Slow living
A única coisa que nos Açores me deixou preocupada foi o facto de eu gostar tanto daquela vida e daquela calmia. É um facto que só lá estive uma semana – longe de ser o suficiente para me fartar daquilo – mas já noutros momentos eu me tinha apercebido de que uma das coisas que me dá saúde mental é não ter de andar sempre a correr, é não sentir a necessidade de reclamar com o trânsito, é não ter barulhos de fundo. Não é a ausência de regras – essas, tenho-as sempre, em tudo o que faço – mas sim não ter o stress da sociedade toda em cima de mim.
E isso assusta-me, porque o plano que eu tenho para a minha vida não é esse. Lembro-me de ser mais nova e pensar que queria que a minha vida fosse um corropio, sempre com coisas para fazer, nunca parar, viajar, aviões, trabalho, reuniões, feiras. Enfim, muita confusão – um bocadinho à semelhança do que vi os meus pais fazerem. E eu sei que para se ter sucesso em qualquer área que seja é necessário trabalho – e, nos dias de hoje, sucesso e trabalho não ligam com sossego e calma. Acho que nunca ligaram, mas agora mais do que nunca, numa altura em que somos obcecados com a eficácia e a eficiência e os índices de produtividade e tudo e tudo e tudo. E eu, como futura empresária que me imagino, também serei (pelo menos em certa parte) motivada e obrigada a olhar para esses fatores e sei – por já ter visto – que nada me é entregado de mão beijada e eu vou ter de lutar muito e trabalhar muito para ter aquilo que quero e manter o meu nível de vida.
Ou seja: há aqui um conflito de interesses. Por um lado o facto de saber que sou mais feliz com uma vida pacata e calma; por outro, saber também que aquilo que quero não se compadece muito bem com esse estilo de vida. A não ser nas férias – que é precisamente o que estou a fazer agora, antes que chegue Setembro e que me arrebate de cansaço com as extremas mudanças que vai trazer para a minha vida.
Depois da dose de sossego que levei nos Açores e de um dia que passei no Gerês, estive a acampar com toda a minha família em Castelo Branco. Dentro do campismo, a paz não é muita – nunca é, quando se juntam quase 30 pessoas, com crianças pelo meio, que querem pôr os assuntos de um ano em dia. Mas a calma da vila onde estive aqueceu-me a alma. Ver o rapaz da caixa de supermercado a contar os cêntimos a uma senhora velhinha, para ela pagar a conta; vê-lo a apanhar calmamente uma aranha com a mão, que estava em cima do tapete das compras, e sair do seu posto de trabalho para a ir pôr lá fora; abrirem-nos a porta do mini-mercado quando já íamos fora de horas comprar bebidas para o jantar; ver os banquinhos de jardim todos alinhados, dia após dia, mesmo depois das jogatinas de cartas pela tarde fora.
São pessoas que não têm pressa – o que não significa não ter respeito pelo tempo dos outros. Se fosse no Porto, já estaria a reclamar porque a senhora já devia ter o dinheiro preparado e porque era muito mais prático o rapaz ter matado o bicho. Porque temos sempre sítios para onde ir, coisas para fazer, assuntos para tratar. Mas ali não. É como se a medida de tempo fosse diferente, como se o tempo não passasse tão rápido. É o chamado slow living. E é maravilhoso.