Chávena de Letras - Penas de Pato, de Miguel Araújo
Gosto muito do Miguel Araújo. Aliás, sempre gostei, antes de saber que gostava - na altura em que era uma fangirl dos Azeitonas e já cantava as suas músicas de trás para a frente. Mas não sei até que ponto um bom letrista tem de ser um bom escritor. À partida crê-se que sim, que saberá manipular bem as palavras, articular ideias... Mas se escrever músicas fosse igual a escrever textos, quase todos nós o faríamos - e não é bem assim.
Mas com este livro prova-se bem que Miguel Araújo não é (só) bom letrista. É simplesmente (muito) bom com palavras, de uma forma geral. Para mim este conjunto de crónicas apresentam-se como uma forma de testes, de várias tentativas de diferentes estilos de escrita e de articulação de ideias. Ora mais Saramago, sem pontos finais e com vírgulas; ora mais Pessoa, com a sua veia mais poética; ora mais ao jeito de um investigador literado, quando se põe a dissertar sobre música; ora mais Miguel Araújo, no seu jeito particular de transmitir ideias. Coisas tão diferentes quanto boas, provando que ele é bom em muito mais do que um só estilo. E estes pequenos textos têm muitas vezes a peculiaridade de nos fazer pensar "mas isto é tão óbvio, como é que eu nunca pensei nisto?!".
E muito por culpa disso, a maior vantagem deste livro foi que à passagem de cada crónica voltava a mim a vontade de escrever. Lembrei-me que a razão deste livro existir (algum meio de comunicação social pedir a outra pessoa para escrever textos todas as semanas, sobre um tema à escolha) é também uma das razões que me alimenta o sonho de escrever; o sonho de que um dia me paguem para fazer aquilo que para mim não é trabalho.
Um livro leve, para ler de fio a pavio e que nos põe a pensar nas coisas simples da vida.