Blogs do Ano: vamos lá pôr a boca no trombone
Confesso que esperei ansiosamente pelas nomeações dos blogs do ano. E porquê, perguntais vós? Para me rir um bocadinho! Porque, avaliando pela edição do ano passado, quase punha o mindinho no fogo apostando que nesta edição ia virar o disco e tocar o mesmo. E não é que não me enganei?! O "best of" da blogosfera está todo lá... pena é esse mesmo "best of" não ter modificado de um ano para o outro. Pelo meio há ainda umas boas pérolas, quase para disfarçar que este é um concurso decente. Ora vejamos.
Precisamos primeiro de esmiuçar o conceito de blog. Um blog é uma página de facebook? Um blog é um sítio virtual com um domínio próprio - e bem estabelecido, que nunca teve como sufixo "sapo" ou "blogspot" à partida - e com não sei quantas pessoas envolvidas por detrás, incluindo programadores e gestores de conteúdo para fazer a coisa acontecer? O conceito é de facto abrangente mas, para mim, um blog é (era?) um sinónimo de autenticidade - um espaço para quem não tem espaço na opinião pública mas que, ainda assim, se quer fazer ouvir ou mostrar algo sobre assuntos do seu interesse. Para mim é impensável que alguém que não o próprio dono do blog lá escreva ou o gira; para mim, um blog é algo com uma estrutura relativamente simples, sem grandes floreados e ramificações, porque - lá está - parte de alguém sem grandes condições para fazer tudo isso e que só quer carimbar o seu nome em algo. A meu ver, há diferenças entre um blog e um site - um sendo muito mais complexo que o anterior. E nem vale a pena mencionar o facebook - acho que já sabem o que eu acho.
É por isso necessário perguntarmo-nos o quê que a Bumba na Fofinha está a fazer na categoria de "Entretenimento" quando, na verdade, ela não tem um blog: tem uma página no facebook, onde publica vídeos - bem engraçados, mas isso já não é para aqui chamado - que por acaso também estão no YouTube. (Engraçado, ia jurar que há uma categoria precisamente sobre vídeos de entretenimento... mas devo ter visto mal).
Depois chamam-se ao caso todos os "blogs" de figuras públicas. Cláudio Ramos, Júlia Pinheiro (a sério que o "Júlia" é o um blog? ah ah ah), Ana Rita Clara, Leonor Poeiras, Pedro Teixeira, Raquel Strada ou Jéssica Athayde são alguns dos nomes que me surgem. Penso que já aqui escrevi sobre esta questão, sobre a necessidade de todas as figuras públicas agora terem um espaço e chamarem-lhe de "blog" e como acho isso ridículo - e estou pacientemente à espera que tal passe de moda. Isto para mim não são blogs por várias razões, muitas das quais já enumerei acima: primeiro porque são assinados por alguém que já tem exposição e espaço na opinião pública; segundo porque são raros (existentes?) aqueles que são genuínos, totalmente geridos pelos supostos autores; terceiro porque já têm todo um trabalho de agência envolvido, tanto na parte de produção de conteúdos, como de gestão de redes sociais, que têm só um propósito: vender, fazer publicidade e parcerias. A parte do "genuíno" e da "partilha de ideias" é posta num saco e mandada ao fundo do rio com pedregulhos bem grandes. Quase tudo o que fazem é vender-nos coisas: se não são produtos, são muitas vezes estilos de vida que não podemos alcançar. Ou seja: há toda uma máquina por detrás de todos estes "blogs" que, para mim, lhes tira logo esse estatuto. E ainda podemos ir mais longe: muitos destes sites são "apadrinhados" pela TVI - entidade que, coincidentemente, promove o concurso...
Depois há um par de questões que me apoquentam. A primeira chama-se "Nêspera no cu". Até gosto do conteúdo, mas primeiro o facto de estar inserido na categoria "Vlog Entretenimento" (ah, afinal sempre existe!) irrita-me um bocadinho, tendo em conta que aquilo não é bem um vlog - é só um podcast com umas figurinhas dos intervenientes a mexerem a boca de forma muito pouco natural. Para além disso, tendo em conta que o concurso é anual, parece-me lógico que se nomeiem (e premeiem) canais/blogs que estiveram ativos nesse mesmo período - o que não é o caso da Nêspera. Dei-me ao trabalho de ir ver e o último vídeo publicado neste canal foi no dia 25 de Maio do ano passado. Ou seja, temo que exista aqui um erro e os senhores do júri se tenham confundido um pouco, trazendo do ano passado um candidato esquecido. Uma chatice. A segunda questão também se insere no capítulo "porquê que este site está nesta categoria?", onde temos a La Dolce Rita - uma das minhas favoritas, toda a gente sabe - que está incluída nos "Vlogs de Lifestyle". Ora bem, se for um "lifestyle" para pessoas como eu, lontras, que gostam é de comer, de fazer bolos e aprender sobre como fazer doçaria conventual... até concordo. Fora isso, acho só um bocadinho descabido. Mas enfim, eu percebo: não há dinheiro para tudo, e não se pode criar uma categoria para culinária, porque o troféu ainda fica caro e a vida está difícil.
Mas enfim, isto tudo são "pormenores", que apenas distraem da questão global de tudo isto. Para mim, era lógico e expectável que os concorrentes iriam ser em todo semelhantes aos do ano passado. Porquê? Porque estamos em Portugal, uma país pequeno, onde não emergem propriamente blogs populares todas as semanas. Aqueles que eram líderes o ano passado, continuam a sê-lo agora. E por isso, a continuar neste formato, os mesmos blogs e as mesmas pessoas vão continuar a arrumar troféus nas suas prateleiras - ainda por cima quando o voto final é feito pelo público, o que vai fazer com que os mais lidos sejam também os mais votados. A continuar assim, mais vale fazerem o concurso de cinco em cinco anos, na esperança de que algo mude no panorama da blogosfera nacional.
Eu sei que a maioria das pessoas acha que existe uma correlação entre o sucesso de um blog e a sua qualidade - ou seja, se um blog é bem sucedido é porque é bom naquilo que faz. Mas eu não concordo, ainda para mais com a quantidade de sites de figuras públicas aqui envolvidos, com autênticas máquinas de publicidade por detrás deles. Aliás, desconfio até que a maioria das coisas lá escritas tenham sequer um dedo dos supostos envolvidos, mas enfim, essa é toda uma outra luta. Hoje em dia, o sucesso de um blog depende muito da gestão das redes sociais, da publicidade, do passa a palavra - e pouco da informação que realmente lá é veiculada. Mas neste sentido, o que eu acho que era bom - eventualmente até se mantendo este formato de "líderes dos blogs" (porque é isso que este concurso é) - era mostrar ao mundo blogs mais pequenos, com muito menos exposição, muito menos contaminação por marcas/publicidade/mentiras, muito mais genuínos e reais (e não, não estou a puxar a brasa à minha sardinha, porque não quero nem preciso de ter milhares de pessoas a lerem-me, a criticarem-me e a mandarem-me postas de pescada de cada vez que troco um "a" por um "o"). Mas enfim, como isso não vende, arruma-se a ideia para debaixo do tapete e organiza-se, ao invés, uma gala de arromba com pseudo-figuras-públicas - algo que dá pano para mangas nas revistas, sites e redes sociais, rendendo mais cliques, dando mais dinheiro de publicidade e, no fim de toda esta cadeia, enchendo os cofres de alguém. Nada a que já não estejamos habituados, portanto.
Como nota final, resta-me contar-vos que a minha mãe me perguntou porquê que não me inscrevi neste concurso. A resposta é simples e divida em três partes: a primeira é porque não tenho exposição mediática para ganhar o que quer que seja deste género. A segunda é porque escrevo posts destes, porque ponho a boca no trombone, porque digo as verdades que ninguém quer dizer e isso não é propriamente bem-vindo nestes meios. E a terceira é porque eu, de facto, tenho um blog: genuíno, pobrezinho às vezes, nem sempre com conteúdo e muito menos com conteúdo interessante - e, claramente, não é de blogs que trata este concurso.