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Entre Parêntesis

Tudo o que não digo em voz alta e mais umas tantas coisas.

06
Nov24

O futebol português tem muito para aprender

Sou sócia do FCPorto há 20 anos. A minha avó, vendo-me a crescer portista ferrenha, decidiu inscrever-me junto do senhor que passava à porta de casa dela a recolher as quotas do meu avô. Foi uma prenda muito feliz. Porque eu era, de facto, adepta fervorosa do Porto e guardo memórias incríveis dos meus tempos de miúda e adolescente, enquanto tentava a todo o custo arrastar alguém comigo para o estádio (e consegui - foi com a minha irmã e o seu namorado que fui ao Dragão pela primeira vez, e ao longo dos anos consegui convencer o meu pai a acompanhar-me umas quantas vezes - ainda que contra a sua vontade - o meu irmão mais velho e até amigos). Mas desde há uns anos que a minha paixão esmoreceu - a podridão do futebol começava a ser cada vez mais evidente aos olhos que já não era da miúda meramente portista mas sim de uma adulta com valores e moral que não concordava com aquilo que via. Nem o Miguel, tripeiro ferrenho e detentor de lugar anual, me demoveu deste desamor - pelo contrário, muitas foram as vezes que fiquei chateada com o clube por me roubar o marido de umas noitadas no quentinho do sofá.

Por isso fez-me sentido deixar de pagar as quotas durante uns largos meses: não me apetecia alimentar aquele negócio de mafiosos. Mas, no início deste ano, o Villas-Boas candidata-se oficialmente e eu decidi voltar, num gesto de cidadania e sentido de dever para com o meu clube. Confesso, até, que fiz também por uma questão de continuidade: primeiro porque me custa prescindir de uma das prendas que me deixou mais feliz e que me foi dada pela minha querida avó, e segundo porque estou a cinco anos de receber a roseta de prata e não queria agora morrer na praia. Regularizei a minha conta corrente, esperei pelas eleições e pumba: foram marcadas na única semana do ano em que estive fora do país! A única!!! Mas os meus concidadãos-portistas souberam o que fazer e elegeram a pessoa certa para um cargo que estava a apodrecer. Devemos muito ao Pinto da Costa enquanto clube, mas é preciso saber parar - e ele não só não soube como saiu mal, o que foi uma pena.

A questão é que o Pinto da Costa não era o único problema - ele não era a única fruta podre na fruteira que é o FCPorto. E não é por se tirar a peça maior que tudo vai mudar - é preciso uma mudança longa e algo penosa para se alterar a cultura de um clube (ou de uma empresa ou de qualquer organização que tenha pessoas), que envolve a saída de muita gente mas também alterações de base que são normalmente muito difíceis de instituir. 

A ideia de que os portistas são arruaceiros, mal-educados e "broeiros" não vem de razões alheias. São preconceitos generalizados que nascem de um fundo de verdade qualquer... ainda que não se aplique necessariamente para o todo e que sejam injustos a maior parte das vezes. Sinto que o Pinto da Costa e sua prole tiveram uma quota parte muito grande de culpa sobre a imagem que se passa sobre os portistas e, de uma forma geral, do pessoal do Norte - e acho que, indo devagarinho na direção contrária, o Villas-Boas está a levar o clube num bom caminho. O gesto do Pêpe é um bom exemplo disso. (Em confronto, podemos lembrar-nos de todas as vezes que o Sérgio Conceição foi mal educado com os árbitros, que faltou a conferências de imprensa e outras coisas que tais - e tantos outros exemplos feios que há no futebol, a começar pelo anti-jogo que praticam e os nomes que se chamam uns aos outros).

Mas aquilo que eu almejo mesmo para o meu Porto é que consiga dar uma volta de 180º como deu o Sporting. E esta é a razão deste meu post, que surge numa altura completamente aleatória e um pouco descontextualizada, mas que tinha de ser escrito hoje depois do que se passou ontem no jogo contra o Manchester City. O Sporting passou de ter como presidente uma figura anedótica (não sei quanto a vós, mas eu divertia-me imenso com o Bruno de Carvalho - as conferências de imprensa eram dos momentos mais divertidos do meu dia) para ser um clube com uma gestão cautelosa e amistosa, sem levantar ondas de maior. Não sou fã do Varandas, mas acho inquestionável o rumo para onde leva o clube verde e branco - e isso provou-se ontem, no último jogo do Amorim em Alvalade.

As saídas a mal de inúmeros treinadores do Porto (incluindo o Villas-Boas, depois de se ter pronunciado sobre a sua "cadeira de sonho", do Mourinho que mal festejou depois de ganhar a Champions, ou mesmo do Conceição, cujos relatos da reunião com o novo presidente são dignos de curta-metragem) é algo que me deixou desgostosa e calejada - de tal forma que eu nem sabia que havia forma de fazer as coisas de modo diferente! Aquilo a que tanto o Amorim, como o Sporting, o Varandas e o Manchester United se predispuseram a fazer foi das saídas mais limpas que vi no futebol moderno em Portugal: sem zangas, sem portas a bater e sem lavagem de roupa suja nos meios de comunicação social. É só um homem que quer um futuro num clube maior e que tem o direito de ir atrás do seu sonho; é só um clube que o respeita. É só um treinador que, no momento que achou correto, foi claro como a água com a imprensa e explicou a situação que lhe foi apresentada e a sua visão - sem ironias, sarcasmos ou figuras de estilo que destorçam as suas palavras. É só um clube que aceita, que prepara uma saída em grande para uma pessoa que foi essencial na mudança e um momento em que todos saem a ganhar (ainda que sabendo que a perda é muito grande) e para mais tarde recordar. 

Que sirva de lição. Esta era a imagem que eu gostava de ter do Porto daqui a uns anos.

 

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(foto daqui)

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