Charlie Hebdo (ou brincar com o que não se deve)
Acho que já confessei aqui um dos meus maiores preconceitos - que tende a crescer e a agravar-se à medida que o tempo passa - é em relação aos muçulmanos. Já fui à Turquia, um país relativamente ocidentalizado, e não gostei. Gostei das mesquitas, gostei de muitas outras coisas: mas não das pessoas. Mesmo sabendo que só uma pequena parcela daquele povo é terrorista, mesmo sabendo que são pessoas, como nós, ocidentais.
Mas, gostando ou não, acima de tudo deve haver respeito mútuo. É óbvio que, com o SIS a executar jornalistas e outros cidadãos todos os dias, respeito é algo que não existe, mas creio que por os outros errarem, não devemos fazer o mesmo. Sempre me ensinaram que a nossa liberdade acaba onde começa a dos outros, e aqui se insere a liberdade de expressão. "Charlie Hebdo", um jornal satírico francês, brincou várias vezes com o fogo. Numa das 398 reportagens que já vi hoje sobre o assunto, viam-se várias capas do jornal, algumas delas bem fortes, com Maomé em posições duvidosas e em brincadeiras, para mim, pouco respeitosas e que passavam claramente dos limites.
É claro que a sangria que aconteceu hoje em Paris não tem justificação possível - muito menos meia dúzia de imagens publicadas ao longo dos anos sobre esse assunto. É terrorismo puro. E, sim, um atentado à liberdade de expressão - mas também esta tem limites. Podemos criticar, investigar, argumentar, descobrir, difundir - é esse o papel do jornalistas. Porque, como tanto se apregoa aí por esse facebook neste dia de tragédia, "não há armas que travem o papel e a caneta". Mas há barreiras (quase) intransponíveis. Da mesma forma que os cristãos não gostam que brinquem com a figura do Papa ou de Deus, acho natural que os muçulmanos se sintam ofendidos quando trabalham com a imagem de Maomé ou líderes muçulmanos da forma como os cartoonistas daquela revista faziam. A diferença é que nós, ocidentais, pomos processos em tribunal por difamação - já eles: matam. E fazem-no à grande, de forma a que nós nos recordemos.
Mas, enfim, o que podíamos esperar de uma religião que mata as mulheres à pedrada?