Pensamentos de uma lista-holic
A linha que separa uma pessoa organizada de um comportamento obsessivo-compulsivo
Mais um ano, mais um campismo de família. Desta vez foi por um triz que se realizou – confesso que a vontade era pouca, muito provocada pela fraca adesão da família durante este ano. Mas cá estamos, desta vez em Vila Praia de Âncora.
O campismo é muito divertido mas implica uma logística um tanto ao quanto complicada. Há uma grande desvantagem neste tipo de férias: independentemente do número de pessoas que venham, a mala do carro vem sempre cheia. É tenda, mesa, cadeiras, colchões, sacos-cama, lancheira, camping-gas, coisas para lavar a loiça... tanta coisa que o risco de nos esquecermos de algo é muito elevado.
Cresci com um pai extremamente organizado, que antes de qualquer viagem me aparecia no quarto com uma lista, dentro de uma pequena mica, que passava a ditar em voz alta: “cuecas, meias, cartão de cidadão, dinheiro, máquina fotográfica, pasta dos dentes (...)”. Eu ia anuindo com a cabeça ou, pelo contrário, apontando o que faltava.
Passaram alguns anos e o bicho da organização passou a morar em mim. E, como diz o ditado, a necessidade aguça o engenho: a verdade é que a lista do meu pai, apesar de muito completa, é dirigida a homens (tinha falta de coisas tipicamente femininas, como artigos de higiene ou roupas que só mulheres usam) e só contemplava objetos para viagens normais. O campismo exige todo um outro nível de planeamento. Por isso fiz-me ao piso e desenvolvi a minha própria lista – uma folha A4, dividida por categorias (objetos de campismo, roupas, comidas, higiene, eletrónicos e outros), para que nada faltasse. Sinto-me, honestamente, muito orgulhosa do meu feito!
Por isso, por achar que as listas têm uma beleza própria e por achar piada ao meu próprio sentido de organização, partilhei há dias uma imagem da minha lista no instagram. Recebi várias mensagens com emojis a chorar a rir e outras tantas, mais direta ou indiretamente, a dizer que eu era maluca. E eu fiquei a pensar naquilo.
O que distingue uma pessoa organizada de outra com um transtorno obsessivo compulsivo? Sim, eu sou organizada; sim, dá-me prazer ver tudo organizado por categorias, enfiado em compartimentos próprios. Gosto que as coisas tenham sítios para estar, adoro saber onde posso encontrar tudo. Não gosto de caos. Não gosto que faltem coisas que sinto que vou precisar – daí a necessidade de uma lista vasta neste tipo de férias.
A questão é que não me dá um chilique ou calores quando as coisas estão fora do sítio. Não fico stressada se vir que me faltou alguma coisa. Sei lidar tranquilamente com isso. E penso que é essa a linha que separa uma coisa da outra: não só a forma como fazemos as coisas, mas acima de tudo como reagimos às contrariedades, ao oposto daquilo que gostamos e desejamos.
Sou uma orgulhosa lista-holic, gabo-me da minha organização. Para os que acham o contrário, também dou bem por maluca. Uma maluca organizada, se faz favor.