Letargia
No início era a letargia. Aliás, se me perguntarem uma das coisas que mais detesto em mim, é esta veia letárgica. Se calhar, quando me questionam sobre os meus defeitos, eu lembro-me de tanta coisa e com nomes tão mais simples que são os primeiros que disparo; mas que não haja dúvidas que a letargia tem um viveiro algures cá dentro e é das coisas que mais mexe comigo. Ainda me recordo mais ao menos da altura em que descobri esta palavra e pensei "isto é tão eu; este é o meu mal". E é verdade.
Mas é isto: aí há umas duas semanas, a letargia instalou-se. Não sei se sabem, mas ela é assim tipo fungo: a partir do momento em que se aloja em alguém, é o fim do mundo para a tirar. Pode adormecer, mas volta sempre. E voltou em força e eu, que já não a via há muito tempo, deixei-me engolir. E a partir daí trava-se todo um processo diabólico, que me faz sinceramente sofrer. É aquela história do diabo e do anjo que se instalam nos nossos ombros e berram um com o outro. O diabo encarrega-se de me levar pela ribanceira abaixo, rindo-se maléficamente por eu me deixar ir; mas enquanto isso o anjo mói-me o juízo, grita-me aos ouvidos "porque raio é que te estás a ir abaixo quando não tens razão absolutamente nenhuma para te queixares, sua parva?". E aí, para além da letargia, eu fico irritada e chateada comigo mesma, porque o raio do anjo tem razão, porque eu estou bem, porque não tenho razão para estar assim quando há tanta gente mal no mundo, mas estou cansada, porra, e sinto-me mal na minha pele, e não tenho força de vontade para me meter num ginásio, e há coisas que não estão a correr como eu queria, e não ando com vontade de trabalhar, e acho que tenho vinte doenças e mais algumas, e preciso de sol e de algo que me dê vida e... e... sentiram-se cansados ao ler isto, não sentiram? É que eu sinto.
Ando triste, cansada, desinspirada, sem força, adoentada. Tenho-me sentido incompetente, sinto que estou a falhar, para comigo e para com os outros. Não tenho tido a capacidade de me superar e isso entristece-me imenso. E, por outro lado, sinto que já não sou esta pessoa que vive neste lado negro: sei que tenho um lado melhor de mim cá dentro, porque já o vivi, já o senti, já o transmiti aos outros. Mas má onda traz má onda, a ansiedade também se alojou em mim e trouxe-me mais uma série de problemas, começo a questionar as minhas decisões e escolhas, e tudo isto é como uma bola de neve que me engole sem eu conseguir pôr a cabeça de fora para respirar.
Se alguém se questionou pela falta de posts, esta é a razão. Não aconteceu nada. Sou só eu, a ser eu, no meu pior. Estou a tentar vir ao de cima.