do preço de tabela. Se vale a pena ir com tudo incluído? CLARO! Por cada refeição, gastávamos o equivalente a 150 a 200 dólares. Nas Maldivas tudo é importado e tudo é caro, pelo que se não tivéssemos escolhido este plano, e mesmo não bebendo álcool, pagaríamos tanto ou mais que a própria estadia. Diria que mesmo indo em regime de meia-pensão pode ser arriscado - primeiro porque não há alternativas fora do hotel (só se formos a nado para outra ilha...) e segundo porque uma semana de snacks ao almoço, no final, revelar-se-ia provavelmente uma pequena fortuna. Por isso, se é para ir, ponham as fichas todas em cima da mesa e vão com tudo. 

O hotel dispõe de vários tipos de casinhas: umas em cima do mar, com e sem piscina; e outras à face da praia, também com e sem piscina. Nós escolhemos as primeiras - lá está, fizemos all in! E a partir do momento em que uma pessoa abre a porta... fica deslumbrada. Com a dimensão do quarto, com a decoração, com a piscina, com a vista... enfim, com tudo. Estávamos todos rotos, mas atiramo-nos logo à água (o hotel providencia colete, óculos, tubo e barbatanas para fazer snorkeling) e ainda bem que fomos, pois foi o dia em que esta estava mais clarinha. A época alta das Maldivas não corresponde à nossa, pelo que há grande possibilidade de apanhar tempestades e mau tempo; mas, para além disso, as águas ficam mais turvas e não têm aquela claridade que tanto idealizamos e que vemos nos screensavers - o que, devo dizer, não a faz menos incrível. ;)

 

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Sobre a água: não é quentíssima mas também não é fria. Diria que tem uma temperatura aproximada à do nosso corpo, o que faz com que seja fácil entrar e sair. Uma coisa que não esperava eram as correntes: pelo menos naquela zona e naquela altura, eram muito fortes. A primeira vez que fomos ao mar usamos colete, mas o Miguel deixou de o usar pouco depois... já eu só passado uns dias é que me atrevi (principalmente porque sentia que aquele equipamento me magoava e desajudava mais do que propriamente o contrário). No entanto, diria que é essencial termos noção das nossas capacidades: eu nado bastante bem, o Miguel melhor ainda. Ainda assim é preciso saber para o que se vai, marcar um objetivo e não ir simplesmente ao calhas; é necessário ter em atenção as marcações de perigo colocadas à volta do atol e nadar de forma estratégica - ou seja, numa primeira fase optar por nadar contra a corrente para depois, quando estivermos mais cansados, ter a "ajuda" para voltar à costa ou a casa. Ao contrário do que também pensava, o mar não é estilo lago: há ondas, acima de tudo provocadas pelo vento -  e uma coisa é certa, há SEMPRE vento. Não são ondas como as nossas, que movimentam quantidades grandes de água, mas combinadas com a corrente e tendo em conta que queremos estar à superfície com o tubinho para ver os peixes, a vida às vezes fica dificultada. Na verdade o vento era de tal forma que embora houvesse caiaques grátis à disposição (e eu adoro andar de caiaque!), nunca lhes pegamos, com receio de não termos força para regressar.

Ainda sobre o mar, não posso dizer que tenhamos ficado dececionados com a fauna que lá encontramos, mas diria que tivemos de restabelecer expectativas. Acho que todos idealizamos um fundo do mar colorido nestas zonas do mundo, mas os corais das Maldivas são cinzentos (não estão mortos, atenção) e o que dá colorido são os muitos peixinhos (e peixões) que lá habitam. Vimos muitos, de todas as cores e feitios, para além de raias, mantas e, claro, tubarões - a maioria pequeninos e totalmente inofensivos, os maiores com cerca de dois metros, o que já impõe um certo respeito embora nos digam que não constituem uma ameaça para os humanos. Curiosamente, diria que o mais perigoso naquelas águas são os corais - o nível médio das águas na zona do atol é muito baixa (pouco mais de 2,5 metros, provavelmente) e consoante as marés e as correntes por vezes torna-se difícil contornar aqueles "rochedos" gigantes que chegam quase à superfície. Os arranhões e rasgões são sérios, quando batemos com um pé num coral ou quando a barriga dá uma "varridela" num deles. Se não se acreditam, o meu pé pode servir de testemunha!

 

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Ora bem: e o que é que ao certo se faz nas Maldivas? Dorme-se muito, namora-se, conversa-se, nada-se e vê-se os peixinhos, lê-se, joga-se, tomam-se banhos de imersão, apanham-se banhos de sol, dão-se mergulhos e alguns passeios na praia, apanham-se conchas (embora seja proibido), vai-se ao spa e come-se. Come-se muito. E bem, pelo menos naquele hotel em particular. 

O meu primeiro destaque tem de ser, obrigatoriamente, para a oitava maravilha do mundo, que era o gelado de côco deles. A sério, não há palavras. Se compararmos, a Olá nem entra na escala, a Carte-D'or está com pontos negativos e até a Haggen-Dazns fica como um burro a olhar para um palácio. Aquilo era absolutamente divino e eu sei que não vou comer um igual em mais nenhuma parte do mundo. As Maldivas têm, para mim, sabor a côco - e eu fiquei eternamente agradecida ao empregado que me sugeriu este gelado, em conjunto com um outro maravilhoso, de chocolate com canela (acho eu), chamado Jafa. Foi esse mesmo funcionário que nos serviu os cocktails de boas-vindas quando chegamos (isso e aquelas toalhas fresquinhas e húmidas, para limpar as muitas horas de ar de avião de tínhamos na cara - ai que maravilha!) e eu, que nunca gostei de batidos de fruta, fiquei pasmada com o sabor daquilo. Passei a vida a pedir o "cocktail de boas-vindas", de tão bom que era.

 

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Um mix das comidas "maldivianas" - e, claro, o famoso gelado à direita

 

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A comida é na generalidade muito boa e há para todos os gostos: ao jantar há um buffet com pratos do mediterrânico ao indiano, passando também pelo italiano e japonês, assim como simples grelhados. Há um restaurante exclusivamente japonês (que achei fraco e com pouca oferta, porque apesar de ser só mar, o peixe nas Maldivas não é bom), outro de grelhados com uma inspiração meia indiana (que também não adoramos porque era tudo picante e muito rebuscado), um de tapas e ainda outro mais mediterrânico, com massas, bifes, pizzas e etc., que era onde normalmente almoçávamos. Isto para além do bar, onde há sempre gelados, doces e tostas ao dispor, em conjunto com um staff sempre atencioso, simpático, prestável e com um sorriso para dar.

Sobre o pequeno-almoço... queremos mesmo falar? Tínhamos uns dez tipos de pão, alguma pastelaria, panquecas e waffles feitos na hora, assim como uma estação de omeletes, fruta variada, uma secção de comida indiana (que parecia quase feijoada) e outra de sushi, bacon de vários tipos assim como outras carnes quentes, queijos e carnes frias, saladas, cereais, iogurtes e leites de todas as variedades. Basicamente... tudo. Era o paraíso na terra, não só tendo em conta a comida, mas também o sítio onde depois comíamos, em frente àquele mar maravilhoso e os mini-tubarões a passarem à nossa frente. Não sei quantos quilos engordamos, mas também não quero saber - valeu cada caloria! (Até fizemos um vídeo do pequeno-almoço, para ver abaixo:)

 

O hotel oferecia uma tour pelos corais nos atóis mais próximos, que fomos fazer em conjunto com mais uma meia dúzia de casais. Não tivemos muita sorte em nenhum aspeto: primeiro porque não vimos nada de extraordinário (é normal ver mantas e tartarugas nestes passeios, por exemplo) mas, acima de tudo, porque fomos apanhados por uma tempestade a meio da viagem que só me fez querer nadar para terra firme. Nunca tive problemas em andar de barco, mas desde o episódio infeliz que tive nos Açores quando fui ver os golfinhos - para quem ainda não me lia nessa altura, pode encontrar esse post aqui - que fiquei com medo de me voltar a sentir daquela forma. Tinha pedido, antes da viagem, comprimidos para o enjoo; tomei um antes de embarcar e, naqueles momentos em que o barco quase ficava a 90º, tomei outro - mas tive a plena noção de que foi por um triz que não vomitei tudo o que tinha no estômago. Ao nosso lado uma senhora já tinha dado de comer aos peixes e outra estava estatelada no chão tais os solavancos que o barco dava; nessa altura ainda só tínhamos mergulhado num só local e dirigíamo-nos a outro, mas foi por mútuo acordo que decidimos todos voltar a terra firme o mais rapidamente possível, pois cada vez mais gente se estava a sentir mal - eu incluída! O skipper disse que aquilo era uma pequena tempestade, que dentro de cinco minutos passaria, mas a verdade é que entretanto já tinham voado não sei quantos coletes para o mar, o topo do barco já tinha quase tocado na água e o ambiente que se vivia era de consternação. Não foi uma boa experiência - e eu, mais uma vez, só agradeço por o meu marido intervir por mim e ter proposto que aquele suplício acabasse o mais rapidamente possível. Quando pus os pés em terra firme nem queria acreditar. Fiquei tão cansada daquela adrenalina e sentimento geral de mal-estar que dormi a tarde inteira. Recomendo que façam estes passeios, até porque podem ver coisas muito diferentes daquelas que aparecem nas imediações do hotel - mas é preciso ter em conta que aventuras como a nossa não são raras e podem acontecer.

E o que fazer para ultrapassar situações de stress como esta? Uma massagem, pois claro. Não sou utilizadora de spa's e, até à época, só havia feito uma massagem na vida - sempre dispensei ter pessoas estranhas a tocarem-me no corpo - mas, mais uma vez, era uma experiência que eu achei pertinente ter naquele local. E que boa que foi! O hotel tem, de facto, uma infraestrutura incrível - a zona do spa tinha, para além das habituais saunas e banhos turcos, uma piscina infinita lindíssima. A parte boa é que combinam isto com um staff impecável - tanto ao nível da simpatia como de profissionalismo - e uma ótima capacidade de "pintalgar" estes momentos com coisas muito boas, como um chá mega aromatizado e espetadas de fruta divinais. A combinação dos sabores que consigo recordar, em simultâneo com aquela sensação ótima de relaxamento, são uma daquelas memórias que encapsulei para sempre e que eternizei no coração. Parece que ainda hoje consigo sentir o cheiro e a humidade tão típica daquele espaço. Ai, as saudades...

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Passamos lá nove noites incríveis, que não trocaríamos por nada. Foi inesquecível. Apesar de irmos em época baixa apanhámos muito bom tempo - só com uma ou outra chuvada, que ia embora tão depressa como vinha - por isso talvez valha a pena arriscar ir nesta altura do ano, uma vez que os preços são muito mais apetecíveis (foi também por isto que conseguimos ir em classe executiva e para este hotel, aliado ao facto de ainda termos marcado em época de grandes incertezas devido ao Covid, em que os preços estavam mais baixos de forma a atrair clientes). Houve coisas que não gostamos - mas, postas na balança, não são suficientes para deixarmos de ponderar irmos lá no futuro.

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Acima de tudo, aquilo que para mim é mais negativo nas Maldivas é mesmo a religião. Não é fácil "dizer" isto sem que soe mal, mas a verdade é que tenho sempre dificuldade em gerir os meus sentimentos quando estou em países muçulmanos, e é-me difícil não condenar determinados comportamentos. Como expliquei acima, nas ilhas não nos são impostas regras de conduta diferentes das do ocidente - mas a verdade é que há muitos casais e famílias muçulmanas a passar lá férias, e não podemos impedir-nos de olhar (ou ser olhados). Faz-me impressão que, com aquela humidade e calor, muitas mulheres andem totalmente cobertas - é que nem a cor dos olhos lhes vislumbramos. E embora tenham (obviamente!) todo o direito de ali estar, eu não consigo parar de me questionar: porquê vir para um destino destes se têm de andar sempre cobertas? Em toda uma ilha, o único sítio onde podem estar à vontade é provavelmente no quarto delas - e isso não será muito diferente de estar em casa. Não vão à água, não apanham sol, só caminham na praia - e calçadas. Dóia-me ver isto, mesmo sabendo que a realidade é assim em muitos países e que em muitos casos é escolha das próprias mulheres. Mas não consigo que me passe ao lado.

Também vimos várias famílias poligamicas - um homem com várias mulheres, todas elas tratadas abaixo de cão, mas havendo claramente uma hierarquia entre elas. A objetificação da mulher, o desrespeito e o desdém com que eram tratadas deram-me várias vezes cabo das refeições - e eu cheguei até a mudar de sítio enquanto tomava o pequeno-almoço, de tal forma me senti incomodada com os olhares que um deles me lançava ali de perto. Sempre ouvi dizer que "em Roma sê romano" e respeito profundamente este ditado - mas, naquele caso, estávamos em território "neutro", o que ainda trazia mais à superfície as disparidades entre as duas culturas: elas de burka e eu (e outras) com uma túnica de praia, pouco abaixo do rabo e com um decote generoso. Não há ninguém errado aqui - mas diria que há desconforto de ambas as partes e isso não é bom quando estamos de férias e queremos estar 100% descontraídos. 

Outro pontinho negativo vai para o rato (ou ratos?) que vi a cirandar o buffet num dos últimos jantares. Íamos a sentar-nos e, do nada, vejo uma movimentação rasteira ali ao nosso lado - era um rato, que teimava em não ir embora e de quem andei a fugir (e, inconscientemente, a procurar) o resto das férias. Não gostei da forma como os empregados encararam a situação: apesar de terem ficado alerta, acharam aquilo normal, o que a meu ver é problemático. Se ratos já é mau, ratos E comida é péssimo. Mas é uma ilha, quase todos os edifícios são abertos, e dá-se o desconto. E não era um ratito que me ia estragar as férias nas Maldivas, não é verdade?

A vinda foi triste - não é fácil deixar um paraíso. De qualquer das formas, dez dias é o ideal para um sítio destes, até porque chega-se a uma altura em que é só mais do mesmo: comida, mar, repouso, namoro... e repete. É bom, mas até a vida boa cansa, e era hora de voltar a casa. Dentro da chatice que é estar um dia inteiro entre aeroportos e aviões, voltamos a desfrutar da experiência de voar em classe executiva - mas no fim ficamos novamente sem mala. Quando a fui buscar, dois dias depois, ainda ma revistaram e confiscaram provisoriamente todas as conchas que trouxe - fui buscá-las passado um mês, por não constituírem um perigo nem uma violação das regras (uma vez que, por um lado, podiam trazer bichos que "contaminassem" o nosso ecossistema e, por outro, por ser proibido trazer corais e outras espécies marinhas que podiam estar ali em causa). Confesso que foi um alívio - perdemos uma boa porção de tempo a apanhar as conchas e os búzios que mais gostamos, tendo sempre o cuidado de nos certificarmos que não tinham habitantes - porque eu queria muito que as conchas fossem o nosso souvenir principal. E a verdade é que, depois de as ir buscar, fiz três molduras com elas: uma para nós e duas para oferecer, com tudo o que trouxemos da viagem. Assim, fica uma lembraça única, muito nossa e irreprodutível.

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Viemos embora com a certeza de que queremos voltar um dia. A paz que sentimos naquele lugar - ainda para mais depois de uma fase atarefada e louca como é a de organização de um casamento - ficará para sempre nos nossos imaginários. Quando vejo fotos de alguém naquele hotel dá-me um aperto no coração de tantas saudades que tenho dos dias que passámos lá - longe dos problemas e longe do resto do mundo. Só nós, com água à nossa volta, peixinhos e muita vegetação. As muitas fotos que tirámos - e o álbum que fiz e as molduras que espalhei pela casa -, o vídeo, as conchas, os souvenirs e até este texto não colmatam a nostalgia - às vezes, parece que só aumentam. Mas já diz o ditado: recordar é viver. E, enquanto não voltamos, vamos vivendo.

 

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26
Abr22

Algumas considerações sobre estes dois meses em que não escrevi

1. Na verdade, escrevi, mas ainda não publiquei: tenho o post sobre as Maldivas a marinar há semanas, mas há uma inércia qualquer que me impede de o terminar. Vou tentar dar a volta à questão o mais rápido que conseguir.

2. Apanhei Covid, na altura em que já não está na moda ter Covid - foi o meu marido que trouxe o bicho para casa (por isso, apesar de ter apanhado, sinto que estou isenta de culpas) mas passamos os dois muito bem. Na verdade, sinto que estava a precisar daquela pausa para parar com uma rotina que me estava a desgastar há uns longos meses. Foi bom para pôr a casa em ordem, fazer arrumações a fundo que iam sendo adiadas ad eternum e descansar. 

3. Foi também óptimo para cumprir escrupulosamente com a dieta, que comecei seriamente no início de Março. O Miguel alinhou comigo neste regime e tem sido muito mais fácil fazer isto com um parceiro do que a solo: primeiro porque as refeições estão sempre alinhadas e eu não tenho de resistir ao vê-lo comer batatas fritas ou coisas do género; segundo porque temos sempre uma vozinha que nos ajuda a não desistir, mesmo nos dias em que a tentação de pecar é muita; e terceiro porque quase entramos em espírito de competição, ao estilo "quem consegue chegar aos 60kg em primeiro". Do meu lado, tendo em conta o peso que atingi no final do ano passado, já consegui dizer adeus a cinco quilos. Para além da dieta, tenho feito exercício cinco vezes por semana, em média (o que, tendo em conta que estamos a falar de mim, é uma completa LOUCURA!). E não parei durante o Covid! Foi sempre a pedalar - o que resultou, provavelmente, na melhor semana de sempre na nossa dieta, apesar de estarmos fechados em casa.

4. Fiz 27 anos, o que me faz estar tão perto dos 30 como dos 25. Estou um bocadinho assustada.

5. Voltei a ler. Estou tão, tão, tão contente com isto! Li três livros nos últimos dois meses - um mais técnico, um romance e um de banda desenhada (o primeiro de toda a minha vida) - e agora só quero que isto pegue para conseguir voltar a agarrar este hábito. Mais tarde coloco aqui as minhas reviews e falarei de uma das táticas que me fez voltar a ler. Oxalá conseguisse alguma para voltar a escrever com regularidade...

6. Apareci na televisão, numa reportagem sobre a minha fábrica, cujo resultado final gostei mesmo muito! Se tiverem curiosidade em conhecer um pouco do processo de tecelagem e do local onde trabalho, podem ver o programa aqui. A reportagem começa no minuto 1 e tem uma segunda parte, que surge por volta dos 11:45min. 

7. Dois anos depois, voltei a tocar piano num recital. Foi tudo muito bonito até ao momento em que me sentei no piano de cauda do estúdio, para tocar o Canon in D do Pachabel; mas quando me deparo com o teclado, os meus dedos fizeram um bailado nunca antes visto. Tendo em conta tudo isto, e sabendo que o difícil naquela situação era acertar nas teclas, a coisa até nem correu muito mal - mas, na verdade, podia ter saído muito melhor. Toco muito menos do que tocava antes e perdi o hábito de atuar em público. Mais uma coisa a trabalhar nos tempos vindouros... Ate lá, vou ver se gravo uma versão decente e sem nervos para partilhar.

8. Já tenho férias marcadas - whowooooo! Foi uma decisão que demorou a ser tomada, mas já está - agora não dá para "des-decidir". Por muito que goste do nosso país, sinto uma "fome" enorme de mundo e quero muito colmatar estes dois anos de privação e aproveitar estes tempos com o Miguel. Mais uma vez a escolha recaiu sobre um cruzeiro que passará por Itália, Grécia e Malta. Nunca fui à Grécia, por isso será o "check" deste ano.

9. E custe o que custar, venha o que vier, eu sei que terei de voltar a escrever. Há dias, aquando da marcação do cruzeiro, tive uma dúvida sobre um dos sítios onde parámos numa das viagens anteriores e voltei atrás nos meus posts. E estava tudo lá, com detalhe e precisão, de tal forma que quase me permite viajar de novo, ainda que sentada no meu lugar. E nesse momento pensei, e soube, que tenho mesmo de continuar a fazer isto: não só roteiros e crónicas de viagem, mas escrever de uma forma geral. Tenho saudades - mas elas não compram horas extra no meu dia, não arrumam a casa nem fazem a sopa. Passaram-se três anos de namoro e ainda não consegui reorganizar a minha vida com todas as "novas" rotinas e hábitos - mas ainda não perdi a esperança. Tenho saudades - e, no fundo, espero que também tenham saudades minhas.

 

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16
Out21

Voltar ao Japão passado dois anos (... em memórias)

Há dois anos estava a meio de um dos conjuntos de dias mais felizes da minha vida. De mochila às costas, carregada até ao fecho não dar mais, uma mão estava colada à do amor da minha vida e a outra já devia arrastar por esta altura uma mala - uma das que tivemos de comprar para transportar tudo aquilo que compramos. Adoro souvenirs. Gosto muito de ter em minha casa um pedacinho de todos os sítios por onde andei - lembram-me como sou feliz a viajar, recordam-me coisas boas, fazem de mim grata pela vida que tenho e ansiosa pela próxima aventura. E gosto de dar estes pequenos presentes aos outros para eles saberem que, enquanto deambulava, passeava ou mergulhava num qualquer destino, parte de mim estava aqui, com eles.

Uma das coisas mais preciosas da vida, para mim, é a memória. Sou saudosista, adoro recordar - e uso todos os meios que tenho ao meu dispor para não me esquecer. Já o disse aqui muitas vezes: este blog, a escrita, é o maior inimigo para o esquecimento, e por isso faço questão de registar tudo aquilo que foi importante para mim, o que gostei e não gostei, tudo o que aprendi. Mas também tiro fotos, faço vídeos e, no que diz respeito às viagens, guardo todos os pedacinhos que me façam lembrar de um determinado sítio. Durante muitos anos estas minhas memórias foram sendo acumuladas em forma de entulho virtual (excluindo aqui no blog, que sempre foi muito organizadinho) e físico - e sei que funciona assim com a maioria das pessoas e as suas próprias recordações. Até ao momento em que tentava revisitar os locais e me perdia no meio das minhas próprias tralhas: no que diz respeito às fotos, depositadas numa pasta virtual, metade era lixo e eu chegava a meio cansada de ver fotografias feias, desfocadas, cortadas ou sem nada de interessante. Quando chegava aos vídeos, já tinha perdido a paciência. E quando me dava ao trabalho de ir buscar a minha caixa de recordações para ir ver os bilhetes de avião e coisas que tais, tinha de passar por tudo o resto até lá chegar - e entretanto perdia-me a olhar para o meu primeiro telemóvel, a chave de casa do Algarve, uma carta que a minha irmã me escreveu e outras relíquias que lá tenho guardadas, isto enquanto me cruzava com coisas caídas e perdidas de outras viagens que já não conseguia recordar ou distinguir.

Este caos acabou quando comecei a editar fotografias e a escolhê-las criteriosamente. Assim, em vez de 500 fotografias de uma viagem, fico com 150 - todas boas, todas com significado. Depois disso, vieram os álbuns - tanto de cada viagem como anuais, com o best of de cada ano, resumindo todos os eventos de família que existiram e mostrando um bocadinho de cada um, para mais tarde recordar. Dos vídeos acabei por fazer outros vídeos - mais curtos, mais divertidos, mais dinâmicos; que não necessitassem de doses astronómicas de paciência e tempo de cada vez que os via, mas sim que me dessem gozo sempre que clicava no play. As tralhas e recordações que trazia do estrangeiro, passei a colocá-las no meu viajário, organizadas e bonitas, para mais tarde poder viajar enquanto folheio.

Todos estes trabalhos são, por si só, inimigos do esquecimento - é quase como fazer copianços antes do teste: sem querer, enquanto os fazemos, estamos a aprender. E ali, enquanto revemos todas aquelas imagens e momentos, estamos a absorver tudo de uma forma mais profunda, a reviver tudo aquilo que vivemos.

No caso do Japão fiz um álbum, um vídeo e vários posts (embora não todos os que queria) - para além de ter trazido muitos souvernirs, claro. Faltava guardar todos os talões, papéis e recordações que de lá trouxe. Desta vez não iriam para o viajário, mas sim para aquela que foi a primeira prenda que o Miguel me deu: um livro de recordações de viagens da Mr. Wonderful. Comecei a fazê-lo pouco depois de voltarmos mas desisti, até porque sentia que faltava algo. Tratei do "algo" - sentia que o álbum estava despido, que lhe faltava contexto, e por isso mandei fazer umas fotos tipo polaroid no LaLaLab - mas depois nunca mais lhe peguei. Até há um mês, em que finalmente o concluí. E se por um lado é bom fazermos estas coisas enquanto a memória está fresca, por outro tive a plena consciência de que viajei outra vez enquanto o completava.

De cada vez que viajamos parte do coração fica com aqueles que amamos. Mas a outra - a que levamos connosco - está muitas vezes destinada a desfazer-se, a ser obrigada a deixar-se ficar no lugar onde fomos. Há dois anos eu estava no Japão com duas das pessoas que mais gosto - e foi tão especial que parte de mim ficou lá, naquele lugar, para sempre. E a única forma de o recuperar é voltar lá sempre que posso - se não for de avião, que seja pelas tantas memórias que deixei espalhadas de tantas formas e por todo o lado, para saber que é sempre possível ser feliz.

 

Sobre o álbum: sempre adorei estes cadernos tipo scrapbooks, como via nos filmes americanos. Não tenho a arte, a mão ou a paciência para os fazer tão bonitos como imagino, mas faço o melhor possível, e o resultado não é mau de todo. O livro é da Mr. Wonderful, comprado na Fnac. As fotos mandei fazer na LaLaLab e os "cantos" colados à moda antiga foram comprados na Tiger. Já tinha lá comprado um caderno de scrapbook que tinha vários autocolantes que utilizei aqui (outros são da Mr. Wonderful, tanto deste álbum como de agendas deles que tive há uns anos), assim como aqueles envelopes pequeninos; a washi tape também foi comprada na Tiger. 

 

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09
Out20

Há um ano estava no Japão

Lembro-me de estar à entrada do prédio e pensar para mim: "tu estás completamente louca". Estava a subir, pela primeira vez, à casa daquele que viria a ser o meu namorado. As borboletas na barriga já existiam há muito, mas este seria apenas um jantar de amigos, com a irmã dele. Há dias fui pesquisar na memória do WhatsApp e descobri: foi dia 1 de Março.

Nesse jantar, enquanto me impediam de lavar a loiça ou ajudar a arrumar a mesa de jantar, eu decidi que ia fazer a inscrição para a minha viagem de grupo para a Islândia. Não demorou muito até perceber que estava esgotada. Fiquei triste - era "A" viagem que tinha destinada para 2019 - exteriorizei tudo aquilo, enquanto ouvia a água a correr e os pratos a tilintar. Entretanto fiz scroll nas restantes viagens disponíveis e saiu-me: "olha, acho que vou ao Japão".

Palavra que disse. Abri ali uma caixa de pandora - o que é estranho, tendo em conta que só nos conhecíamos há meio ano e, do nada, achamos perfeitamente normal ir para o outro lado do mundo juntos. 

Tive medo - fazer férias com amigos (principalmente que se conhecem há tão pouco tempo) é uma jogada arriscada. Falei com os meus pais, pensei no assunto, olhei para a conta bancária. Três semanas depois, acabada de me sentar na cadeira do anfiteatro que viu nascer a maior das paixões, disse ao ouvido do Miguel: vamos ao Japão. Daí a uma semana - ainda amigos! - estávamos a marcar a viagem.

Faz hoje um ano que aterrei no Japão - nessa altura já com um namorado e uma cunhada-wannabe: duas pessoas que se reafirmaram acima de tudo grandes amigas, antes de qualquer relação "familiar". E é difícil não dizer que foi perfeito. Porque foi! Sim: estivemos no meio de um dos piores tufões dos últimos anos no Japão e passamos um dia inteiro trancados num mínimo quarto de hotel. Sim: sentimos o prédio a oscilar de um lado para o outro. Sim: todos tivemos o nosso momento mais chato, mais frágil, mais impaciente. Mas foi nesses momentos que a cumplicidade veio ao de cima; a empatia, a compreensão, a compaixão. A amizade. O amor. 

Foi o cimentar dos alicerces de uma relação que queremos que seja para a vida. Foi um voto de confiança de todos para com todos, com a abertura necessária para fazer tanto cedências como exigências - e encontrar, no meio de tudo isso, um equilíbrio.

Tenho nas memórias do Japão o epíteto da felicidade. É difícil viver momentos contínuos com um sorriso no rosto - independentemente do cansaço, das saudades, do jet lag ou de algum mal estar. Mas lá tudo isso era ultrapassado - por me sentir tão grata por aquela oportunidade, tão fascinada por tudo o que me rodeava e tão contente por ter aquelas pessoas ao meu lado.

A viagem para o Japão estava destinada - tal como aquele jantar e a minha ideia estapafurdia de marcar naquele momento as minhas férias. O meu namoro estava destinado no momento em que toquei à porta. E a altura em viajamos também foi a perfeita, longe de saber que, se fosse hoje, provavelmente não a faríamos.

Tenho um feeling de que um dia voltarei ao Japão. Até lá, ficam as saudades. E as memórias de uma viagem inesquecível.

 

 

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02
Fev20

Osaka, a cidade boémia

Já passaram quase quatro meses desde que fui ao Japão e acho que não há semana em que não fale dos locais por onde viajei durante aqueles dez dias - ora porque me perguntam, ora porque me dão as saudades, ora porque avanço num dos muitos projetos que tinha em mente neste pós-viagem, que acabou por se revelar gigante.

Nunca demorei tanto tempo a terminar um diário de bordo - e isso pesa-me na consciência porque esta viagem, mais do que as outras, deve mesmo ficar registada com detalhe aqui, para quando a minha memória deixar de estar tão fresca. E a verdade é que já não está. Não sinto que algo se tenha perdido (não mais do que os pequenos detalhes, que por vezes fazem a diferença, mas que só no momento são possíveis de ser registados), mas sei que as emoções e os sentimentos se transformam, muito por culpa da saudade. São poucas as coisas de que me lembro de não ter gostado. O cansaço da viagem já se varreu, a lembrança do jet lag já era - e eu já ia outra vez, nem que fosse para lembrar tudo de novo. Apesar do diário de bordo ter ficado em stand by, avancei noutras coisas: o álbum físico de fotos já está nas minhas mãos (mais uma vez aproveitei uma promoção do Sapo Voucher, na sua parceria com a Dreambooks) e o vídeo já está praticamente terminado, faltam apenas algumas legendas. Só resta mesmo acabar a minha série de textos aqui e colar as minhas lembranças no viajário. Pouco a pouco, o ciclo vai-se fechando. E acho por bem eliminar o peso que há tantos meses anda na minha cabeça: o de ter deixado o diário de bordo pendurado. 'Bora conhecer Osaka?

 

Osaka, de todas as cidades onde fomos, é sem dúvida a mais ocidental. E não digo isto num bom sentido - muitos dos hábitos dos japoneses que mencionei nos textos anteriores deixam de se praticar quando vamos a Osaka. Dos quatro locais que conhecemos, foi o mais sujo e mais caótico; foi o único onde vimos pessoas a fumar na rua e bêbados a deambular. Foi o único local do Japão onde me senti ligeiramente insegura, numa determinada parte da cidade. Dá a sensação que importaram uma série de hábitos ocidentais... que nunca deviam ter viajado até àquele lado do globo. Gosto muito mais do "outro Japão", limpinho e meticulosamente organizado que conheci em Tóquio, por exemplo. Importa também dizer que Osaka é a capital dos negócios onde, mais uma vez, os arranha-céus (escritórios de grandes empresas) convivem em plena harmonia com locais históricos com centenas de anos.  

 

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É difícil distinguir estes mercados "cobertos", que existem um pouco por todo o Japão, com lojas em ambos os lados; sem certezas, diria que este é o Shinsaibashi. Normalmente são ruas pedonais, intersetadas por outras perpendiculares onde circulam carros, cuja única diferença é não serem a céu aberto - muito para ajudar os comerciantes a não perder clientela devido às diferentes condições climatéricas. 

 

Dotonbori é, talvez, a rua mais movimentada de Osaka - e talvez a metáfora perfeita para a própria cidade. Faz-se, acima de tudo, de comida e bebida - e, mais adiante, de lojas de roupa e outras diversões. E não é só direcionada para estrangeiros - vêem-se mesmo japoneses nas filas para comprar uns petiscos e a deambular por lá, mesclando-se perfeitamente no meio dos ocidentais curiosos, que passam a vida a olhar para cima, apreciando as montras dos restaurantes, diferentes de todas as que também nós tínhamos visto. Tem especial encanto à noite, quando todas elas têm as luzes acesas, e tudo aquilo parece um parque de diversões em modo restauração.

 

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Algumas das montras de Dotonbori. O caranguejo real é um dos pratos típicos mais apreciados (e caros) que por lá havia.

 

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Mais uma montra - desta vez muito famosa. O Kukuru é talvez o restaurante de takoyaki (umas bolinhas fritas, com pedaços de polvo dentro) mais conhecido de Osaka.

 

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E mais uma montra.

 

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O movimento típico de Dotonbori.

 

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Não podia deixar de utilizar uma das minhas técnicas preferidas de fotografia numa rua tão movimentada!

 

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Para além das típicas gyozas e takoyakis, experimentamos o melon pan que, como o nome indica, é um pão em forma de melão. Todos gostamos muito!

 

Caminhando um pouco vamos dar a Minami - uma parte da cidade com as mesmas cores vibrantes de Dotonbori, mas mais calma e atravessada por um canal (o Rio Tombori), onde se podem dar passeios de barco - não o fizemos, porque estava frio, nós muito cansados e o trajeto ainda demorava algum tempo. Tem uma série de restaurantes (mais exteriores que em Dotonbori, que está mais pejado de "take aways" e coisas tipo tapas) e lojas, mais uma vez com montras gigantes e luzes que atraem toda a nossa atenção.

Já aqui tinha falado no Don Quijote - uma loja com tudo e mais alguma coisa, onde já tínhamos ido várias vezes em Tóquio. Aqui, o "mais alguma coisa" é um carrossel com vista para Osaka, integrado na própria loja. Decidimos experimentar. Não tem nada de assustador (a subida é lenta e muito gradual), mas também nada de excelente. A parte boa é que íamos só nós dentro da cápsula, e foi divertido vivermos isso juntos; a parte má é que estávamos basicamente dentro de uma redoma de plástico, que devido aos inúmeros riscos (do uso) nem sequer permitia tirar fotos à paisagem, ou até aprecia-la devidamente. Podia ser uma coisa muito melhor do que é.

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A zona de Minami e o Rio Tombori. Do lado esquerdo consegue-se ver a roda gigante do Don Quijote

 

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A vista (muito "desfocada" e "riscada") do topo da roda

 

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Na nossa cápsula da roda gigante

 

Foi também nesta zona que fizemos a coisa mais estúpida desta viagem (e, consequentemente, onde pior gastamos o dinheiro): irmos a um "Mameshiba Café". Trata-se de um café... com cães. Paga-se para estar lá, tomar um café ou um chá e "conviver" com eles. A questão está no conceito de "conviver": não se podia brincar com eles, mexer nos brinquedos e tantas outras regras que já não me recordo, porque aquilo era só absolutamente absurdo. O pior é que os cães, de tão habituados que estavam àquele entra e sai, não ligavam nada às pessoas. Mais: até evitavam contacto. Foi um desastre total. Mas desenganem-se se acham isto estranho; este tipo de cafés são  muito comuns lá: se não é com cães, é com gatos, corujas, porquinhos-anões, ouriços-cacheiros, coelhos ou até cobras, para quem quiser ser mais hardcore. Há para todos os gostos, feitios e carteiras - mas não é certamente para mim.

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Os cães no Mameshiba Café

 

Mas não só de festa se faz Osaka. Também tem uma parte histórica, com edifícios que entraram para o nosso top de favoritos. O Castelo de Osaka é, provavelmente, o ponto turístico mais especial. E que bonito que é! Tão diferente dos nossos castelos aqui... A parte interior do Castelo está transformado num museu com vários pisos, cuja entrada é grátis. Pensando em retrospetiva, esta acabou por ser a única parte mais "teórica" da nossa viagem, em que paramos mesmo para perceber um bocadinho da história do Japão, ali inteligentemente contada, em forma de imagens interativas e pequenos textos. Hoje vejo que essa é uma falha global de 90% dos monumentos - há falta de contexto. Ou se vai previamente preparado, ou então não se aprende muito sobre aquilo que se está apreciar.

Dentro do museu apercebemo-nos de algo interessante e que não esperávamos: a relativa influência que Portugal teve no Japão - nomeadamente na língua. Havia dois exemplos bem explicados: os calções, que passaram a "karusan", e o escritório (shotansu), que é no fundo uma mini-cómoda com arrumação. Havia ainda uma espécie de carta, escrita em português arcaico, que nos encheu de orgulho: das centenas de pessoas que por lá andavam tínhamos quase a certeza absoluta que éramos as únicas que percebiam o que lá dizia. Não é todos os dias, hã?

 

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A entrada do Castelo, rodeada por água. Este tipo de paisagem, neste monumentos, é muito comum no Japão; recordo-me, por exemplo, do Palácio Imperial em Tóquio ou do Castelo de Nijo em Quioto.

 

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A fronte do edifício, muito ornamentada com a talha de ouro e os seus telhados com formas tipicamente japonesas

 

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Um templo dentro do Castelo

 

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Detalhes em frente ao templo. É muito comum este tipo de estátuas estarem mais brilhantes em determinados sítios, pois muitas pessoas crêem que esfregando-as terão mais sorte na vida.

 

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Muito amor à frente do edifício mais popular do Castelo

 

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Figuras em representação das batalhas no Japão

 

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Vestígios da cultura e língua portuguesas no Japão (em cima o calção e em baixo o "escritório")

 

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No topo do Castelo

 

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A vista do topo do Castelo e o contraste da história com os edifícios contemporâneos

 

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Posando em frente ao Castelo

 

A visita ao Castelo ficou ainda marcada por outro episódio engraçado, que acabou por satisfazer (melhor do que alguma vez esperamos) um dos nossos desejos: vestirmo-nos de gueixas e samurai (nós, raparigas, e ele, respetivamente). Em Quioto a oferta era imensa - tanto para comprar fatos, como para alugar, ou até fazer sessões fotográficas muito pomposas, em que éramos maquilhadas e penteadas exatamente como elas. Achamos que o dinheiro e o tempo empregues nisto não iam valer a pena - e muito menos andar o dia todo vestidos com roupa desconfortável e uns chinelos de bradar aos céus. 

Mas à saída do Castelo deparamo-nos com um pequeno cenário verde e um conjunto de roupas e acessórios que, em menos de um minuto, fazia de nós japoneses da antiguidade - e por tuta e meia, comparado com aquilo que tínhamos visto em Quioto. Nem pensamos duas vezes. Foi muito divertido e o resultado das fotos giríssimo. 

 

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Nos entretantos fizemos várias paragens - uma delas foi no Umeda Sky Building, onde ponderamos subir, mas o preço não era convidativo. E, verdade seja dita, as vertigens também não. Na foto abaixo não se percebe muito bem, mas as duas "linhas" que cruzam o "círculo" são escadas rolantes. Ao ar livre. A não sei quantos metros do solo. Com as correntes de ar que lá devem correr, deve ser uma boa experiência para cardíacos - pelo que decidimos não arriscar e ficar só lá em baixo, a ver.

Enquanto apreciávamos o edifício, mais uma história gira para contar: ao ver que falávamos português, um senhor que estava sentado próximo de nós abordou-nos (também muito por culpa do seu cão, a quem comecei a dar festinhas - a ressaca e as saudades dos meus já eram muitas, nesta fase). Perguntou de onde éramos e, surpreendentemente, sabia onde ficava Portugal. Mais: já tinha ido a Espanha, há muitos anos atrás. Arranhava bastante bem o inglês - melhor do que alguns funcionários de hotel - e falou-nos também do edifício que tínhamos à frente. No fim, sacou do bolso uma máquina fotográfica analógica, daquelas descartáveis, e perguntou se podia tirar-me uma fotografia com o seu cão. Perguntei-lhe o nome do bichinho: "Kokurochan, do you remember?", disse-me, como quem pede para eu não me esquecer. E a verdade é que não esqueci. Já o meu nome ele não sabe, mas ficará para a posteridade com uma fotografia de uma portuguesa com o seu cãozinho. 

 

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Umeda Sky Building

 

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O senhor, o Kokurochan e eu, enquanto nos explicava algo sobre o Umeda Sky Building

 

A paragem seguinte foi America Mura. Todos concordamos que, de todos os sítios que visitamos no Japão, este foi aquele em que nos sentimos mais desconfortáveis. Dizer inseguros é um exagero... mas a sensação que tivemos sobre as pessoas que nos rodeavam não foi, de todo, boa. Este é o sítio dos jovens em Osaka e corresponde bem ao estereótipo dos miúdos com penteados malucos, cabelos coloridos e rádio nos ombros com música hip-hop japonesa; há direito a freaks, graffitis nas paredes e tantas outras coisas "modernas", que dispensava no Japão que tanto gostei. Existem muitas lojas e restaurantes, numa mistura entre as montras de Dotonbori e a loucura americana, que claramente inspira este bairro. Gostei de conhecer, mas está longe de ter sido um sítio que me conquistou - e há muitos outros que o podem substituir, tanto ao nível das lojas (tem algum anime, mas nada comparado com Akihabara em Tóquio) como de restauração. 

 

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America Mura

 

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Uma das ruas de America Mura

 

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Montras ao estilo de Dotonbori em America Mura

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America Mura

Percebemos rapidamente que Osaka não tocou, a nenhum de nós, no coração. Tínhamos, como em toda a viagem, dois dias de roteiro bem delineados, mas improvisamos - optamos por ir a alguns sítios, prescindimos de outros - de forma a deixar o segundo dia livre. Para quê? Para ir à Universal Studios, que tem um dos poucos "Castelos de Hogwarts" de todo o mundo, assim como todo um espaço temático dedicado ao Harry Potter - saga de que todos somos fãs. Eu nunca tinha ido a um parque de diversões, prefiro manter as montanhas russas e esse tipo de divertimentos longe de mim, mas estávamos a falar de Harry Potter. E pronto: cedi.

Antes irmos para os estúdios - e depois voltar a Tóquio, onde dormiríamos a nossa última noite no Japão - fizemos a nossa última paragem num templo óptimo para portistas, o Namba Yasaka Shrine, cuja arquitetura é em forma de dragão.

 

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Depois foi entrar no comboio (não na plataforma 9 3/4, mas foi o que se arranjou) e seguir para o mundo encantado de Hogwarts. A entrada no parque rondou os 70 euros - e, claro, tinha muito mais do que Harry Potter. Tinha a vila dos Minions, espaços dedicados ao Homem-Aranha, uma réplica dos bairros americanos dos anos 50, o espaço "interdito" do Jurassic Park e também do Shark, entre tantas outras coisas - muitas que nem sequer vimos, porque íamos com um objetivo muito definido: Hogwarts. 

E, de facto, a caracterização é só incrível. Tinha desde a estufa das aulas de herbologia (que servia de espaço para as longas filas de espera), passando pelo Sorting Hat e o retrato da mulher gorda, que dá acesso à sala comum dos Griffyndor; tudo isto acaba numa incrível viagem (que é, na verdade, uma pequena montanha russa) que, numa mistura entre imagens projetadas num ecrã gigante e o nosso próprio movimento nos dá a sensação de que estamos mesmo em cima de uma vassoura a voar com o Harry, o Ron e a Hermione. Não faltou a snitch para apanhar nem os dementors para nos assustar. Foi só incrível, algo inexplicável por palavras. Só um senão: toda a narrativa da história desta viagem (que deve ter durado pouco mais de cinco minutos) era toda feita em japonês, pelo que não percebemos nada. O que vale é que as imagens não precisam de tradução - e, como se sabe, valem mais que mil palavras.

A zona que envolvia o Castelo era igualmente incrível - com particular destaque para o Olivander's, onde também há uma pequena exibição e onde um sortudo/a pode até ganhar uma varinha. Todos os detalhes são pensados ao pormenor e os espaços são realmente bonitos. Não falta a loja de brincadeiras dos gémeos Weasley, das guloseimas, dos materiais de escola ou sequer a Butter Beer. Diagon Alley está ali em peso, até com direito a "neve" no topo dos edifícios, e é só incrível.

Como sei que esta parte só interessa a alguns - e, àqueles que interessa, a curiosidade é muita - deixo uma série de fotos que tirei na galeria abaixo, onde só têm de clicar nos botões (direita ou esquerda) para percorrer as fotografias.

 

 

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E assim terminou a nossa passagem por Osaka - sem uma paixão desmesurada, mas com muito divertimento à mistura. De todas as cidades que visitei, será certamente a que menos recomendo - mas há locais, como o Castelo de Osaka, que me ficaram no coração e que adoro.

Não há arrependimentos nesta viagem. Houve coisas que gostamos mais, outras menos - e isto nem sempre foi consensual - mas foi bom conhecer tudo. Fazer tudo. Provar tudo. Tentar tudo - principalmente absorver toda a magnífica cultura japonesa. 

Só ficam duas coisas: saudade. Mas, acima de tudo, a felicidade por termos ido. 

13
Nov19

Nara, um mimo em forma de cidade

Quando me perguntam aquilo que mais gostei no Japão eu não sei responder. Mas sei aquilo que mais me surpreendeu. Chama-se Nara. Se eu já conhecia, nem que fosse por alto, os nomes de Tóquio, Quioto e Osaka, o mesmo não se passava com aquela que é tida como a primeira capital do Japão. E digo, com toda a certeza, que vale a pena conhecer - ainda por cima basta um pequeno desvio (cerca de 45 minutos) de Quioto para lá chegar, o que é óptimo!

 

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Com muito sono e de mochilas (muito cheias) às costas, prontos para apanhar o comboio que liga Quioto a Nara

 

Nara é um mimo em forma de cidade. Quer dizer... Pelo menos a parte que eu vi. A passagem por lá ocupou-nos pouco mais de uma manhã, mas não saímos do centro histórico - que, ainda que muito turístico, é muito "respirável" e agradável. Tivemos a sorte de ir num dia de sol, algo essencial para um passeio por lá, que se faz quase todo ar livre. E que agradável que é! Tem tudo aquilo que eu gosto: espaços verdes, lugares históricos e grandiosos, lojinhas de souvenirs e de gelados, paz se a procurarmos e... bambis. Tem bambis aos magotes! São pequenos veados por todo o lado, a fazer vénias em troca de bolachas e a posar para fotos como ninguém. É só maravilhoso. A interação com estes animais e a forma como eles já se habituaram à presença humana, usando sabiamente a sua fofice para receberem comida, é coisa para fazer o dia de alguém. A mim não só me fez o dia como a viagem inteira. Teria ficado o dia todo a tirar-lhes fotos e a comprar bolachas para os engordar (há vendedores de rua específicos para estas bolachinhas, cujo pacote custa cerca de euro e meio).

 

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Um dos meus novos amigos

 

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Já davamos abracinhos e tudo! (Ele na verdade estava só a cheirar o meu bolso, que tinha bolachas...)

 

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O verde reina no Parque de Nara

 

Desde a saída do comboio até aos monumentos, as distâncias são todas relativamente curtas - pouco mais de um quilómetro, se tanto, entre elas. Por isso começamos pelo primeiro que nos apareceu, o Kofukuji Temple - que na verdade é um complexo deles. Contempla, entre outras coisas, o Central Golden Hall (cuja entrada é paga), o Kofukuji Pagoda (a segunda maior pagoda do Japão) e o Southern Octagonal Hall - tudo construções muito bonitas, que ganham ainda mais vida pela envolvência verde do parque e a animação dos bambis a passearem-se por todo o lado. Mas, olhando para trás, não teria gasto dinheiro na entrada no Golden Hall (que, no seu interior, tem um buda e uma série de figuras de bronze - nada de estrondoso) e aproveitado para entrar no Todaji Temple, o mais grandioso e famoso templo em Nara (onde passamos depois mas que decidimos não pagar para entrar).

 

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Central Golden Hall no Kofukuji Temple. Esta é a primeira foto que tiramos em grupo durante a viagem. Um conjunto de rapazes espanhóis e franceses pediu-nos uma foto e nós, como cobrança, pedimos outra ;)

 

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Kofukuji Pagoda. Foi construída em 730 e restaurada mais recentemente em 1426 e é a segunda maior pagoda do Japão, com 5 andares!

 

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Em frente ao Southern Octagonal Hall 

 

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Um outro ponto de vista do Golden Hall

 

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O Southern Octagonal Hall visto a partir do recinto fechado do Golden Hall

 

Mas não foi só à conta dos bambis e da beleza da cidade que Nara ficou cravada no meu coração. Houve um episódio particularmente especial, passado em frente ao portão do Todaji, que acho que tão cedo não vou esquecer.

As visitas de estudo são, aparentemente, muito comuns no Japão. Não havia local histórico que visitassemos que não tivesse montes de miúdos com chapéus amarelos, ora organizados em fila indiana, ora de livros na mão a tirar apontamentos enquanto ouviam o professor. Em Nara deambulavam por lá centenas de meninos e meninas, em pequenos grupos, e enquanto tirava fotografias apercebi-me que estavam a abordar os turistas de forma a treinar o seu inglês. Usei os meus ouvidos de tísica para ouvir a conversa alheia (eu sei que é feio, mas não resisti!) e comentei com os meus companheiros de viagem o quão incrível era aquela iniciativa. Até que percebi que nós próprios estávamos na mira de uns pequenos estudantes que, depois de muito hesitarem (e de nós fazermos cara de gente simpática) vieram ter connosco. "Hello, can we talk to you?", perguntou uma das meninas a medo, sendo ainda assim, e claramente, a mais aventureira de todas. Perguntaram-nos o nosso nome e de onde vínhamos, enquanto liam atentamente aquilo que estava escrito nos seus cadernos e tiravam apontamentos com as nossas respostas. Quando nos disseram de onde eram, questionando-nos se conhecíamos o sítio (a resposta era óbvia...), abriram um mapa do Japão e apontaram para o local, provando que tinham a lição bem estudada. Na folha seguinte tinham um mapa mundo - e nós fizemos questão de mostrar onde era o nosso cantinho à beira-mar plantado. No fim, um último pedido: "can we take a photo with you?". A resposta era óbvia, a condição era só uma: que nós também pudéssemos tirar uma como recordação. E assim foi. 

Achei a delicadeza e a educação com que nos abordaram absolutamente maravilhosa. E passei a admirar ainda mais os japoneses, por perceberem os seus próprios pontos fracos e trabalharem-nos desde cedo. A socialização e a capacidade de comunicar é claramente um problema para este povo - e aliar uma visita de estudo (que é sempre uma coisa "fixe") a uma tarefa que os obriga a lidar com pessoas totalmente desconhecidas e ainda falar uma língua estrangeira é só genial.

 

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O portão principal que dá acesso ao Todaji.

 

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O Nandaimon Gate é outro dos portões que dá acesso ao Todaji.

 

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Ei-lo: Todaji Temple, onde não entramos, e que era claramente o local com mais afluência de turistas. Foi construído em 752 e era, até há bem pouco tempo, a maior construção do mundo em madeira. Este templo tem, no seu interior, uma das maiores estátuas de Buda de todo o Japão, feito em bronze, com 15 metros de altura.

 

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A foto para mais tarde recordar, com o grupo de crianças japonesas que nos "entrevistou".

 

No topo da colina, em Nara, encontramos o Nigatsudo Hall, que dá acesso a umas vistas privilegiadas da cidade. É aqui que acontece um do eventos mais populares do Japão: o Omizutori, uma série de rituais budistas (dos mais antigos do Japão), que tomam lugar no início de Março. São, no fundo, rituais com fogo e água, feitos pelos monges, maioritariamente dando uso a tochas gigantes - que fazem deste um autêntico espetáculo visual. A altura em que é festejado, a água, o fogo, as tochas e tudo o resto têm os seus simbolismos próprios, mas de uma forma geral o objetivo é apagar os pecados do ano que passou. É claro que não nos foi possível assistir a isto, mas fica a informação para um próxima visita (cof cof).

 

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Nigatsudo Hall

 

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Nigatsudo Hall

 

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A vista no topo da varanda do Nigatsudo Hall

 

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Detalhes do Nigatsudo Hall

 

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Detalhes do Nigatsudo Hall

 

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Um sino gigante que encontramos no caminho para o Nigatsudo Hall

 

E Nara foi isto - e foi muito! Agora que pesquisei mais a fundo sobre os locais que visitei, percebi que ficou ainda outro tanto por ver - e que a própria cidade, para além daquilo que circunda o parque, também pode ser uma visita interessante. Houve alguns templos que ficaram de fora e um ou dois locais de potencial interesse por onde não passamos... mas o tempo não esticava e Osaka esperava por nós. 

Até lá... só mais umas fotos com os bambis.

 

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10
Nov19

Quioto, onde mora a história do Japão

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Eu, millenial de gema, achava que Quioto só era conhecida pelo tratado. Acho que a ideia que nos está implantada desde pequenos sobre esta cidade é precisamente essa, uma série de assinaturas com o nome de uma cidade com uma data de medidas (infrutíferas) para prevenir a emissão em excesso de gases de efeito de estufa. Mas não. Descobri que o Japão é um daqueles casos em que a capital acaba por ser preterida, no que diz respeito à preferência dos turistas, por outra cidade qualquer. Como acontece com Brasília, no Brasil. Com Berna, na Suíça. Ou com Camberra, na Austrália. 

Apesar de Tóquio ser gigantesco e ter tudo para agradar a qualquer tipo de turista, foi em Quioto que vi mais enchentes, tours e excursões. A ideia de que a história antiga está toda ali deve atrair a maior parte dos estrangeiros. Quioto foi a capital do Japão até há relativamente pouco tempo (século XIX) e, como ficou fora do mapa da bomba atómica (que era suposto ter atingido a cidade mas que foi movida para Nagasaki à "ultima da hora"), acabou por conseguir conservar muitas das coisas antigas e mais tradicionalistas da nação nipónica. Mas a verdade é esta: quase tudo são templos. E ou se é um grande entusiasta e conhecedor deste tipo de monumentos ou, a certa altura, tudo nos parece igual. 

É por isso que dissociar esta cidade dos imensos templos que tem (colocando-os num post à parte) é uma estratégica "editorial" algo arriscada - mas é mais uma tentativa de tornar isto menos pesado e extenso. Percebo que em termos de roteiro possa confundir um pouco as coisas, mas talvez juntando-os a todos consiga provar o meu ponto: de que não vale a pena visitar tudo, tudo, tudo o que é templo. É essencial escolher.

Mas voltemos ao passeio. O nosso roteiro por Quioto era extenso e exaustivo, até porque implicava acordar muito cedo num dos dias. Mas, de uma forma natural, acabamos por ir aligeirando o plano, porque deixamos de ter vontade de visitar as dezenas de templos que tínhamos em mente visitar. Percebemos que era demais e que já não estávamos a enriquecer com isso. E em parte senti-me desiludida com a cidade por causa dessa vertente meio monótona, em que as coisas são efetivamente diferentes mas nos parecem todas iguais. Ou o roteiro é mesmo muito dinâmico e inclui coisas diferentes, ou Quioto acaba por se tornar chato. Foi um pouco o que aconteceu connosco. E, para mim, revelou-se na cidade (das que visitamos) que mais me desiludiu. O facto de ter sido a cidade onde pior comemos também não ajudou, assim como a falta de algum contexto histórico que por ventura podia ter enriquecido a nossa estadia.

A ideia de antiquidade de Quioto, quando comparada com Tóquio, é de facto realista. Isso nota-se nas estruturas, nas ruas, nos edifícios. Há muito ruído visual, proporcionado pelas centenas de linhas de eletricidade que se prolongam e cruzam pelas ruas fora. E tudo isto confere uma certa aura de desorganização e até de alguma ruralidade à cidade. As casas são mais largas e espaçosas, não se vendo grandes construções em altura, e não são aqueles cubículos com os metros quadrados contados como se vê na capital. 

O nosso primeiro ponto de paragem foi o Nishiki Market - uma rua gigantesca, com lojas de ambos os lados. Comida, souvernirs, roupa - havia de tudo. E, como todos os mercados, tinha uma magia especial. Eu, pelo menos, gosto muito deste tipo de espaços; de perceber o que é típico, de interagir com as pessoas que fazem daquilo vida. Ao fim do mercado há um templo, o Nishiki Tenmangu Shrine, que também visitamos. 

 

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No Nishiki Market

 

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Em frente ao Nishiki Tenmangu Shrine

 

A caminho de um outro templo (eu não disse que eram só templos?), passamos pela Torre de Quioto. Está longe, muito longe, de ter a beleza da Tokyo Tower, mas é um ponto de passagem considerado obrigatório.

 

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Ao chegar ao Kyo-o-gokoku-ji, conhecido por To-ji (outro templo), deparamo-nos com um conjunto de pessoas a fazer uma festa rija ao lado de uma espécie de andor. Não sei o que festejavam, mas muitos deles estavam (com a ajuda do álcool) contentes e felizes - de tal forma que um posou para a foto, com o seu traje tradicional, porque não é todos os dias que um ocidental se enfia no meio de uma festa de japoneses.

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Jackie Chan, és tu?

 

A parte mais bonita de Quioto é, infelizmente, aquela de que mais dificilmente conseguimos desfrutar. Gion é o bairro mais conhecido da cidade, popularizado pelas gueixas e por um complexo de templos gigantesco (o mais conhecido é o Kiyomizu-dera), mas que se tornou altamente turístico e, por isso, acabou por perder um pouco da sua beleza. Até porque é difícil circular, parar no meio da multidão ou ver com tempo e espaço o que quer que seja. Temos de fazer um grande esforço de abstração para conseguir saborear as vistas devidamente. Porque, de facto, merecem que paremos e apreciemos tudo aquilo. 

 

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Se vi alguma gueixa verdadeira, contam-se pelos dedos das mãos. Mas turistas (especialmente mulheres) vestidas desta forma tradicional, principalmente em Gion, era aos magotes. E depois aconteciam contrastes destes: a tradição junta-se à atualidade; um padrão típico faz par com uma mochila adidas e... adeus magia!

 

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Gion e as suas ruas movimentadas

 

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A entrada para o Jishu-jinja, um dos templos na área de Gion

 

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Os leques são um dos souvenirs mais populares no Japão - mas são longe de ser os mais baratos.

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Um grupo de gueixas (falsas?) aproveita a paragem para tirar umas fotos de grupo. Gosto muitíssimo desta foto.

Os trilhos de Gion merecem bem ser percorridos, pelo menos até encontrarmos um cantinho que não seja assim tão movimentado. Nós fomos andando sempre até encontrarmos um dos ex-libris de Quioto, a Yasaka Pagoda, que figura na maioria das fotos que nos aparecem quando pesquisamos algo sobre o Japão. Confirma-se que é bonita e que a envolvência do bairro, com todas as casinhas de madeira, lhe dá uma mística especial. Principalmente de noite, ou ao entardecer, hora a que passamos por lá.

Antes disso ainda fizemos uma paragem estratégica para um cafézinho no único Starbucks do mundo em tatami, o chão tradicional japonês, feito de um tipo de tecido de palha entrelaçada. Não é nada do outro mundo: é um Starbucks em que o pessoal toma café descalço (quando se tem lugar), com pernas à chinês e rabo no chão. Se é diferente? É. Tão diferente que têm mesmo de ir? Não. Mas é um bom sítio para uma paragem, um café quente (que não é muito fácil de encontrar por aquelas bandas) e um bocadinho de descanso.

 

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As ruas de Gion

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O detalhe do cabelo de uma suposta gueixa, algures pelo bairro de Gion.

 

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Vista para Quioto

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Yasaka Pagoda

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Yasaka Pagoda

 

O segundo dia em Quioto começou muito, muito cedo - aí pelas 5h da manhã. A razão? As multidões. Ou, neste caso, para fugir delas naquela que foi, talvez, a minha parte preferida da cidade: a floresta de bambus. Eram 7h30 quando chegamos e já havia gente a passear-se por lá (ir ainda mais cedo não é, portanto, algo de todo descabido). Ainda assim conseguimos desfrutar do espaço sem muito barulho e sem muita gente - o que, mais do que ser essencial para boas fotos, é imprescindível para saborearmos bem aquele momento. Como àquela hora o sol ainda estava fraquinho, a luz entrava suavemente por entre as imensas canas do bambu, conferindo a todo aquele espaço uma aura especial e muito bonita.

Não esperem uma coisa gigante, um caminho infinito; as imagens, em particular neste sítio, enganam. E a sensação que fica é que aquilo deveria ser maior, para podermos absorver aquela energia boa; uma espécie de labirinto por entre os bambus era um sonho para mim. A floresta é constituída apenas por um caminho relativamente estreito, portanto não dá para sentar, parar ou até respirar sossegado durante muito tempo. Por muito que tentemos acabamos por ficar sempre na fotografia de alguém ou a interromper o caminho, pelo que acaba por ser algo que obrigatoriamente se vê de passagem, em movimento - e é tão bonito que passa num fósforo. Queria mais. Muito mais! Mas, ainda assim, este foi o lugar em Quioto que ocupou um lugar mais especial no meu coração.

 

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Para além da floresta de bambu, toda a envolvência de Arashiyama (aquela zona) é bonita. A saída da floresta leva-nos ao Parque Kameyama, com uma bela vista à beira rio, e a uma das pontes mais conhecidas da zona, a Togetsu-do. É bom sítio para fazer devagarinho, enquanto os minutos passam - especialmente se tiverem ido cedo à floresta e estejam a fazer tempo para visitar outros locais. Se na altura soubesse - e aproveitando o belo tempo que estava nesse dia - tinha levado uma pequena merenda na mochila e feito um mini-picnic à beira daqueles barquinhos. Fica a dica!

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Parque Kameyama, à beira rio, e os seus típicos barquinhos de madeira

 

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A zona de Arashiyama 

Por meio de visitas a templos e mais templos, que fomos intercalando tanto devido a uma boa gestão de tempo e de trajetos como para desenjoar, ainda fomos a outros dois locais conhecidos: a floresta de kimonos (que não acho que mereça uma paragem propositada, só se estiverem a caminho) e ao Passeio dos Filósofos - mais uma caminhada à beira rio, repleta de banquinhos, e onde se pode fazer a travessia de um lado ao outro das margens saltitando entre as pedras lá estrategicamente colocadas.

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Floresta de Kimonos

 

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Passeio dos Filósofos

O fim do segundo dia ainda deu tempo para visitar dois locais de peso: o Palácio Imperial e o Castelo de Niju. Nós estávamos claramente com azar no que aos palácios dizia respeito: mais uma vez não conseguimos visitar, pois estava fechado. E, no caso de não se poder entrar (pelo que sei a visita é curta e gratuita), não acho que valha a pena passar por lá; é apenas um conjunto de paredes e de pórticos (semelhantes a tantos que se vêem em templos e edifícios históricos) envoltos num grande jardim que não tem nada de imperdível.

Já no que diz respeito ao Castelo de Niju também foi por uma unha negra que conseguimos entrar - mas ainda bem que conseguimos! Sobre isto é importante dizer que a maior parte dos monumentos encerra muito cedo - entre as 16h e as 17h - o que também obriga a um bom planeamento de tudo aquilo que se visita. Se a memória não me falha também este castelo estava a meio gás, com obras e um circuito para os turistas bem definido e nada flexível. Mas é um local que merece a visita, até porque é diferente de tudo o que vimos até ali. O ex-libris do Castelo é o Ninomaru Palace, onde é permitida a entrada (ainda que paga), algo que não é assim tão comum. Enormes corredores com o chão forrado a tatami circundam as salas enormes que faziam daquele sítio a casa e o escritório de uma das pessoas mais importantes do Japão há alguns séculos - o Shogon, o general que comandava o exército e que era diretamente nomeado pelo imperador. As descrições sobre as divisões são mesmo muito breves, sendo que o enfoque ia mais para as pinturas que forravam as paredes do interior palácio do que propriamente das salas em si, o que me deixou com pena. Diria que este é um dos locais que merece a presença de um guia para percebermos melhor a forma como funcionava antigamente e um pouco sobre a sua história, assim como de quem lá viveu. E, já agora, responder a algumas questões bastante pertinentes: como é que um castelo não tem muralhas?! Fiquei com vontade de saber mais. (Do interior do palácio não tenho fotos, pois era proibido).

 

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Palácio Imperial

 

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Castelo de Niju

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Entrada Castelo de Nijo

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Castelo de Nijo. Estes pórticos altamente trabalhados são uma das atrações principais.

 

O pior dos dias que começam cedo é que tendem, também, a terminar cedo. Os muitos quilómetros que percorríamos e o tempo húmido não ajudavam à resistência nem ao cansaço acumulado, pelo que o nosso último dia em Quioto terminou a jantar cedo e a desfrutar do conforto de um banho quente e das nossas camas. O dia seguinte seria longo e de mochila às costas - mas valeria totalmente a pena. Rumo a Nara!

29
Out19

Um questionário ao consumidor antes de viajarmos para Quioto

Faço os diários de bordo à minha medida - nem tanto pensando naquilo que procurava antes de ir viajar mas sim tendo em mente aquilo que vou querer ler daqui a uns anos, quando a minha mente já não estiver tão fresca e eu quiser relembrar as viagens que fiz. Volto a viajar comigo mesma de cada vez que leio aquilo que escrevi sobre os meus passeios anteriores e essa é a maior razão que tenho para perder horas e horas a escrever coisas aqui no blog que, honestamente, não sei se muita gente lê.

E é sobre isso que venho indagar. Questiono-me muito sobre a forma densa como escrevo esses posts; vejo muito poucos (ou nenhuns) textos de viagem tão detalhados como os meus - mas pergunto-me se isso será bom. Sei que é mais fácil ler a Isabel Saldanha (que, por falar nela, está agora no Irão!), que com a sua escrita poética vai dando inputs sob a forma de posts de Instagram que nunca são muito longos; sei que é mais rápido perceber os bairros de Tóquio com posts breves e poucos descritivos como o do Alma de Viajante (que gosto muito!); sei que a nossa concentração digna de peixe de aquário gosta mais de fotos do que de um montão de letras. Mas nenhuma destas formas de transmitir ideias é suficiente para mim. Eu preciso de mais, de contar mais, de expor mais; de dizer aquilo que senti, a forma como vivi, o que pensei naqueles locais. E já faço um esforço para dividir o "mal pelas aldeias" e fazer diversos posts; já recheio os meus textos de fotos para ser palpável tudo aquilo que eu digo e dar uma mãozinha à imaginação para que também vocês viajem comigo. Mas não sei se é suficiente.

Por isso, hoje, pergunto diretamente: os meus diários de bordo são chatos? Não têm vontade de os ler até ao fim devido à sua extensão? Acham que perde o efeito didático e de eventual ajuda que poderá ter para as vossas viagens por ter toda aquela quantidade de informação? Ou gostam do estilo e têm a mesma visão que eu?

Por favor, contem-me tudo.

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