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Entre Parêntesis

Tudo o que não digo em voz alta e mais umas tantas coisas.

29
Jan24

Crónicas do SNS 1#

As coisas que faltam

Assisti sempre de longe aos dramas da saúde pública. Saudável, felizmente, tenho passado pelos pingos da chuva sem ter problemas de maior. Uma dor aqui, um mau estar ali, duas operações pelo meio, mas nada de tão sério que me obrigasse a recorrer aos hospitais de peso do nosso país. Para além disso, tenho a sorte de poucos: de ter acesso ao SNS mas de, até agora, não precisar dele. Desde que me lembro de ser eu que fujo de médicos e hospitais como o diabo foge da cruz, interagindo o mínimo e indispensável com esta classe e com estes lugares, a bem da minha saúde mental. Mentiria se dissesse que esta minha fobia - que em tempos teve direito a muitos ataques de pânico - não tem vindo a suavizar com o tempo. Hoje escrevo na sala de espera de um hospital - e ainda que não seja de ânimo de leve que o faço, as mãos não tremem, a garganta não custa a engolir e não tomei nenhum ansiolítico antes de vir. Em parte por não ser eu a visada de tantas vindas ao hospital - mas também porque, se não havia crescido até aqui, agora é hora de crescer.

Sendo novata nos corredores do hospital de São João, faço muitas perguntas, questiono tudo, olho com atenção para os detalhes na esperança de obter respostas, reparo nas pessoas e nos pormenores. E percebo que um hospital não é só um sítio triste por ter pessoas doentes, mas acima de tudo por ter pessoas desamparadas. Sozinhas. Porque se eu tenho algumas questões, elas têm muitas mais: não percebem o sistema de senhas, não sabem para onde ir, têm dificuldade em deslocar-se sozinhas até ao fundo do corredor fazer uma pergunta ao balcão onde, provavelmente, nem sequer terão resposta. A solidão, a velhice e a atrapalhação inerentes à idade misturadas com a tentativa meio frustrada de implementação das novas tecnologias é muito triste de se testemunhar. Faltam respostas - e exaspera-se por quem as dê.

As novas tecnologias vieram agilizar processos: é suposto serem mais fáceis, mais ágeis, mais rápidas. Mas isto parte do pressuposto de que 1) se sabe funcionar com elas e de que 2) elas trabalham convenientemente.

O sistema de admissão é feito, hoje em dia, em máquinas. Das seis que lá estão, julgo que só duas funcionam. Das duas que trabalham, poucos sabem mexer com elas - ou então poucos são aqueles com quem elas gostam de trabalhar. Às oito da manhã, dois voluntários vestem a bata amarela que os caracteriza e tentam ajudar quem chega; escrevi "tentam" pois, apesar da hora madrugadora, já exasperam com a falta de resposta das máquinas, que não permitem os doentes fazerem a admissão, mandando-os para o balcão onde estão zero funcionários e oitenta pessoas para serem atendidas. Quando questionado sobre a hora de abertura do balcão, um funcionário returque: "acho que é às oito, mas vá lá perguntar". Só faltava tirar senha. Seria a número 81, mas sem saber a que horas o balcão iria abrir. 

No ecrã das chamadas às consultas aparece uma mensagem de erro. Em dúvida, quando perguntamos se o ecrã está a atualizar devidamente, dada a mensagem que aparece, dizem-nos que "é assim". Na verdade, o facto de não estar pintado de negro - como tantos outros espalhados por todo o hospital - já é uma sorte.

No meio disto tudo, os pedidos de ajuda são sucessivos. Acredito que ao fim de umas horas de trabalho, de tão repetidas as questões, as respostas já não saiam com um sorriso de bónus. Mas a verdade é que as pessoas com consultas às 17h não têm de ser mais aptas ou informadas para as tecnologias do que aquelas que as têm às 8h da manhã, em que a paciência do pessoal do balcão ainda está renovada após umas horas de sono. O resultado disto são respostas ásperas, rudes, muitas vezes a roçar o mal-educado - e assistir a isso é duro, vendo as pessoas a sair guichê ainda mais trôpegas do que lá chegaram. 

Sinto que falta o básico nos nossos hospitais. É como se tivessemos uma pirâmide em que a base está assente em alicerces de palhota. Não falta eficácia, não falta pessoal qualificado, não faltam máquinas, não falta competência nas pessoas de quem está é realmente necessária: isso, apesar de essencial e eventualmente desfalcado e com muitas falhas, está lá e funciona. Connosco tem funcionado. Mas falta a parte simples: faltam placas informativas atualizadas, faltam cartas que elucidem mais e confundam menos, falta calor nos corredores, falta cimento em alguns tetos, faltam monitores e máquinas funcionais, faltam mapas do hospital, falta... tanta coisa. 

Diria que no SNS falta tudo, menos aquilo que é realmente importante. O que podia ser o suficiente, se o menos importante não fosse aquilo que faz um hospital - e um sistema nacional de saúde - andar para a frente.

20
Set22

O enraizar de um hábito

A primeira foto que tenho de um pós-treino no meu telefone foi tirada no dia 20 de Setembro de 2021 - faz por isso hoje, precisamente, um ano. Aqui há dias, enquanto suava a minha alma em cima da bicicleta, pensei que estaria a fazer um ano da primeira vez que tinha subido para cima daquele selim - e, quando fui vasculhar os arquivos, percebi que era hoje.

Foi o Miguel, claro está, que me instou a experimentar. Era Setembro, época de recomeços - e particularmente especial para nós, com o papo cheio das férias e de ressaca após meio ano de uma preparação de casamento particularmente stressante - e estávamos ambos algo desagradados com a nossa forma física. Ele já tinha arrancado no seu processo e eu morria um bocadinho de cada vez que o via em cima da bicicleta, a pingar como uma torneira, deixando ali todas as quilocalorias que queria matar. Eu sentia-me muito frustrada e triste porque não tinha força de vontade para aquilo, porque não queria voltar para o inferno de um ginásio mas não sabia o que havia de fazer; no passado tínhamos feito treinos estilo cardio em casa, mas passado uns meses os joelhos queixavam-se e os resultados não eram tão visíveis como o desejado, pelo que também não tinha o ímpeto necessário para começar. Continuávamos a jogar padel, já de forma mais consistente, mas muito longe de alcançar qualquer meta visível.

Ele ia insistindo comigo para subir para a bicicleta. Um dia, dois, três. Um sábado lá me deu a volta - emprestou-me uns calções de ciclismo velhinhos e cronometrou quinze minutos. Eu pedalei, sem peso e sem rumo e, com os bofes de fora, fiz o esforço de chegar até ao fim do tempo acordado. No fim, festejou comigo por eu ter pedalado durante aquele quarto de hora como se tivesse acabado de fazer um Iron Man (eu sei, tenho sorte no marido que escolhi). 

Apesar das dores no rabo, não achei que aquilo fosse assim tão mau. E segunda-feira - porque nós temos a mania que os inícios devem ser sempre às segundas - comecei a minha mudança. Nos primeiros dias fiz 20 minutos, depois 25 e fixei-me na meia hora dali em diante. Inicialmente ia mexendo no peso da bicicleta de forma mais ao menor arbitrária, gerindo as dores nas pernas e a respiração. Em Dezembro o Miguel - outra vez ele, claro - ofereceu-me um smartwatch que, honestamente, fez toda a diferença nesta fase da minha vida. Criou-me metas, deu-me métricas para me guiar. Ainda hoje saio derrotada de uma semana em que não faça cinco vezes algum tipo de exercício (nem que seja uma caminhada de quinze minutos); já sei que estive demasiado parada e sentada se não cumprir com a meta dos 10 mil passos diários e que um treino teve um rendimento mais baixinho se não atingir a média das 200 calorias. Foi, mesmo, o melhor investimento que ele podia ter feito por mim, pela minha saúde e pela minha motivação. Tenho lá a minha vida ativa registada e adoro a política do envio de notificações motivacionais ("só faltam mais dois dias de treino para atingir o seu objetivo!", "mais dois mil passos e chega à sua meta diária!", "ganhou o badge não-sei-quantos por ter subido mil degraus num só dia - as suas pernas são melhores que um elevador topo de gama!") que, por muito  parvo que pareça, funciona na perfeição.

No início do ano, creio eu, comecei a fazer treinos do Youtube (do canal do GCN) - assim não pedalo em vão, tenho uma sequência e um objetivo. Descobri que aquilo que melhor funciona comigo são treinos de intervalos e intensidade - e agora que já os sei quase de cor, alterno simplesmente o peso que ponho na bicicleta e aumento e diminuo a velocidade consoante aquilo que me sentir capaz naquele dia. Se no início utilizava só metade da roda do peso (180º), algures a meio deste ano passei a utilizar 270º - sempre sentada. Apesar de haver segmentos que se faziam em pé, não tinha pernas para aquilo. Até que há uns dois meses consegui - e agora já ultrapasso os 360º quando estou de pé e me obrigo a dar à perna. Estas evoluções foram vividas com muita alegria, ânimo e festejo - porque são realmente vitórias impressionantes para alguém que nunca gostou de fazer exercício e que tanto sofreu com isso ao longo dos anos. Na verdade, cada treino é tido como uma vitória - e em todos tiro uma foto para registo e mando para o Miguel, a pessoa que mais me motivou a conseguir e chegar até aqui.

Foi uma evolução feita com calma e passo a passo - não sou (nem nunca fui) de testar os limites do corpo. Se calhar até teria evoluído mais rápido se tivesse puxado a corda e provado a mim mesma que era capaz - mas também é provável que tivesse desistido rapidamente com as dores do dia seguinte e com o esforço mental que era necessário para me arrastar para a bicicleta todas as manhãs. Porque a verdade é que, nos primeiros tempos, não havia hormonas que me safassem - era penoso ir para a bicicleta, sair da bicicleta e, de uma forma geral, sobreviver ao resto do dia (e subir as escadas para o meu escritório? Parecia uma velhinha!). Continuei por pura teimosia e por querer consolidar um hábito e não por me sentir bem antes, durante ou depois do treino - acho que ainda hoje, um ano depois, as endorfinas não funcionam comigo. Agora, com o hábito enraizado, subo para a bicicleta por medo: por medo de engordar e por medo de perder um hábito que, de facto, só me trouxe saúde.

Os primeiros a notar as diferenças foram os outros - para mim, eu estava igual. Mas a minha capacidade de fazer arranques enquanto jogava padel e de conseguir chegar, finalmente!, às bolas mais perto da rede começaram a tornar mais óbvio que a minha forma física estava a melhorar - isso e umas pernas mais delgadinhas, como nunca antes tive. O emagrecimento só veio depois. Atingi o meu pico de peso em Novembro, quando já treinava - na altura estava a tentar emagrecer só com exercício e não sei até que ponto é que não fiquei mais pesada, precisamente, por estar a ganhar massa muscular. Como disse no último post, foi em pouco mais de três meses que perdi quase dez quilos - mas a verdade é que já andava a preparar o corpo e a mudar os meus hábitos nos seis meses anteriores, o que foi indispensável para aquele processo. 

Não sei muito sobre a criação de hábitos mas creio que um ano já é o suficiente para dizermos que um hábito está enraizado. Mas isto é como a confiança: demora-se anos a ganhar mas segundos a perder. Passei as minhas férias aterrorizada, com medo de não conseguir voltar à cadência de treinos que tinha conquistado. A rigidez com que vivi o segundo trimestre deste ano, com uma dieta muito restritiva e a treinar seis vezes por semana, era demasiada para uma vida social minimamente ativa e para um dia-a-dia relaxado, mas a verdade é que depois do impacto inicial (que foi duríssimo) o nosso corpo se habitua; difícil é depois encontrar um meio termo. A manutenção é o segredo de qualquer dieta bem sucedida, mas é também a parte mais difícil - porque mal começamos a dar ao corpo aquilo que ele gosta (nomeadamente calorias a mais e o rabo alapado no sofá), ele não quer outra coisa. Quanto mais comemos, mais queremos comer; quanto mais dormimos, mais queremos dormir. Às vezes temos a tendência de nos "fazermos as vontades", de ouvirmos o nosso corpo - aquilo que é tantas vezes necessário em inúmeros casos - mas caímos em erro, continuando determinados ciclos que deviam ser quebrados.

Mas apesar dos meus medos, consegui voltar ao meu regime de exercício com bastante facilidade. Já voltei a planear os meus treinos no início da semana (faço sempre um plano mental, à segunda-feira, para saber os dias em que faço bicicleta tendo em conta a minha disponibilidade matinal e os dias em que vamos jogar padel) e o resto dos hábitos continuam: ponho o treino do GCN no tablet, uma série no telemóvel, ativo o treino no relógio e pedalo - tudo de manhã, se possível ainda antes das 8h. Já cheguei a treinar ao final da tarde, mas só mesmo se for estritamente necessário - a minha força anímica esvai-se durante o dia com todo o stress e problemas do trabalho, pelo que dificilmente conseguiria enraizar um hábito destes ao final da tarde, entre a obrigação de fazer tarefas domésticas e as oscilações de humor e energia que dependem do decorrer do dia. Para além disso, desde há uns meses para cá que tento fazer um ou dois treinos de braços (musculação) por semana, para complementar o cycling (e o padel), uma vez que estou a dar muito mais atenção aos braços do que às pernas.

Duzentos e tal treinos depois, cá estamos - mais magra e mais saudável (noto menos cansaço no final de tarefas que puxam pelo corpo, por exemplo) mas, acima de tudo, muito orgulhosa de mim. Eu não sou só alguém que nunca gostou de fazer desporto - sou, ainda hoje, alguém com marcas profundas ganhas na escola e ginásios alheios, que me magoaram profundamente. São cicatrizes que, levianamente, tentamos pôr para trás das costas e deixar de dar importância, mas que não deixam de ser um peso só porque as escondemos e menosprezamos. Conseguir manter um hábito destes durante um ano é uma superação muito mais mental do que física. Ter encontrado um desporto que não me mata por dentro, sem ter olhos alheios postos em mim que sirvam de ponto de referência ou comparação foi uma lufada de ar fresco que nunca antes tinha sentido e a solução para um problema que achei que não era solúvel. Que dure muitos mais anos e que eu saiba equilibrá-lo com estilo de vida saudável - e que nunca, nunca mais tenha de pôr os pés num ginásio.

 

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26
Abr22

Algumas considerações sobre estes dois meses em que não escrevi

1. Na verdade, escrevi, mas ainda não publiquei: tenho o post sobre as Maldivas a marinar há semanas, mas há uma inércia qualquer que me impede de o terminar. Vou tentar dar a volta à questão o mais rápido que conseguir.

2. Apanhei Covid, na altura em que já não está na moda ter Covid - foi o meu marido que trouxe o bicho para casa (por isso, apesar de ter apanhado, sinto que estou isenta de culpas) mas passamos os dois muito bem. Na verdade, sinto que estava a precisar daquela pausa para parar com uma rotina que me estava a desgastar há uns longos meses. Foi bom para pôr a casa em ordem, fazer arrumações a fundo que iam sendo adiadas ad eternum e descansar. 

3. Foi também óptimo para cumprir escrupulosamente com a dieta, que comecei seriamente no início de Março. O Miguel alinhou comigo neste regime e tem sido muito mais fácil fazer isto com um parceiro do que a solo: primeiro porque as refeições estão sempre alinhadas e eu não tenho de resistir ao vê-lo comer batatas fritas ou coisas do género; segundo porque temos sempre uma vozinha que nos ajuda a não desistir, mesmo nos dias em que a tentação de pecar é muita; e terceiro porque quase entramos em espírito de competição, ao estilo "quem consegue chegar aos 60kg em primeiro". Do meu lado, tendo em conta o peso que atingi no final do ano passado, já consegui dizer adeus a cinco quilos. Para além da dieta, tenho feito exercício cinco vezes por semana, em média (o que, tendo em conta que estamos a falar de mim, é uma completa LOUCURA!). E não parei durante o Covid! Foi sempre a pedalar - o que resultou, provavelmente, na melhor semana de sempre na nossa dieta, apesar de estarmos fechados em casa.

4. Fiz 27 anos, o que me faz estar tão perto dos 30 como dos 25. Estou um bocadinho assustada.

5. Voltei a ler. Estou tão, tão, tão contente com isto! Li três livros nos últimos dois meses - um mais técnico, um romance e um de banda desenhada (o primeiro de toda a minha vida) - e agora só quero que isto pegue para conseguir voltar a agarrar este hábito. Mais tarde coloco aqui as minhas reviews e falarei de uma das táticas que me fez voltar a ler. Oxalá conseguisse alguma para voltar a escrever com regularidade...

6. Apareci na televisão, numa reportagem sobre a minha fábrica, cujo resultado final gostei mesmo muito! Se tiverem curiosidade em conhecer um pouco do processo de tecelagem e do local onde trabalho, podem ver o programa aqui. A reportagem começa no minuto 1 e tem uma segunda parte, que surge por volta dos 11:45min. 

7. Dois anos depois, voltei a tocar piano num recital. Foi tudo muito bonito até ao momento em que me sentei no piano de cauda do estúdio, para tocar o Canon in D do Pachabel; mas quando me deparo com o teclado, os meus dedos fizeram um bailado nunca antes visto. Tendo em conta tudo isto, e sabendo que o difícil naquela situação era acertar nas teclas, a coisa até nem correu muito mal - mas, na verdade, podia ter saído muito melhor. Toco muito menos do que tocava antes e perdi o hábito de atuar em público. Mais uma coisa a trabalhar nos tempos vindouros... Ate lá, vou ver se gravo uma versão decente e sem nervos para partilhar.

8. Já tenho férias marcadas - whowooooo! Foi uma decisão que demorou a ser tomada, mas já está - agora não dá para "des-decidir". Por muito que goste do nosso país, sinto uma "fome" enorme de mundo e quero muito colmatar estes dois anos de privação e aproveitar estes tempos com o Miguel. Mais uma vez a escolha recaiu sobre um cruzeiro que passará por Itália, Grécia e Malta. Nunca fui à Grécia, por isso será o "check" deste ano.

9. E custe o que custar, venha o que vier, eu sei que terei de voltar a escrever. Há dias, aquando da marcação do cruzeiro, tive uma dúvida sobre um dos sítios onde parámos numa das viagens anteriores e voltei atrás nos meus posts. E estava tudo lá, com detalhe e precisão, de tal forma que quase me permite viajar de novo, ainda que sentada no meu lugar. E nesse momento pensei, e soube, que tenho mesmo de continuar a fazer isto: não só roteiros e crónicas de viagem, mas escrever de uma forma geral. Tenho saudades - mas elas não compram horas extra no meu dia, não arrumam a casa nem fazem a sopa. Passaram-se três anos de namoro e ainda não consegui reorganizar a minha vida com todas as "novas" rotinas e hábitos - mas ainda não perdi a esperança. Tenho saudades - e, no fundo, espero que também tenham saudades minhas.

 

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01
Nov20

Uns são filhos (os supermercados) e outros são enteados (os feirantes)

Há uns dias vi o vídeo do Gustavo Carona (podem ver aqui) e não podia estar mais de acordo. O Covid é um problema sério, que não podemos ignorar - e não é nos hospitais que ele vai ser resolvido. É nas ruas, é nas nossas casas, é nas empresas. Está literalmente nas nossas mãos - essas, que carregam tanta coisa invisível, e que hoje tomam uma importância extrema no que diz respeito ao transporte do vírus ou à sua eliminação (se as lavarmos e desinfetarmos bem e corretamente).

Concordo também com ele no facto de isto não se poder tornar numa luta política - não interessa quem está no poder. De direita ou esquerda, uma coisa eu sei: não queria estar naqueles calcanhares. Não tendo qualquer empatia com as pessoas em questão (e não comungando com muitas das suas convicções políticas), eu não queria ser primeira-ministra, não queria ser ministra da saúde, não queria ser a diretora geral da Direção Geral de Saúde. E há que respeitar as posições que estão a tomar - porque nenhuma vai ser boa e nenhuma vai ser fácil e todas serão controversas.

Mas há aqui um erro generalizado que está a revoltar a população: chama-se falta de coerência. Não deixam as pessoas ir ver um jogo de futebol, ao ar livre, num estádio com espaço para mais de 50 mil indivíduos; mas deixam que exista público na fórmula 1. É para ricos, não é? Também deixam que se vá às touradas. É para chiques, não é? E o Avante? É para camaradas, pois claro.

A mim não me afetam as restrições - dou-me bem com regras e sou boa a respeitá-las. Não me importo de não sair do concelho, não me importo do dever cívico de um recolher obrigatório (embora não possa exercer o meu trabalho em casa, sendo obrigada a fazer a minha vida normal), não me importo de usar máscara na rua, não me importo de esperar na fila do supermercado para não sermos 5628 pessoas à volta da mesma peça de fruta.

Mas importo-me com os contra-censos que mencionei acima. Revoltam-me mais estas cedências estúpidas - em prol de favores, de dinheiro, de tudo o que não devia contar - do que as próprias pessoas envolvidas nestes atos, que apesar de inconscientes só estão lá porque à partida a cancela não estava fechada. E sei que não me revolta só a mim: revolta-nos a todos, porque não é preciso ser nenhum génio para perceber as incongruências que existem.

Sobre as medidas que saíram ontem para os concelhos com risco elevado (que incluem as cidades onde moro), mais uma vez, acato e respeito o que foi decidido - mas a última medida, que proíbe que se façam feiras e mercados, mexe comigo até aos ossos. O Covid afetou-nos a todos: psicologicamente, pelo medo e pelo tempo de confinamento; fisicamente, principalmente àqueles a quem o bicho já pegou e sofreram consequências físicas; e financeiramente, para quem perdeu o emprego, para quem viu os seus postos de trabalho ou empresas em lay-off, para quem perdeu inúmeras oportunidades de negócio num ano que se queria promissor. Serão muito poucos os que beneficiam disto - eu olho à minha volta e não vejo ninguém. Mas a mim ninguém me obrigou a deixar de trabalhar - mas aos feirantes, que vendem bens de primeira necessidade, acabaram-lhes com o negócio. O Continente pode operar, o Pingo Doce, o Mercadona e o Mini-Preço também; mas uma feira ao ar livre, sem ar-condicionados, sem carrinhos que são manipulados por milhares de pessoas e sem tapetes rolantes podem trabalhar. Aqueles que o estado segura e promove; as Sonae's e Jerónimo's Martins desta vida, que mais do que dinehiro, movem influências. Mas os feirantes - pessoas como nós, sem as contas cheias de zeros e sem amigos na assembleia -, que acordam todos os dias às tantas da madrugada para andarem com as tralhas às costas, de sítio para sítio, para se fazerem à vida e terem o seu ganha-pão, têm de ficar em casa.

Eu, podendo, deixava de ir a super-mercados - ia sempre à feira. Estar antes das oito da manhã a fazer compras ao ar livre é terapêutico para mim - e a qualidade daquilo que compro é infinitamente melhor. A minha sopa não é a mesma se não for feita com as coisas que compro vindas da terra, ainda sujas, ali da Póvoa do Varzim.

Mas a D. Carolina já não me pode vender batatas, alho-francês, courgete ou agrião.

A senhora das flores já não vai estar lá com aqueles raminhos bonitos que dou semanalmente à minha mãe.

Já não posso ir comprar a manga do Algarve à D. Carla, nem a uva sem grainha ou o melão doce que me deixa sempre experimentar antes de comprar.

Não posso ir comprar os fidalgos da minha mãe à senhora que me chama sempre "meu amor".

O senhor das árvores de fruto já não me vai dizer que trouxe, finalmente, os pêssegos-paraguaios carecas para eu plantar no quintal.

Por isso hoje, mais do que pelas multidões na Nazaré, concertos ou filas para o que quer que seja, estou triste - e revoltada! - pelas pessoas que todas as semanas me enchem os armários, o frigorífico e a alma. Pelas pessoas que me tratam com empatia, que me aconselham aquele fruto em vez daquele, que me deixam pagar na semana seguinte se se apercebem que não trouxe trocos suficientes. Tudo o que não acontece num supermercado, onde eu - como todos - sou tratada como um número e constantemente enganada por cupões e cartões e cadernetas autocolantes. 

É incoerente, triste e, acima de tudo, revoltante. 

16
Abr20

38 não é só um número de calças - é de auto-estima

No início do ano ganhei coragem para ter um encontro com a balança. Depois chorei. 

Há momentos na vida que são de reviravolta e não têm de ser necessariamente especiais ou bonitos. Não há uma fórmula mágica. Lembro-me perfeitamente de há uns dez anos me ter olhado ao espelho, enquanto mexia na cara, e reparei no quão horrorosas estavam as minhas unhas roídas. Deixei de as roer a partir daquele momento. Foi um clique.

Aqui também foi um bocadinho assim. Não se emagrece tão rápido como se deixa de roer as unhas, mas aquilo despoletou uma ação. Passados vinte minutos estava a ligar para uma clínica de nutrição e decidi-me mesmo a perder o peso a que me tinha proposto (na altura até escrevi aqui, nos meus objetivos, que queria despedir-me de pelo menos 5kgs).

Demorei mais uns dois meses até voltar a subir à balança; as calças já começavam a ficar largas, mas eu tinha medo de que o esforço não estivesse a dar resultados. Quando ganhei forças vi que tinha perdido quase seis quilos. Vitória! Fiquei tão feliz! E agora que já tenho uma série de hábitos enraizados, decidi que queria ir pelo menos para os 60kgs - na loucura até um bocadinho menos, que sempre foi o meu peso de sonho.

E depois apareceu o Covid-19. Não sou das que está em casa e precisa de deixar mensagens no frigorífico para me lembrar de que não tenho fome, mas nestas coisa das dietas a rotina é muito importante. E, mesmo continuando a trabalhar,  muito mudou. Para além disso o fator stress também tem de entrar em conta - há quem coma mais para compensar, há quem coma menos. Eu sou das que me vingo na comida (obviamente...).

Ainda assim digo, com orgulho, que devo ser a única pessoa no país inteiro que, desde que isto começou, não fiz um pão ou um bolo. Comecei a dieta numa altura cheia de aniversários e festas e jantares e dei por mim a ter de saber gerir esta questão: por um lado não posso não comer (podendo até passar por mal educada), mas por outro não posso aproveitar a situação para me vingar e comer por todos os dias em que não o fiz. 

Por isso, neste momento, limito-me a tentar levar essa estratégia avante (nomeadamente com a Páscoa e seus  pães-de-ló e amêndoas do demónio) e, pelo menos, não engordar. No entanto, graças às mudanças de rotina e de horários, surgiu algo positivo: comecei a treinar! Corrijo: o meu namorado começou a treinar. Eu vi-o uma e outra vez a suar as estopinhas ali à minha frente, enquanto copiava os exercícios que passavam na televisão, enquanto eu continuava refastelada no sofá a ler o meu livro. Até que fiquei com vergonha de mim própria e da minha falta de força de vontade. Resultado: treinos de meia hora a 45 minutos, cinco vezes por semana (fazemos descanso de três em três treinos). E a verdade é que se antes emagreci, hoje sinto-me mais tonificada (em relativamente pouco tempo). 

No meio de tudo isto as calças iam-me começando a cair pelo rabo abaixo. Um dia, mal entrei em casa, disseram-me: "essas calças ficam-te horríveis de tão grandes". E, aproveitando os Shoppings Days da Mango, mandei vir uma série de calças 38 - número que não visto há, seguramente, seis ou sete anos (senão mais). Quando chegaram fiquei nervosa. Quando me serviram fiquei estupidamente feliz.

Sempre me irritaram as discrepâncias dos tamanhos das roupas de marca para marca - e sei que algumas calças que tinham escrito "40" eram, na verdade, um 42 (embora, mentalmente, não o aceitasse). E, também por isto, é errado medirmo-nos por uma tabela que não é constante. No entanto é inevitável não sentirmos a felicidade de fechar um botão que, há três meses, não conseguiria caber na sua casa. E é também uma responsabilização acrescida das minhas próprias ações, sabendo que consegui e lutei por caber naquelas calças - e que terei de as manter se quiser continuar a entrar nelas e a apertar o fecho. E, acima de tudo, é aprender a gostar mais de mim. A não desviar o olhar do espelho quando entro na banheira. E perceber que não sou perfeita, mas que ao menos lutei para me sentir melhor com o meu próprio corpo.

 

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17
Mar20

As saudades do abraço de um pai (ou de uma mãe)

É uma sensação estranha estar privada do contacto físico com os meus pais. As saudades de um abraço e um beijo dos pais é uma coisa comum de se ouvir - mas da boca de quem os perdeu. No entanto, nestes tempos estranhos que correm, as carícias são proíbidas: não porque eles não estão cá, mas precisamente porque os queremos por muito mais tempo.

Por um lado sou uma sortuda, porque decidimos em conjunto (e pelas várias condicionantes que temos - nomeadamente por eu e o meu pai continuarmos a trabalhar, ainda para mais no mesmo meio) que continuaria a frequentar a casa deles - e por isso falo-lhes sem ser a um telemóvel de distância. Por outro lado, preferia estar em casa - e saber que eles estariam na deles, isolados de qualquer perigo que eu possa vir a transmitir-lhes (independentemente de máscaras, da ausência de toques ou da quantidade de vezes que esfrego as mãos com sabonete). 

É estranho que no momento em que mais sinto falta do colo da mãe, ela não mo possa dar. Que queira dar um aperto de mão, em forma de alento, a qualquer um dos dois... e não o possa fazer. Que estes dias, os que não podemos abraçar-nos, sejam os mesmos em que percebemos a importância desse aperto peito-a-peito, e a força que transmite.

12
Mar20

Uma epidemia de incoerências e de falta de respostas

Nas primeiras semanas optei por desligar a televisão e ir-me mantendo atualizada mais em pleno de manhã, através da newsletter do Observador e, nas coisas de última hora, pelas redes sociais, em posts que saltavam à vista aqui e ali (maioritariamente dizendo que "ainda não há Corona vírus em Portugal). 

O ciclo quebrou-se quando, wow!, apareceu um caso. Foi quase uma rave nas redações deste país, que estavam a ver que, para além da Eurovisão, iríamos ser também os últimos nesta pandemia de última moda. Mas depois apareceu outro e outro e outro infectados. Começaram as quarentenas. Começaram os apelos. As recomendações. O que continuou? A informação, que de tão exagerada, se tornou em desinformação. Que virou ativador de pânico.

Procurei sempre manter-me informada, ler coisas que vão para além das nossas palas pequeninas e dos "diretos exclusivos" das televisões portuguesas. Pesquisei sintomas, estatísticas e dados reais, de todo o mundo. Tive imediatamente medo pelos meus pais, mais velhos, e pelo meu irmão, doente crónico. Não temo pela minha saúde, que pelas estatísticas está pouco em risco, mas pela deles e a hipótese que tenho de as estragar caso fique infectada. Fui a primeira a cessar beijinhos e apertos de mão quando vi que o cerco estava a ficar estreito e os casos a aproximarem-se cada vez mais; pus a questão de deixar de visitar a casa dos meus pais por uns tempos. Lavo as mãos com ainda mais frequência. Tenho cuidados.

Mas começa a assolar-se sobre mim o medo de não saber o que vai acontecer, principalmente a nível de trabalho. Essa foi a minha primeira preocupação, ainda o vírus não tinha chegado à Europa. Importo matéria-prima da Ásia: e agora, se não chega? E se não há? A economia chinesa tomou tais proporções, açambarcando tudo e todos, que nem sequer consigo ir buscar o que preciso na Europa!

Hoje, a questão vai além da matéria-prima. O meu negócio é de indústria. Eu adorava, mas nem eu nem os meus trabalhadores podemos operar fora da fábrica. As máquinas não trabalham sozinhas. E o que vamos fazer? Fechar a fábrica e esperar? E como é que eu pago salários no final do mês se não produzo?

Estou numa fase de irritação porque só quero uma coisa: respostas. Sei os riscos, sei o que devo fazer, sei os sintomas. Mas quero respostas para as medidas que estão a ser tomadas. Os funcionários públicos vão receber à mesma se ficarem em casa - e os outros, que trabalham em empresas privadas? E eu, que estou à frente de uma empresa que se não trabalhar vai à falência, e que não pode laborar sem ser in loco?

Quero perceber como têm a lata de apelar à calma quando as televisões põem qualquer ser vivo em estado de alerta. Quando dizem que devemos estar em casa, mínimo contacto possível com os outros, e continuam com aulas (que são só aglomerados de 30 alunos dentro de uma sala e centenas deles cá fora) de miúdos, esses sim, que não tem noção das coisas e não tomam as devidas precauções. As mesmas pessoas que tomam medidas como fechar feiras ao ar livre (ponho a mão na cabeça a pensar naqueles feirantes...) mas que não pensam nos centros comerciais, locais de negócio totalmente fechados e onde o risco deve ser ainda maior.

A culpa do pânico e do açambarcar dos supermercados não é nossa: é de quem produz a informação e de quem a veicula. E pânico gera pânico: eu, que até posso nem ter medo do Corona, que sou consciente, hoje tenho medo de ir ao Lidl e não ter carne para o jantar. E o que vou fazer? Como os outros, açambarcar coisas que não precisaria mas que já percebi que não vou ter acesso fácil nos próximos tempos.

Eu só quero respostas - como cidadã, como filha, como empresária. Também quero medidas - mas, de preferência, com menos incoerências por parte de quem manda. Até lá, não tenho outra hipótese senão fazer a minha vida normal, com todos os cuidados extra que já fazem parte do dia a dia.

17
Dez19

Os dias depois de uma operação

Acho que todos, pelo menos uma vez na vida (nem que seja quando éramos miúdos!), num dia de preguiça extrema, desejamos estar doentes para ter uma desculpa para ficar em casa. Nada de grave, claro - uma gripezita ou uma constipação, ou simplesmente uns espirros aqui e ali, a par de um nariz entupido, só para dar autenticidade à coisa. Mas a verdade é que nesses momentos esquecemo-nos do quão chato é estar doente; que aquela visão idílica de tempo livre para fazermos o que nos apetece é uma mera utopia, estragada pelo facto do corpo não cooperar connosco. Deixamos de ter vontade de tudo, forças para o que quer que seja. 

Acho que a culpa é do nosso cérebro, que nos faz esquecer certas coisas - nomeadamente estados de espírito -, até como forma de proteção. Eu própria, acho que para me reconfortar e me preparar mentalmente antes de fazer esta mais recente cirurgia, achei que ia conseguir aproveitar imenso o tempo que ia estar sem trabalhar e pôr imensas coisas em dia. E a verdade é que tentei - talvez até em demasia, por estar óptima depois da operação - o que culminou com um retrocesso na minha recuperação. Fui relembrada pela vida que as dores não nos dão vontade de fazer coisas. Que o cocktail de medicamentos que temos de tomar faz bem a umas coisas mas ataca tantas outras. Que a anestesia deixa rasto durante os dias. Que a sensibilidade e o humor ficam alterados perante o estado em que nos encontramos. Que o cansaço vem mais rápido do que antes quando estamos nestas situações. Que estar sentado é praticamente a nossa posição default e que não poder estar dessa forma significa passar o dia inteiro no sofá, praticamente inerte, enquanto vemos as horas do dia a ir passando lentamente.

Faz amanhã duas semanas que fui operada. E o que fiz? Praticamente nada. Devido a uma infecção à posteriori dei por mim até incapacitada de estar no computador. Vi televisão. Vi séries. Dormi e não dormi (principalmente à noite). E limitei-me a manter-me à tona da água, só com o único foco de não me deixar ir abaixo.

Se o processo do antes, durante e depois de uma cirurgia é difícil para todos, imagine-se para alguém que durante toda a vida teve fobia de médicos. Para alguém que recorda o pior dia da sua vida como aquele em que foi operada pela primeira vez este foi, simplesmente, o realizar de um pesadelo. Era, desde há quatro anos, um dos meus maiores medos: uma recidiva. E aconteceu. Mas não deixa de ser curioso como esse acontecimento mau foi quase uma cura de choque para o trauma que sempre tive e da marca que me ficou após a primeira cirurgia. Todo o processo foi um reviver daqueles momentos que o meu cérebro, mais uma vez, apagou. Tenho hoje plena perceção de que apesar de recordar os tempos da minha operação com tremenda dor, restam apenas alguns flashes daquilo por que passei. O vestir das roupas do hospital, a horrível espera, o caminho para o bloco, o inserir do catéter, a visita da anestesista, o colocar da máscara, o acordar no recobro. Muito disto tinha sido apagado. E à medida que  o tempo ali ia passando, que eu me ia movimentando no espaço, tudo ia reaparecendo e as peças do puzzle recomeçaram a ser montadas. E isso foi tão doloroso como reconciliador.

Ter sido eu a marcar esta cirurgia foi um grande passo. Ter ido para o hospital sem tomar qualquer tipo de ansiolítico foi um enorme passo. E ter-me conseguido levantar e caminhar para o bloco, deitando-me no sítio onde me iriam abrir, com toda aquela panóplia de instrumentos assustadores e dos médicos que os rodeavam, foi um passo gigantesco. Nesse momento, em que senti que tinha chegado ao meu limite - da coragem, da força, da sanidade mental - só pedi que me pusessem a dormir.

Hoje, só peço para acordar. Para que isto acabe e para que possa ter a minha vida de volta. Já está, já superei, já demonstrei que sou capaz. Acho que, por agora, já chega. Quero viver um bocadinho.

23
Ago19

Menu de fim-de-semana: Círculo Perfeito

A página ideal para sabermos mais sobre saúde feminina

Sempre fui muitíssimo reservada. Em tudo. Nunca interpretei isso como "ter segredos" - simplesmente acho que há determinadas coisas que estão dentro de uma bolha demasiado pessoal para se partilhar. Acho que essa é só uma das 48903 razões pela qual sempre detestei ir ao médico: as perguntas. Se ia regularmente à casa de banho, quando é que me tinha vindo o período pela primeira vez (serei a única criatura do mundo que não faz a mínima ideia e simplesmente lança um número à sorte?!), se tinha uma vida sexual ativa. Eu percebo o propósito mas..! Deslarguem-me, que esse tipo de partilhas não são para mim, e eu prefiro focar-me no essencial.

Esta bolha que criei para mim própria fez com que nem sequer gostasse muito de ouvir falar sobre determinados assuntos. Sim, eram tabus. Criados por mim. E foram eles que sempre me forçaram a desenhar uma linha muito clara entre o que é da esfera íntima e o que não é, nomeadamente devido àquilo que decidia partilhar aqui no blog. Recordo-me da minha incredulidade quando alguém um dia me disse, depois de eu ter feito um post a propósito do ano novo, que agora toda a gente sabia que eu usava cuecas azul-bebé naquela noite de transição. Na altura fiquei confusa. É grave saber-se que, como tantas outras pessoas, uso cuecas daquela cor, naquele dia em específico? Que sigo uma tradição cumprida por tantos?

Esse episódio não mudou a forma como atuo aqui no blog, estou segura de tudo o que sempre partilhei - e que, claro, acho que deve ser dito ao mundo. Mas esta nova vaga de youtubers e influencers quebrou muitas das barreiras que havia nesse sentido - pelo menos para mim. Percebo que apesar de não gostar de falar sobre certas coisas - e de eu não fazer questão de as abordar no meu blog, porque não considero ser esse o meu papel - há um público para as ouvir. E em alguns casos pode ser mesmo serviço público.

A extrapolação deste conceito pode ser perigosa. Partilhar algumas coisas não é sinónimo de partilhar tudo com detalhes. E partilhar a nossa experiência, às vezes infundada e pouco argumentada, também não contribui para o conhecimento alheio - só para a formação de ideias erradas e da típica conversa do "eu conheço uma pessoa que...". E se os youtubers tiveram o mérito de abrir caminhos e mentalidades, servir de ombro amigo e poço de respostas para coisas que muitas pessoas (maioritariamente jovens) não querem perguntar, a verdade é que por vezes pecam pela desinformação que propagam. É um pau de dois bicos.

No entanto há projetos com valor - que não tem nada de teen, da nova vaga de youtubers, mas que sabe aproveitar as redes sociais para o bem geral. Descobri o Círculo Perfeito através da Maçã de Eva e diria que foi a descoberta deste verão! É uma página dedicada à saúde feminina, em toda a sua plenitude. A autora é a Patrícia Lemos, que dá workshops e faz sessões individuais nas áreas da saúde menstrual, da fertilidade e contracepção (nomeadamente o método natural de fertilidade, onde não se faz uso de nenhum método contraceptivo clássico, mas usa-se o conhecimento do nosso próprio corpo para controlar as alturas férteis). Eu, apesar de não ter interesse em mudar o meu método, gosto sempre de aprender mais; como se diz, o conhecimento não ocupa lugar! E já tenho aprendido imensas coisas que não sabia com os posts da Patrícia. Sou hoje uma pessoa mais informada graças a esta página - e espero continuar a aprender. Sem fundamentalismos ou segundas intenções, acho que é isto o bom da internet: o poder de propagar o conhecimento. Agora é só usufruir!

 

Círculo Perfeito no instagram

19
Ago19

O milagre do betacaroteno

Hoje é o meu último dia no Algarve - o último destas férias e provavelmente o último deste ano. Não tem dado para escrever. Entre as caminhadas, o kaiak, as partidas de volley e de ping-pong (meu deus, o meu namorado conseguiu o milagre de me fazer parecer desportista...!) e a falta de disponibilidade mental para o fazer, com a cabeça em problemas distantes que não consigo resolver, resta pouca energia e tempo para pôr os dedos a teclar e a cabeça a escrever. Não que me falte vontade, inspiração ou coisas para falar. Há alturas em que simplesmente as palavras não surgem - e não vale a pena fazer um grande drama disso.

Mas voltemos ao tema: Algarve e sol, provavelmente o único sítio no país onde o verão decidiu aparecer. Esta conjugação de fatores tem, nos últimos anos, constituído um problema para mim: alergia ao sol. Fico rapidamente com a pele vermelha e repleta de bolhinhas, que me dão uma comichão de bradar aos céus.

Da primeira vez que me aconteceu, estando completamente a leste, passei numa para-farmácia para comprar um after-sun, para ver se a coisa melhorava. A funcionária foi perentória: eu estava com alergia ao sol, tudo porque aos 20 e poucos anos já tinha apanhado a quantidade de sol que era suposto ter ao longo de toda a minha vida. Por outras palavras: tinha esgotado o meu plafond solar.

Fiquei um bocadinho abananada - e ainda duvido muito da sua teoria. Ainda assim, essa visão drástica foi um pouco assustadora. Mas a senhora pôs água na fervura: a única solução era comprar betacaroteno. Pedi-o logo de rajada. Veio a cereja em cima do bolo: "agora não vale a pena, tem de tomar com bastante antecedência". E foi nesse ano que, em desespero de causa, conheci o ISDIN, quando perguntei no Facebook se alguém me podia ajudar em relação àquelas comichões. Foi bom, ajudou, continua a ser o meu protetor de eleição apesar de custar os olhos da cara, mas não resolveu totalmente.

A situação replicou-se nos anos seguintes e desta vez eu levei a coisa a sério: depois do primeiro dia de sol do ano (lá para Maio, o que se veio a perceber ser demasiado cedo) comprei betacaroteno e tenho tomado desde aí. Dizem que prolonga e promove o bronze - algo que honestamente não sinto - mas, para mim, cumpre o objetivo: acabou-se a alergia. Nunca desprezo o uso do protetor e mesmo nos raros dias em que apanhei escaldões (coisas leves), nunca se transformaram em bolhas ou numa sensação de coceira infernal. Missão cumprida!

O verão já tem fim à vista, as minhas férias estão a acabar e eu estou na última cartela dos comprimidos. Por este ano, o betacaroteno já está a dar os últimos cartuchos mas já temos encontro marcado para o ano. Agora já não falho a toma ;)

 

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