Hoje faço anos
Entro nos trinta pesada - muito. No sentido lato e metafórico.
No bolso, o peso do luto da minha irmã, que não tem melhorias lineares - aliás, atravessa agora uma fase bastante agreste. E estes dias, em particular, são muito difíceis de ultrapassar. Ter de lidar com a ausência de alguém que temos como garantido nestes dias importantes é horrível - porque se num dia normal eu até podia nem falar com ela, sei que ela nunca falharia uma chamada ou a sua presença no meu aniversário. Juntar a família e ela não estar ainda é muito duro - e hoje, mais uma vez, luto contra a inércia e esta dor implícita nas nossas vidas, tentando fazer aquilo que acho correto: juntarmo-nos a festejar mais um ano de vida, e tentar andar para a frente. Mas quando o peso da ausência é maior do que todas as presenças... as horas parecem dias a passar. Mas façamos o esforço - sei que seria aquilo que a minha irmã desejaria para nós.
Nas ancas, o peso da comida que como para me confortar, numa busca incessante de algo que alivie a dor, embora nunca nada funcione - o que não impede que continuemos a tentar.
Na alma, o peso da responsabilidade em que me embebi, no que aos meus sobrinhos diz respeito. Não foi algo que alguma vez me tenha sido pedido, mas foi das primeiras coisas em que me atravessei e com o qual tentei sossegar a minha irmã. O meu sentido de moral, o amor por ela - e a extensão dela, que eles representam - e a minha veia de cuidadora não me deixaram fazer as coisas de outra forma. Na minha cabeça passam imagens de um dia já longínquo em que eu, miúda, estive com o meu pai no palanque da igreja, lado a lado com o padre, e em que me tornei madrinha. Embora hoje em dia tenha um simbolismo muito mais fútil e superficial, como é que alguma vez poderia esquecer a honra que a minha irmã me deu de amadrinhar um dos filhos dela? E isso representa mudanças na minha vida - agilizações, principalmente -, mas é tanto um encargo como um luxo poder mimar e ajudar a educar os meus meninos, passando simultaneamente mais tempo de qualidade com eles.
Na cabeça, o peso da exigência que sempre tive comigo própria, e que me diz que devia estar melhor do que estou. Mais feliz, porque estou viva e saudável. Mais grata, porque posso ajudar quem precisa de mim. Mais magra, porque se já consegui emagrecer no passado, devia conseguir fazê-lo de novo. Mais leve, porque supostamente o pior já passou e neste momento já devia poder respirar como dantes.
Nos olhos, o peso de um cansaço com o qual não travo uma batalha justa - o reflexo do desequilíbrio da minha vida no último ano e meio e de tantas, tantas noites por dormir (ou, quando o sono me leva, dos pesadelos que me atormentam quase diariamente).
Que os trinta me tragam leveza,
sáude, coragem e esperança,
e me ensinem a viver com o que os vinte-e-nove me roubaram.
(Figueira da Foz, Dezembro 2024)