Fora da caixa - como foi
Por um lado tenho uma torrente de palavras prontas a sair sobre o que aconteceu quinta-feira - muitas mesmo! Por outro, estou apertadíssima (e isto é um eufemismo) para entregar um trabalho até segunda, o que me está a dificultar muito a vida - tanto em termos de escrita, como de capacidade de resposta para conseguir deitar mãos a todas as pessoas que falaram (ou me adereçaram) durante estes três dias. E a verdade é que ainda estou nas nuvens e não consegui pousar o pé no chão também por isso - ainda não tive tempo de processar a informação, de chorar de saudade e porque aconteceu, de olhar para trás e perceber o que esteve bem e menos bem, de agradecer a toda a gente. Acho que só segunda é que me vai cair a ficha.
Entretanto, e porque estou em abstinência de escrita há demasiado tempo, decidi ir compondo este post (que, muito provavelmente, vai sair gigante) à medida que faço intervalos do livro que tenho de ler para o trabalho - que são um tanto ao quanto frequentes uma vez que as letras pequeninas cansam-me, o inglês exige-me mais concentração que o normal e o sono começa a invadir-me sem pedir licença.
Sei que os leitores normais não gostam de publicações grandes, mas esta vai valer a pena. Acho importante começar a contar tudo, tim-tim por tim-tim, não desde quinta-feira mas sim desde quarta. Ora então.
QUARTA-FEIRA
Fim da montagem do cenário e ensaio geral
No dia anterior o cenário já tinha sido montado de acordo com aquilo que tínhamos imaginado - para isso, quase toda a turma veio carregada de caixas e fita-cola, no meio de comboios, metro e autocarro. Da primeira vez que entrei no estúdio e estava tudo a montar, desfazer e colar caixas, ia-me dando um colapso tal o nível excessivamente elevado de desarrumação, lixo e desorganização em que aquilo se encontrava. Achei que, mal um professor olhasse para aquilo, nos iam expulsar dali. Mas não. Na quarta ainda foram precisas mais algumas caixas (o que perfez uma conta total de 117 caixas) para que tudo ficasse como desejávamos e essa parte ficou rapidamente concluída - a ideia era formar uma parede de caixas, algumas abertas com coisas em tons de vermelho dentro. Funcionou bem.
O passo seguinte era o ensaio geral. Falei com os apresentadores para perceber o guião que tinham preparado, falei com os operadores de câmara para lhes dar a entender aquilo que eu queria que eles fizessem e aquilo que lhes poderia pedir desde a regie. E o ensaio foi... um desastre. Acho que saímos todos de cabeça baixa, a tentar desvalorizar o que se tinha passado e dizendo uns aos outros que "não tinha sido assim tão mau". Mas foi. Não mau, mas péssimo! A comunicação entre a regie e o estúdio estava a ser uma desgraça, a comunicação entre a minha assistente de realização com os apresentadores também, a gestão das câmaras também estava longe de ser brilhante. Depois de nos porem fora do estúdio, as pessoas nucleares juntaram-se numa reunião que durou até às 20h de modo a prevenir algumas das coisas que tinham acontecido nessa tarde.
Posso dizer-vos, hoje, que a reunião deus os seus frutos e que, sem essa ela, as coisas tinham corrido muito mal. Mas isso não fez com que a memória daquele ensaio suavizasse.
QUINTA-FEIRA
Mais um ensaio e dia do programa
A minha quinta-feira não começou quando acordei de manhã, estremunhada pelo despertador. Começou mesmo à meia-noite, quando comecei a sentir náuseas depois de ter comido qualquer coisinha. Estava a trabalhar, a ler o guião dos apresentadores e a correlacionar com o meu alinhamento quando me comecei a sentir assim - era exponencial, à medida que os minutos passavam eu ia ficando pior. Achei que era o cansaço extremo, fui-me deitar.
Quando fechei os olhos senti-os estilo globo, em roda livre, girando livremente. Eu estava a enjoar mesmo de olhos fechados, sentia que tudo rodava à minha volta. Respirei fundo, deixei-me ficar até não aguentar mais. Tive de me levantar, com imensa dificuldade - mal me sentava (e, quando o fazia, estava provavelmente muito torta) e andar era só de lado. Só consegui parar na sanita e vomitar tudo o que tinha comido desde há umas horas atrás.
Sentia-me péssima; roguei pragas a tudo, estava preocupadíssima com o facto de durante o dia não fazer aquilo com que me tinha comprometido. Não me conseguia levantar do chão e continuei a vomitar até me sentir melhor. Consegui ir até à cozinha fazer um chá, mas piorei entretanto e, com um medo enorme de desmaiar, chamei a minha mãe para me ajudar. Quando ela me trouxe o chá, bebi quatro colheres e virei o barco outra vez. Com quatro colheres de chá no estômago. Importa dizer que eu sou daquelas pessoas que tem imensa dificuldade em vomitar, que faço tudo ao meu alcance para não o fazer. Ter aqueles impulsos terríveis do estômago e não ter nada para deitar cá para fora só me deixava mais cansada. Ia adormecendo na casa de banho, mas a minha mãe convenceu-me a ir para a cama. Deitei-me de lado (eu nunca, nunca durmo de lado) e com a cabeça alta e, passado algum tempo, consegui dormir. Acordei exatamente na mesma posição, com o corpo estilo gelatina e uma falta de força incrível. Fui comendo aos poucos, para testar o estômago. Não sei como cheguei à faculdade - suponho que estava lívida como um fantasma, sem forças para nada e com umas olheiras até ao chão. Estava com um medo terrível de sucumbir na hora H.
Felizmente, tudo melhorou ao longo da manhã. Tivemos tempo para mais um ensaio e, muito graças à reunião do dia anterior, tudo correu melhor. Na minha cara iam-se vendo as melhorias do panorama geral. Trazia rebuçados no bolso e uma termos com chá quente, bem doce, para me aguentar - e foi com isto que me alimentei nessa manhã.
O pessoal estava organizado - eu mandava na régie (cheguei a mandar calar subtilmente os meus professores), a minha assistente de realização mandava no estúdio. Atrás da regie, no green room (com cadeiras, sofás e comida - muita comida!) estavam todas as outras pessoas da equipa, com um nervoso pouco miudinho, a fazer muita força para que tudo corresse bem. Para além do streaming (que queríamos fazer no youtube mas que, por falta de equipamento, não conseguimos - mas ficamos a tentar, literalmente, até ao último segundo) estava tudo pronto. Ah, esperem, não tudo. A um minuto do programa começar... faltava-nos o primeiro convidado.
É claro que já tínhamos notado isto há meia hora atrás. Pânico total, pessoas que achavam que iam desmaiar. Começamos a preparar tudo para termos só dois convidados e fazer uma mudança no alinhamento. De frisar que os apresentadores não tinham teleponto nem auricular, por isso o contacto com eles era feito apenas através da minha assistente de realização. E era 12h. E o programa tinha de ir para o ar. E o primeiro convidado que devia estar em estúdio... nem sequer tinha chegado.
Temos filmagens da régie e as nossas caras eram de profunda tensão. Era o nosso primeiro programa, éramos (e somos) todos verdes nisto... e estávamos a mudar o alinhamento e a tomar decisões cruciais enquanto o programa decorria (e no tempo das reportagens, que era quando podia tirar os olhos das câmaras). Roguei pragas a tudo o que podia mas nunca perdi o foco - ainda hoje (porque não tive tempo) não sei aquilo que os convidados disseram; também não faço ideia do que se passou fora da régie nessa hora e nem sequer prestei atenção ao que se passava com os meus colegas. Era só eu e o ecrã. Só olhei umas duas vezes pela janela - uma delas foi quando me disseram que o convidado (que devia ter entrado em primeiro e acabou por entrar em último) tinha chegado. Só via pessoas a saltar e a festejar e... foi um alívio. Tudo mudou a partir daí.
Eu adorava tudo naquele programa. O design, o intervalo, os créditos, as reportagens... aquele genérico! Naquela altura não havia nada que me deixasse menos contente, que olhasse e pensasse "podia ter feito melhor" (se calhar, quando agora vir o programa na íntegra, já não vou achar o mesmo). Quando cheguei ao fim nem quis acreditar - por um lado feliz, com uma sensação de missão cumprida como nunca tinha sentido antes e, por outro, triste por perceber que tinha acabado. Saltamos de alegria, na régie e no estúdio. Houve abraços apertados, apertos de mão sentidos e muitos festejos. Todos ficamos felizes com o resultado final.
Em forma de comemoração, fizemos um lanche almoçarado, com direito a bolo feito pela minha tia e decorado por mim (que, diga-se, ficou lindinho e para lá de delicioso!) e muita comida que toda a gente trouxe de casa. Foi um bom convívio, óptimo para encher o meu estômago que estava demasiado vazio e reduzido a uma ervilha há horas demais. Seguiu-se a destruição do cenário, com as nossas 117 caixas a seguirem para uma instituição - acho que um bocadinho de nós morreu quando desfizemos aquilo que nos tinha dado tanto trabalho. Foi a plena sensação de fim... que tinha mesmo acabado.
À noite fomos (quase) todos jantar e descontrair e no dia seguinte estávamos tão lamechas que ninguém nos podia aturar. Quero partilhar isso aqui, mas num outro post, com o devido destaque. Foi um par de dias de uma alegria imensa, não cabia em mim de tão contente que estava. Quero deixar essa sensação registada aqui, para a vida, de forma a lembrar-me de que estas coisas e estes momentos inesperados acontecem mesmo. Ainda estou a ressacar de felicidade.
Para já, fiquem com o programa e deixem o vosso feedback!