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Entre Parêntesis

Tudo o que não digo em voz alta e mais umas tantas coisas.

09
Mar23

Chávena de Letras: "Spare"

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Sigo há muitos anos a família real inglesa e, como tal, a fã british que vive dentro de mim não me permitiria passar sem ler este livro. 

Diria que a obra pode ser descrita, rapidamente, em quatro partes: 1) os primeiros 20% são dedicados à infância e adolescência de Harry, obviamente marcados pela morte da mãe, em que se fala da turbulência na escola, a(s) dor(es) na sua relação com o irmão e das indecisões do futuro; 2) os seguintes 30% relatam acima de tudo a sua história militar, as suas idas ao Afeganistão e aventuras por lá vividas; 3) os 20% posteriores incidem no seu retorno e ao reinicio de uma vida dedicada à realeza, sem guerras à mistura (pelo menos daquelas que envolvem armas, porque na família existem-nas em quantidade mais que suficiente), que o voltaram a deixar num limbo, sem saber onde pertencia e como se posicionar interna e publicamente; 4) o que resta é a história que temos mais viva nas nossas memórias - o início do namoro com Meghan, o casamento, os filhos e todo o drama já conhecido com a imprensa.

Há âncoras que estão presentes em todo o livro (e, suponho, na vida dele): primeiro, a mãe - um trauma claramente mal resolvido, que o acompanhará para a vida, e que eu creio que dita muitos dos comportamentos de proteção que teve em relação à mulher; segundo, África - um elo comum em todas as fases acima mencionadas, sempre como um amuleto de escape e clarividência, fazendo depois também a ponte com ações solidárias e visitas com amigos; e terceiro, não menos importante, a imprensa - os vilões da vida dele, ainda antes da morte de Diana, mas principalmente depois do acidente que a vitimou.

Apesar de gostar muito de família reais, e em particular da britânica, nunca achei que a vida deles fosse de sonho; lá por serem príncipes e princesas não quer dizer que vivam como nos contos da Disney. E este livro torna isso bem claro: eles vivem numa gaiola dourada. E das duas uma: ou se opta por olhar simplesmente para o ouro, ou mantemo-nos concentrados no facto de estarmos dentro de uma gaiola, independentemente do seu material. Escolhendo a primeira, segue-se a linhagem; optando pela segunda, encontra-se a nova ovelha ronhosa - e ao Harry assenta-lhe este papel que nem uma luva.

Creio que este livro pode ser lido de várias perspetivas, dependendo do espectro onde nos posicionamos em relação à história do Harry, do "Megxit" e a tudo o que foi veiculado na imprensa. Eu sempre achei que a saída deles tinha sido feita de forma bruta e injusta, mas que era uma decisão ponderada por parte do casal, que se viu encostado contra a parede e completamente espremido pelos tabloides. E eu interpreto a escrita deste livro como o último reduto: ao sentir que não tinha nada a perder, Harry deitou ao mundo a sua verdade, sabendo que os outros intervenientes (nomeadamente a sua família) nada iriam contrapor, pois é esse o seu mote e forma de estar. Com tanta mentira espalhada e impressa em tanta página, percebo que a vontade maior seja dar um grito de libertação - mesmo que ninguém o ouça. 

Neste caso, ouvem alguns - mas acho que poucos o farão da forma que Harry desejaria. Primeiro porque os consumidores de tabloides - sendo que muitos só passam os olhos pelas letras grandes - não vão perder o seu tempo a ler um livro longo como este; segundo porque quem o lê para difundir notícias escolhe a dedo aquilo que quer apresentar aos leitores - e eu tenho a certeza que o objetivo máximo de Harry não era que só se falasse do facto de ele ter queimado o escroto ou que o irmão o tivesse atirado ao chão; terceiro porque é difícil mudar opiniões moldadas durante anos apenas com um par de intervenções (a série e o livro) estratégicas. Ainda assim, é uma oportunidade única para a "plebe" perceber a dinâmica de uma família real, com tudo aquilo que ela tem de bom e de mau; para se entender como é um negócio, como está moldada para gerar espalhafato e gerir expectativas. Mas é, acima de tudo, uma tentativa, uma redenção - e acho que justa, tendo em conta tudo aquilo por que o príncipe passou. Não sei se, de facto, o Harry não tem nada a perder aqui - creio que as ligações familiares devem ter ficado muito fragilizadas depois disto, não só por ele contar episódios chave que mancham amplamente a imagem do pai e do irmão (principalmente) mas por todo o sentimento de não pertença que ele descreve (e que se sente) ao longo do livro, que acaba por ser ainda mais grave que os acontecimentos algo isolados que foram acontecendo entre os três ao longo das suas vidas.

Sobre o livro em si: não li muitas biografias /memoirs e, como tal, não tenho grande termo de comparação. Adorei o prólogo e a ideia de que o livro foi tudo aquilo que ele não teve oportunidade de contar, explicar e fazer ver ao pai e ao irmão - foi um pontapé de saída ótimo, mas que esmoreceu logo no inicio do relato militar da sua história. A segunda e terceira partes são mais lentas, explicativas e, em alguns casos, algo chatas - salvam-se por terem capítulos curtos, que fazem as páginas virar mais depressa. No início do romance com a Meghan parece que o livro ganha outra vida - e daí até ao fim, ainda que com muitas partes tensas, lê-se tudo rapidamente. Ainda assim... é um livro triste - escrito por alguém perdido, onde se lava demasiada roupa suja (embora eu perceba o porquê de ele se ver nesse direito).

Apesar de todas as asneiras que possa ter feito, de algumas más decisões que tenha tomado, acho que será sempre alguém com a qual eu tenho muita empatia. Desculpem, Charles e William... deste lado escreve-vos alguém Team Harry.

22
Fev23

Chávena de Letras: "I'm Glad My Mom Died"

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Este é um livro necessário. Na verdade, só o prólogo diz tudo aquilo que muitos precisamos de saber - embora o que está para trás seja igualmente valioso.

Aquilo que Jannette McCurdy evidencia é algo que, no fundo, todos sabemos - mas é uma verdade pouco proliferada (e até pensada): o papel de mãe é o mais romantizado da história. As mães são sempre heroínas, são sempre boas, sempre bem-intencionadas, são sempre incríveis... Só que não. Porque há más mães. Há mães que vendem os filhos; há mães que os matam. E há mães que maltratam, mesmo quando parece que não o fazem - que era o caso da mãe de Jannete.

Na narrativa desta história percebemos que tudo aquilo pelo qual a autora passou foi feito sob a ideia de que era para o seu bem: as invasões ao ser corpo eram para garantir que não tinha nódulos, a obrigação de trabalhar era para ter uma boa vida e ser feliz, ter de ser magra e pequenina tinha como propósito garantir papéis por muito mais tempo. Tudo para o seu bem. Mas será mesmo o "seu" bem? Ou o bem da sua mãe - ou, simplesmente, para bel-prazer da sua progenitora?

Este foi o primeiro audiolivro que ouvi e gostei muito da experiência. A linguagem utilizada é acessível para quem estiver familiarizado com o inglês (não é preciso ser especialista) e a forma de falar de McCurdy (sendo que o livro é narrado por ela) ainda nos envolve mais na narrativa, uma vez que ela imita as vozes e os sotaques das personagens de quem fala. Esta é a sua história de vida, desde o momento em que começou a fazer castings (passando pelos anos em que fez um programa de sucesso no Nickelodeon) até à altura em que a mãe morreu, quando já tinha enveredado por caminhos mais tortuosos como o alcoolismo e anorexia (entre outros); é a forma de como lidou com tudo o que vivenciou e da forma que arranjou para, depois, conseguir gerir tudo isso.

Apesar de ter adorado o mote do livro e a conclusão a que chega, há dois apontamentos curiosos que quero fazer: 1) não conhecia o trabalho (nem a imagem) da autora, mas por alguma razão não consegui simpatizar com ela - muito embora tenha uma enorme empatia pelo que passou; isto faz com que o livro tenha ainda mais valor para mim - porque o adorei apesar do que senti em relação a quem o escreveu; 2) não acho que o título do livro faça jus à história. Acho que foi escolhido por ser "chocante" e para atrair leitores, mas em nenhuma parte da história ela se mostra feliz pela morte da mãe - é tudo muito mais profundo que isso, e essa complexidade está bem espelhada em todas as páginas do livro. Tudo é pouco linear, tudo é de difícil leitura e análise, escondido por detrás de dogmas, boas intenções e tantas outras ideias pré-concebidas da maternidade - e por isso seria muito difícil resumir tudo num sentimento tão "simples".

Aconselho muito - e em particular o audiobook.

 

(este livro acabou de ser editado pela Lua de Papel, em português, sob o nome "Ainda Bem Que a Minha Mãe Morreu")

18
Jan23

Chávena de Letras: "Os Sete Maridos de Evelyn Hugo"

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Gostei deste livro, mas não o amei. Faltou "aquele bocadinho assim" - mas confesso que não sei qual é a falha, pois tinha tudo para dar certo.

Esta foi a primeira obra que li da Taylor Jenkins Reid e não será certamente o última: a autora tem uma escrita fácil mas com peso em algumas passagens - uma gestão que a maioria dos autores não consegue fazer -, que nos conseguem marcar e dar um tom mais sério (e realista) ao livro. A personagem principal está lindamente construída: complexa, simultaneamente crua e polida, dura e real. Não sei se é fácil identificarmo-nos com ela (não é sempre uma personagem simpática), mas acredito que muitos gostassemos de ser como ela - quanto mais não seja pelas ganas que tem de viver a vida como sempre a quis.

A forma que a autora arranjou para nos levar até ao final do livro é subtil, muito inteligente e, mais uma vez, gerida na perfeição: no fundo, estamos todos ali a virar páginas porque queremos conhecer a história dos maridos da Evelyn ou porque queremos saber o porquê de ser a Monique a "escolhida"? É uma premissa que vai pairando ao longo de todo o livro mas que não é o alvo direto da história... E isso só torna tudo mais intrigante.
Apesar de se tratar praticamente de uma narrativa de personagem, que são normalmente obras mais lentas, este é um livro que se lê muito bem e rapidamente.

Ponto negativo para a tradução: não tenho a comparação em inglês, mas há falhas notórias - já para não falar de muitas gralhas ao longo do livro. 

P.S.: Foi a minha primeira leitura no Kobo! Whooo!

Por fim, uma análise rápida que resume toda a história (para quem não gostar do mínimo levantar de véu, não leia esta parte): quão irónico é que, no meio de sete maridos, nenhum deles seja o amor da vida dela? E quantas Evelyn's andarão por aí com o mesmo drama? E quantas estrelas de Hollywood, com aquelas vidas e romances recambolescos, não entrarão neste tipo de esquemas para salvaguardar o seu verdadeiro eu? Este livro deixou-me a divagar sobre o assunto.

04
Jan23

Chávena de Letras: "Sete dias em Junho"

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Gostei muito, muito deste livro! É incrível como pode ser refrescante na literatura atual a ideia de que podemos ser nós próprios os inimigos da nossa felicidade. Que não é preciso entrarem outros na equação - amantes, vilões ou uma sociedade opressora - pois somos nós próprios que nos impedimos de avançar. E quão real é isso? Quantas vezes não somos nós - nós e os nossos demónios, os nossos medos, as nossas expectativas, o nosso contexto - a pôr um travão em algo que, provavelmente, nos faria feliz?

Esta é a história de Eva e de Shane, o caminho que tiveram de percorrer para derrubar os seus obstáculos e - talvez mais desafiante e um passo muito desprezado no processo - perceber depois onde os arrumar de forma a que, mesmo derrotados, estes não os impeçam de continuar o seu caminho.

Que bonita, esta obra de Tia Williams (e, já agora, que boa a capa da Topseller)!

15
Nov22

Chávena de Letras - "Pequenas Grandes Mentiras"

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Todas somos, de alguma (e diferente) forma, a Jane, a Madeline ou Celeste. "Pequenas Grandes Mentiras" é, na verdade, um bom exemplo da vida real: todos mentimos em algum momento (provavelmente sobre um ou outro acontecimento do nosso passado - nem que seja com um simples "está tudo bem") e todos gostamos de manter as aparências para o exterior. O problema é quando essas mentiras se tornam no centro da nossa vida; quando se transformam nos nossos alicerces e construímos um castelo em cima de vigas de areia. E todas as personagens deste livro têm telhados de vidro no que às mentiras diz respeito - como todos temos, na vida real.

Decidi ler Liane Moriarty depois de ter ouvido rasgados elogios à sua narrativa no podcast "Vale a Pena", da Mariana Alvim. Não foi este o livro mais visado da autora nos vários comentários feitos por alguns convidados, mas pareceu-me um bom ponto de partida, por ter sido uma obra bastante badalada devido à sua adaptação a série. E a verdade é que não desapontou: a capacidade de nos envolver no enredo, a dúvida constante e a empatia com as personagens não falha - e é o mix perfeito para nos agarrar ao livro, do princípio ao fim. Moriarty não se fica pela clássica dúvida de "quem será o assassino". Aqui, nem sequer sabemos o assassinado, deixando-nos numa ânsia louca para folhear as páginas finais do livro!

A forma como a obra está escrita e construída, sem libertar spoilers a não ser na altura pretendida, é muito boa; a ideia dos depoimentos no final de cada capítulo aguça ainda mais o apetite e engana em vez de ajudar a resolver o mistério - o que ainda torna tudo mais intrigante. Esta era a característica mais mencionada sobre a autora, no podcast: no final, o plot twist é sempre inesperado, por muito bem que já conheçamos a escrita de Moriarty. Eu não sou o estilo de leitora que se agarra a um livro até saber o desfecho nem ocupo a mente em tentar deslindar mistérios, mas gostei muito desta fórmula, que só vem confirmar tudo aquilo que ouvi sobre a autora nos últimos tempos. Como tal, não creio que esta seja a minha última leitura da escritora australiana.

Única nota negativa a apontar: achei a desconstrução da narrativa, no final, muito repentina. Passamos 400 páginas a aprender sobre a dinâmica de Pirwee e de quem a habita, desvendando segredos aos pouquinhos, mas plantando muito mais dúvidas à medida que vamos folheando - e, do nada, descobrimos tudo rapidamente. Muitas das maiores revelações são feitas até de forma "seca", rápida e crua, qual penso rápido. Parece que a autora estava em ânsias para escrever o livro, depois de todo o cuidado e suspense que teve até aquele ponto. Há uma parte de nós que fica feliz, pois satisfaz-nos a curiosidade mórbida de saber o morto e o assassino - mas não diria que a narrativa sai a ganhar.

06
Out22

Chávena de Letras: os dois primeiros livros da série Bridgerton

As duas próximas reviews podem ter spoilers. Os livros foram lidos depois de ter visto a série.

 

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É difícil fazer a análise de um livro quando já temos na nossa posse todos os detalhes da história e conhecemos as personagens. E foi isso que me fez chegar a duas conclusões invulgares, que até podem parecer contraditórias:

1) A série é muito melhor que o livro.

2) O livro é bom (para o estilo) e difícil de "deslargar".

Aquilo que a série fez com o universo Bridgerton é só incrível; é um trabalho digno de aplauso, tendo em conta esta base de partida que, por comparação, é muito mais fraca e superficial. A série abre o espectro deste mundo criado por Julia Quinn, enquanto que o livro é extremamente focado no casal Daphne-Simon. O mais provável é que a série já tenha ido buscar detalhes dos livros futuros, de forma a construir personagens mais complexas e um universo coerente, que se adeque aquilo que vai acontecer a seguir; mas a verdade é que para além desse afunilamento da narrativa que existe no livro, na obra escrita nada mais nos puxa para além do romance. Por outro lado, a série cria todo um mistério à volta da Lady Whisteldown (que é pouco mencionada neste primeiro livro, excluindo as citações no início de cada capítulo), dá vida e conteúdo às personagens em redor dos protagonistas (Eloise, a Bridgerton com mais personalidade na série, não é mencionada no livro, por exemplo; a rainha não existe; mesmo o papel preponderante da Lady Danburry é muito desvanecido), já para não falar de todos os cenários incríveis e a música que a série apresenta.

A verdade é que, pelo menos lido à posteriori, este livro perde por comparação à série - se esta não existisse, eu provavelmente contentava-me com o que tinha lido e nem sequer questionava. Mas aqui entram de novo os contrassensos: será que eu compraria o livro se a série não existisse e se a capa não tivesse a cara das personagens? Definitivamente não. Este é o tipo de obra que faz check em todos os preconceitos de "chick lit" - desde a capa cor de rosa, passando pelo ar apaixonado da menina com as florzinhas no cabelo, culminando com cenas mais quentes que fazem as delícias de qualquer leitora ávida deste estilo de leitura.

Apesar de tudo isto, é muito provável que leia o segundo (e o terceiro, e quarto, sei lá!) - e esta é talvez esta a maior qualidade da escrita de Julia Quinn: deixar-nos presos, tanto enquanto lemos como quando pousamos o livro. Tem uma escrita fácil, fluída, empolgante. E nesta fase em que me encontro, com hábitos de leitura ainda instáveis, esta é a qualidade que mais aprecio e que mais me importa em qualquer obra que leia - mesmo que seja chick lit da mais pura.

 

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Mais uma vez, li o livro depois de ter visto a série. E, de novo, tiro o chapéu à série, por ter sido capaz de ver para além da escrita de Julia Quinn, do enredo demasiado focado só nos protagonistas e por ter conseguido diversificar o interesse noutras personagens, não desprezando ainda assim o desejo ardente entre os dois protagonistas. Tudo aquilo que enalteci na review do primeiro livro, poderia reescrever aqui.

A história central, desta vez, foge mais ao original, comparativamente ao primeiro; tudo o que a série modifica só vem acrescentar valor, por isso não me choca - como é o caso do enlace com Edwina, que no livro nunca chega a acontecer e o arrastar do envolvimento mais sério entre Kate e Anthony, que no livro é um tanto ao quanto repentino e na série demora mais a desenvolver-se. Lady Whistledown continua nas sombras, tendo um pequeno destaque nas páginas finais do livro, o que leva a crer que a cortina se vai abrir nos capítulos seguintes.

O próximo livro será o primeiro que lerei sem ter a série como base de comparação - e confesso-me muito curiosa, por só aí poderei fazer uma crítica mais ponderada, sem cair na tentação de comparar a escrita com a criação televisiva. De qualquer das formas, acho que gostei mais do primeiro livro de Queen e algo me diz que isto vai em decrescendo... Esperemos que esteja errada. O tempo o dirá - o terceiro livro da saga já está na estante à espera de ser lido.

22
Set22

Chávena de Letras: "Balada para Sophie"

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Foram precisos 27 anos para ler uma banda desenhada. E a verdade é que valeu a espera. Que livro! Que beleza. É poesia em forma de desenho, é música em versão papel.

Gostei muito da experiência de ler banda desenhada: na verdade achei uma óptima escolha para alguém que está a tentar restabelecer hábitos de leitura, uma vez que a história decorre rápido, sem grandes descrições e com base em diálogos, fazendo-nos avançar as páginas com vontade e sem demoras. Aprendi que não são precisas muitas palavras para descrever estados de espírito - nem sequer desenhos muito detalhados. A cor de fundo das páginas, o tamanho das letras, a profundidade das personagens... Incrível como tantas pequenas coisas - que nunca ninguém nos ensinou mas que interpretamos naturalmente - nos transmitem, às vezes, o essencial de uma história. E que bonita é está história, que bonita é esta balada (não só para Sophie, mas para todos).

11
Jan22

Os escolhidos do ano de 2021

A escrita é assim: tem vida própria, leva-nos para onde quer. Esta lista que hoje aqui trago nasceu para um post que ganhou outra vida, aquele que acabou por ser o resumo do meu ano. Aquilo que escrevi era para ser só uma breve introdução e, quando dei conta, já era todo um texto com princípio, meio e fim, já demasiado profundo, não abrindo espaço para listas ou coisas um bocadinho mais supérfluas. Deixei que seguisse o seu caminho independente e fiquei com esta lista das minhas escolhas do ano para outra altura. E aqui está ele!

Não vou matar dois coelhos de uma só cajadada: vão ser muitos! A maioria dos temas ou nomes que aqui trago estavam à espera de um texto (mais propriamente uma "review da semana") há demasiado tempo, por isso vou fazer uma pequenina descrição de tudo aquilo que gostei no ano que findou, fazendo ao mesmo tempo uma "mixórdia de temáticas" de coisas muito boas.

 

Produto do ano

- Pão da Granélia -

Estive muito, muito, muito indecisa entre dois produtos - vou prometer a mim mesma que escrevo sobre o outro - mas tenho de escolher aquele que mais chama o meu coração: o pão da Granélia.

A Granélia é uma mercearia que abriu no centro do Maia há relativamente pouco tempo, que tem a sua ideia base na venda a granel (podem comprar hidratos e leguminosas como arroz e feijão ou especiarias como caril ou matcha, levando apenas um frasquinho) mas que está recheada de outras coisas boas: produtos biológicos, locais e de boa qualidade assim como outras soluções ecológicas para produtos de limpeza, higiene corporal entre outras coisas. Mas a melhor de todas é mesmo o pão de fermentação natural. Não é produzido lá - é comprado no Pão da Terra (que fica em Matosinhos mas é fora de mão para mim) - mas revendido nesta mercearia, e é só a melhor coisa do mundo. Eu adoro pão - e já tinha escrito aqui (texto sobre um pão igualmente bom, mas não TÃO bom) que o melhor pão do mundo era o sourdough que o meu irmão me trazia de Inglaterra quando vinha cá passar férias. Pois que este é o sourdough. O tal! O maravilhoso! Mas em Portugal, e aqui tão pertinho, ao virar da esquina. Como resistir?!

Os pães estão disponíveis à quarta e à sexta-feira em várias modalidades, mas têm de ser encomendados com antecedência. Eu vou lá de duas em duas semanas buscar o meu - tenho de me conter para não comer meio quilo de pão logo no primeiro dia, por isso congelo-o para não me tentar e vou descongelando ao longo dos dias quando tomo o pequeno almoço. Foi a descoberta do ano!

 

Podcast do ano

- Conta-me Tudo -

2021 foi o ano dos podcasts. De manhã, antes de sair de casa, faço sempre uma arrumação geral para que ao fim da tarde o peso das tarefas domésticas não seja tão grande e tenhamos, eu e o Miguel, algum tempo de qualidade juntos. Mas arrumar ou limpar em silêncio é um tédio. E eu já ouço muita música enquanto trabalho... por isso virei-me para os podcasts, que cumprem uma função mais extensiva que a música: dá para rir, chorar e informar, mas tem sempre como base o entretenimento.

Este hábito começou com o conselho do meu ex-chefe para ouvir o Extremamente Desagradável, da Joana Marques. Na "review de 2021" o Spotify diz que este é o meu podcast favorito (porque ouvi não sei quantos episódios de rajada até ficar em dia), mas não é verdade. Não que não goste (senão não ouvia), mas porque acho que os humoristas têm uma tarefa inglória ao tentarem ter piada todos os dias. É verdade que é um estilo de humor diferente, mas não deixa de ser um bocadinho desgastante - para ela e para nós.

Aquele que eu mais gostei foi o Conta-me Tudo, do David Cristina. Não só pela diversidade de histórias, de temas mas, acima de tudo, pelo leque de emoções que nos faz sentir; para além disso é curto e ideal para ouvir enquanto me arranjo ou faço as lides domésticas - entre fazer a cama, esticar o cabelo e pôr a comida a descongelar, um episódio fica ouvido.

Ouvi também alguns episódios do Reset, da Bumba na Fofinha, vários d'O Avesso da Canção, da Luísa Sobral (aconselho muito o episódio do Miguel Araújo e o do Pedro Abrunhosa) e também do E Projetos Para o Futuro, do Nuno Markl em parceria com a Delta (curtinhos e perfeitos para quando o tempo e a paciência não abundam). Quando não havia mais para ouvir, entretinha-me com A Noite da Má Língua - e enquanto me ria com as opiniões parvas de uns e uns tiros certeiros de outros, ficava a par das notícias do dia-a-dia, em vez de pensar só em fait divers.

Neste momento estou à procura de novos podcasts para me entreter, por isso se tiverem sugestões, chutem!

 

Série do Ano

- Sex Education -

Sei que não é a escolha mais óbvia, por isso carece de contexto. Sempre gostei muito da ideia original do Sex Education mas fiquei muitíssimo desiludida com a segunda temporada - de tal maneira que não a vi até ao fim. Achei que desvirtuaram a linha de ação (e personalidade) de algumas personagens e até o enredo me estava a irritar. Dei uma segunda oportunidade e vi a terceira temporada, lançada em 2021, e voltei a ficar agarrada e fã. 

É claro que o fim da Casa de Papel é digno de menção, mas ao contrário da Sex Education não acho que as últimas temporadas tenham dado a volta ao texto e melhorado - como já tinha escrito aqui, a série devia ter parado no primeiro assalto e fechado com chave de ouro. Squid Game leva o prémio de série mais viciante, mas é demasiado dark para o meu gosto pessoal. Por fim, mencionar as Doce - a série em português que mais gostei no ano passado. Espero que existam mais, com a mesma qualidade, neste 2022.

 

Documentário do ano

- Three Identical Strangers -

Three Identical Strangers é um documentário sobre o (re)encontro de irmãos trigémeos, separados à nascença, que aconteceu por mero acaso. É sobre a forma caricata como se encontraram uns aos outros, mas vai muito mais a fundo: porque é que eles foram separados? Será que tinham semelhanças apesar de terem vivido mais de duas décadas sem se conhecerem? E como é que o reencontro os afetou? As respostas são pouco óbvias e muito mais obscuras do que aquilo que se pensaria.

Não sei porque é que me marcou tanto - se pela história engraçada, se pelo twist que acabou por ter -, mas a verdade é que falo dele com regularidade e por isso penso ser justo dar-lhe este "prémio". O documentário estava na Netflix mas penso que entretanto saiu. 

 

Música do ano

- You Get What You Give, dos New Radicals - 

O Spotify dita que a música do meu ano é a Spring 1, uma revitalização do clássico de Vivaldi pelo Max Richter - mais uma vez porque a ouvi vezes sem fim, principalmente enquanto escrevia ou precisava de me sentir inspirada. Mas vou de novo desdizer a plataforma de streaming: apesar de adorar a Spring 1, não considero que tenha sido a música do meu ano.

Por alguma razão que desconheço, a You Get What You Give, dos New Radicals, é a música que eu associo ao meu casamento - e o facto de eu ter contraído matrimónio foi, sem dúvida, o evento central do meu ano (ou pelo menos da primeira metade). Por isso, e embora seja um bocadinho estranho escolher uma música de 1998 como a minha música de 2021, é o que vai acontecer.

Podendo dividir a coisa em dois semestres, a Adele marca sem dúvida a segunda parte do ano, com o seu novo álbum. A minha música preferida é a "I Drink Wine", mas aquela que descreve melhor 2021 é a "Hold On". Destaque extra para a lusofonia, com a minha música preferida do ano em português: Onde Vais, da Bárbara Bandeira e Carminho.

 

 

Livro do ano

- Almoço de Domingo, de José Luís Peixoto - 

Não é difícil escolher o livro do ano porque só li... dois. Eu sei, é vergonhoso. Ao menos um deles foi óptimo!

Gostei mesmo de ler este "Almoço de Domingo" - desde a estória até à construção peculiar da narrativa (algo a que os leitores de José Luís Peixoto já devem estar habituados, mas eu não). Há livros deste autor que, devido à estrutura e estilo de escrita peculiares, não me convencem. Abri uma exceção para este e ainda bem. Fiquei inspirada pela história de vida e pela força de Rui Nabeiro, de quem não sabia muito, mas de quem me senti muito mais próxima quando acabei de ler a última página.

 

"Quando acumulamos suficiente tempo, os domingos transformam-se num período de vida. Recordamos os domingos como uma unidade, anos inteiros só de domingos, estações inteiras compostas apenas por domingos: os domingos de verão, os domingos de outono, todos os domingo de inverno e, de novo, as promessas feitas pelos domingos de primavera. Foram dias separados por semanas, antecedidos por sábados com ilusões próprias, sucedidos por segundas-feiras com agendas precisas, tarefas fatais que exigiam ser feitas, mas tudo se dissipa até ficar apenas uma amálgama de domingos. Ao serem vividos, transformaram-se nessa amálgama, como um almoço de domingo infinito, a crescer permanentemente a partir do seu interior."

 

 

Programa de TV do ano

- Trafficked by Mariana van Zeller -

Sou completamente viciada nesta série que estreou o ano passado no National Geographic. A campanha promocional foi grande mas eu só me interessei mesmo pelo programa quando percebi que a jornalista era portuguesa, quando ouvi parte da entrevista que a Mariana deu ao Era O Que Faltava, da Rádio Comercial. E que jornalista! Que "tomates"!

A Mariana van Zeller mete-se no meio de gangs, de bunkers cheios de armas, de florestas recheadas de narcotraficantes e em mundos que só ouvimos falar nos filmes ou nas otícias, naquele que parece ser um mundo e uma realidade muito distantes. São normalmente 45 minutos de programa que devem exigir horas e horas e horas de pesquisa e de tentativas falhadas para ter alguém que dê a cara (ou pelo menos a voz) por todas as coisas ilegais de que já ouvimos falar mas com as quais nunca tivemos proximidade. 

A segunda temporada está agora a passar no National Geographic aos sábados, às 22h30. A primeira, para mim, ainda é melhor. Vale muito, muito, muito a pena!

 

O (meu) post do ano

- Uma História com Princípio, Meio e Sim! -

Toda a rubrica "Uma História com Príncipio, Meio e Sim!" foi um exercício muito bom, bonito e "depurador" para mim - e marcou claramente o meu ano a nível de escrita, pois foi aí que me foquei acima de tudo, defraudando todos os outros temas sobre os quais costumo dissertar. Esta série de textos foi dolorosa em alguns momentos e curativa noutros. Fi-la muito mais para mim do que para os outros, mas eu queria muito deixar registos desta fase tão conturbada da minha vida - um evento tão bom misturado com sentimentos tão difíceis... foi uma gestão complicada que quis documentar. Dentro deles, o post do vestido de noiva foi o mais lido e também o mais sentido - hoje choro quando o leio. Mas o mais importante de todos, o post do meu ano, foi o último, em que falo do casamento e da terapia.

 

A viagem do ano

- Maldivas -

Só fiz duas, Maldivas e Açores, e ainda quero escrever sobre ambas (ainda que já leve meio ano de atraso). Mas é claro que as Maldivas - perdoa-me Açores!!! - arrecadam este meu galardão, pois roubaram o meu coração. Quero tanto voltar!

 

A palavra do ano

- Resiliência

 

A foto do ano

Não há "a" foto. Há muitas, felizmente! E tendo em conta que este ano tive um fotógrafo por minha (nossa) conta num dia tão especial, a foto do ano tinha de ser uma das muitas que ele nos tirou. Mas de tão boas é difícil escolher... por isso, em vez de uma, vão duas:

 

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O vídeo do ano

Não há grandes dúvidas: o casamento foi o evento do meu ano e tudo roda à volta dele. Ainda não tinha mostrado nenhum vídeo daquele dia, por isso fica aqui em modo best of (este é o teaser, mais curtinho, bom para terem um glimpse daquilo que foi este dia tão bonito). 

 

16
Abr21

Uma história com princípio, meio e sim! #6

Um pontapé no rabo das tradições

Não sou nem nunca fui supersticiosa. Tenho amuletos - uso certas joias, que pertenciam às minhas avós, em dias especiais e em que sinto que preciso de uma força extra - mas nunca acreditei em superstições ou ditos populares. Nunca percebi porque é que não podia passar debaixo de uma escada, abrir o guarda-chuva dentro de casa, ter chapéus em cima da cama ou não devia pousar a carteira no chão (aparte da questão óbvia da sujidade). Adoro gatos pretos e o número 13 é para mim tão válido como o 7, o 12 ou o 14; sou também a prova de que varrerem-me os pés não é sinal de ficar solteira para sempre (muitas foram as vezes em que a D. Joaquina, por brincadeira, me tirou o pó de cima dos pés - mas a verdade é que, se tudo correr bem, caso-me em breve!) e sei também que um mocho piar não é necessariamente sinal de morte, como ela própria dizia (embora a todos os minutos morra de facto alguém, não tem é de ser próximo). 

Fui ignorando - e até desprezando - todas estas lenga-lengas ao longo da minha vida. Sim, deixei de passar por debaixo de escadas e tirava os chapéus de cima da cama quando me chamavam à atenção, não porque acreditasse, mas porque não estava para contrapôr questões de fé e era mais fácil evitar certos atos do que chatear-me por causa deles.

Para meu grande azar o casamento é um ato recheado de superstições e tradições - a maioria delas parva e desnecessária, pelo menos para mim. Mas, para azar dos outros, o casamento foi também aquele acontecimento que eu tomei como mais meu; em que decidi deixar-me de medos e merdas, de opiniões, expectativas e desejos dos outros e fazer aquilo que de facto queria. Isto foi em grande parte impulsionado por tudo o que li nos vossos comentários, a maior parte dizendo que teriam feito isto e aquilo diferente (pois fizeram certas coisas por pressão dos pais, da família ou em nome da tradição) ou que, pelo contrário, não se arrependem um minuto de certa decisão que tomaram e que foi contra a vontade de todos. E o facto de não casar pela igreja é só a ponta do iceberg. Neste momento, todas as ideias que eu ou o Miguel tenhamos, parvas ou não, entram para a equação - e o que importa é que gostemos delas e que espelhem aquilo que somos. As opiniões alheias não passam disso: opiniões. Tenho ouvido muitas (e pedido outras, inclusivamente neste post), mas é nossa escolha ouvi-las ou não.

As tradições caem num saco em que eu ouço, mas não ligo. E, confesso, algumas dá-me até algum gozo contrariar. Vejamos:

Começa pelo facto de não se poder dormir com o noivo na noite anterior ao casamento. Oi?! Mas então eu vou dormir onde? Vou voltar a casa dos meus pais depois de um ano e meio a dormir com ele? A noite já será de certeza má, com o stress e a ansiedade, não é preciso estranhar a cama para ajudar à festa.

Isto faz com que nos vejamos na manhã do casamento, antes da cerimónia - o que, só por si, dizem que já dá azar. Uma chatice!

A ideia que a noiva tem de carregar "something old, something new, something borrowed, something blue" (traduzindo, "algo antigo, algo novo, algo emprestado e algo azul") é das que, apesar de igualmente parva, eu acho graça. Não vou trocar uma jóia que queira usar por uma outra só para cumprir com a superstição mas, a calhar bem, é capaz de ser a única coisa que me trará sorte neste casamento. E, pensando bem, a parte do antigo e do emprestado sempre implica alguma poupança - algo que, no que diz respeito ao casamento, nunca é de desprezar!

Pérolas. Não sabia, mas dizem também que a noiva deve usa-lás para uma casamento duradouro. Será por isso que tantas mulheres ficaram presas em casamentos infelizes durante anos a fio? Porque usaram pérolas e isso não deixou que se separassem? É que se o efeito é assim tão forte, prefiro não arriscar. (Mas, mais uma vez, nunca se sabe - tudo depende do vestido, que ainda não está sequer em fase de concepção).

E como a noiva não tem coisas suficientes para se preocupar, ainda tem de andar com uma liga pirosa na perna, a fazer comichão o dia inteiro, para depois o noivo (ou outra pessoa que pague - a sério que esta moda existiu?!) a ir tirar com a boca. É que é já a seguir!

Só para acabarmos com o tópico "beleza e roupa", falta a tradição mais enraizada de todas: o noivo e a noiva não podem ver as respetivas vestimentas até ao dia do casamento! Ou seja: a pessoa cuja a opinião mais me importa - aquele que quero agradar, a pessoa mais importante de toda a festa - é a única que não pode opinar. A pessoa a quem pergunto de manhã se estou bonita ou se a roupa me fica bem, não pode dizer nada sobre o vestido mais importante da minha vida. A pessoa a quem compro roupa e a quem dou sugestões de vestimenta é aquela que não posso acompanhar na prova. Faz tanto sentido, não faz? É como aquela lógica muita aplicada no nosso dia-a-dia... a lógica da batata, conhecem? Por mim, e se não fosse fazer a prova em horário de expediente, o Miguel vinha comigo. À falta disso, sobram as fotos, que já dão uma ideia mas sempre deixam o "wow" para o dia especial (embora o meu namorado fique sempre WOW num fato, quer seja em foto ou ao vivo).

Falta ainda outro clássico: ser "entregue" pelo meu pai ao meu noivo, qual mercadoria pronta a ser expedida. É muito provável que o meu pai me leve até ao altar, porque até agora não encontrei outra forma prática de fazer as coisas, mas já deixei tudo em pratos limpos: eu não sou propriedade de ninguém e não sou "entregue" a ninguém. Não vou deixar de ser de um para ser de outro. Não sou mais do Miguel a partir dali do que sou do meu pai. Serei sempre filha - mas posso não ser sempre mulher do meu noivo, embora espere que assim seja. Por isso não há nada que mude, a não ser o facto de ter uma aliança no dedo. Mas não seja por isso - estou sempre aberta a presentes do género por parte dos meus progenitores ;)

Há muitas outras que poderia falar e que não pretendo ter no meu casamento: a noiva chegar atrasada (porque faz parte dos princípios da boa educação, não é verdade?), o arroz atirado no fim da cerimónia (porque nestes dias a conversa do desperdício e de não deitar comida fora não é uma narrativa que interesse), os votos decorados por toda a população mundial ("na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, até que a morte nos separe"), o lançar do buquet ou a abertura da pista de dança com uma valsa, seguida de uma dança com os pais e sogros. 

Porque da mesma forma que eu sei que não foi por ter usado um anel da minha avó que isto ou aquilo correu melhor, também sei que só há duas coisas que podem fazer com que este casamento acabe mal: eu e o Miguel. Não vai ser o facto de eu ver o seu fato ou ele ver o meu vestido, não vai ser por dormirmos juntos na noite anterior ou por eu não levar pérolas como adereço. Se o casamento correr bem e se formos casados até aos 90 anos, o mérito é nosso. Se um dia nos separarmos, a culpa é também nossa. Só muda o verbo, os sujeitos são os mesmos. E isso é independente de todas as tradições, superstições ou parvoíces que queiramos levar a cabo (ou não) num dia tão especial para nós. Da minha parte, eu passo. Se por ele estiver tudo bem - e porque, mais uma vez, só estes dois sujeitos importam nesta equação - tudo o resto é conversa. Literalmente.

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16
Mar21

Uma história com princípio, meio e sim 5#

!AJUDA DO PÚBLICO! O baile de um casamento pode começar de dia?

E assim se estraga o ritmo de escrita. Janeiro e a metade de Fevereiro foram um mimo, mas depois lá se foi tudo pelo cano. É quase paradoxal o estado de estagnação em que todos vivemos neste momento, comparando com o nosso estado de espírito; se por um lado me sinto também parada, inerte, com falta de fazer coisas, por outro estou cansada, extenuada como se andasse a mil à hora e o mundo estivesse a girar ao mesmo ritmo de há dois anos. É estranho.

E mais estranho ainda é estar a preparar um casamento neste ambiente. Apesar do processo não estar de todo parado, tudo o que é colossal está ainda em stand-by: eu não tenho vestido e ainda não fiz sequer a primeira prova com a pessoa que mo vai fazer; o noivo não tem fato (e ninguém tem coisas para vestir, de uma forma geral); ainda não voltámos à quinta depois da primeira visita, por isso ainda não decidimos nem experimentámos menus, nem conseguimos organizar a festa em si; e o casamento pelo civil, com todas as conservatórias fechadas, ainda nem sequer foi tratado. Por outro lado todos os detalhes mais pequenos já estão tratados ou escolhidos: alianças ainda não compramos mas já sabemos quais queremos, já temos cones de papel personalizados para colocar as pétalas, já temos caixinha para as alianças, alguns souvenirs, alguma decoração. Ah, e os convites! Muitos deles já foram entregues e, com a rapidez na resposta, não tarda nada e temos de nos atirar ao pesadelo de organizar as mesas.

Mas, neste momento, mais do que qualquer outra coisa, sinto-me muito preocupada com o planeamento da festa. Sinto-me uma incompetente ao tentar organizar um casamento - e uma festa - quando só assisti a dois casórios em toda a minha vida e nunca fui a festas ou entrei sequer numa discoteca. Pior: eu e o Miguel somos aqueles dois gatos pingados que ficamos sentados na mesa enquanto toda a gente faz a dança do quadrado em plena pista de dança, durante o auge da festa. Por isso a questão que se põe é: como é que esses dois seres, que neste caso são os noivos, vão realizar uma boa festa? Tenho muito medo que as pessoas saiam do meu casamento a pensar "que seca que isto foi"...

Aquilo que tenho feito é ouvir a opinião de pessoas conhecidas e que são, claramente, party people. Pessoas já calejadas em festas e casamentos, que sabem o que resulta ou que, pelo contrário, faz com que existam momentos mortos. Não sei quanto a vós, caros leitores, mas se também se encontram neste leque de pessoas que gostam de abanar o capacete (ou se simplesmente tiverem uma opinião pertinente a dar), ajudem aqui esta alma perdida.

Vou casar a um domingo. O casamento vai começar cedo, antes do almoço, de maneira a que aproveitemos bem o dia e que quem quiser sair cedo, de forma a poder estar acordado e decente para trabalhar no dia seguinte, o possa fazer. Isto não quer dizer que o casamento tenha de acabar à 1 da manhã obrigatoriamente; o que quero é que as pessoas que têm que sair a essa hora sintam que se divertiram e que aproveitaram todas as fases do casamento devidamente. Que partilharam um momento feliz connosco, que comeram, beberam e se divertiram à fartazana, mesmo que a festa não se alongue pela noite dentro. 

O plano é: casar - acepipes e fotos - almoço - corte de bolo - abertura de pista - jantar - continuar a dançar. A questão aqui é que a abertura da pista, a correr como planeado, vai ser durante a tarde - e aquilo que me parece é que as pessoas acham estranho dançar de tarde. Eu nunca fui de dançar - e, como tal, é-me indiferente fazê-lo de manhã, à tarde ou à noite. Mas há uma mística qualquer em relação à noite que eu desconheço e que deve também ter que ver com a bebida (que, só por acaso, eu também não consumo). 

No meio de todo este processo dizem-nos sempre que o casamento é nosso e que devemos fazer como acharmos melhor. Mas, por outro lado, também nos dizem que apesar de sermos nós a casar, a festa é para os outros. Dá-se uma no cravo e outra na ferradura, basicamente. Eu sei bem que este é o nosso casamento e tenho feito um esforço muito grande para o fazer à minha medida, sendo que planeio ignorar à grande algumas tradições amplamente implementadas. Mas a verdade é que seria impensável fazer isto totalmente à nossa visão: se assim fosse não haveria necessidade de haver álcool envolvido nem faria sentido haver pista de dança, pois nenhum de nós tem na dança um entretenimento. Por mim organizava a festa como faço (ou idealizo) um Natal ou um ajuntamento de família e amigos: com música, muita conversa e jogos de tabuleiro à mistura. Mas cedemos a algumas coisas porque é um casamento, porque faz sentido e há coisas que para todos os efeitos são obrigatórias para que todos estejam felizes e confortáveis - acho que seríamos linchados se, em vez de champanhe para brindar, puséssemos champomy porque nenhum de nós bebe álcool, não é?

A questão aqui é: qual a linha que separa as coisas "obrigatórias" das outras em que podemos mexer? Faz-vos confusão o baile ser de dia (ou pelo menos parte dele?? Qual é a mística que se perde? O que faz de um casamento um BOM casamento? Ajudem!

 

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