Quem leu o post anterior até ao fim já sabe da boa nova: estou noiva! Apesar de no inicío a ideia ter custado um bocadinho a entrar - não por não querer, mas por estar a sofrer por antecipação com tudo aquilo que ia ter de enfrentar - agora que já caí em mim quis avançar com a preparação do casamento o quanto antes. E a verdade é que vamos a todo o vapor: apesar de todo este caos pandémico decidimos correr o risco e já marcamos o casamento para Junho. Sim, daqui a cinco meses. E não, não estamos loucos.
Para mim é ridícula a ideia de marcar um casamento para daqui a dois anos - ora é porque não há a data que queremos, ora porque é preciso muito tempo de preparação, ora porque a loja dos vestidos de noivas diz que só arranja "O" vestido nessa altura, ora porque os convidados têm de arranjar tempo na agenda, ora porque tudo tem de estar perfeito. Com todas as histórias que ouvimos acabamos por estar formatados para esta realidade - assim como já estamos prontos para aceitar os preços exorbitantes que nos pedem em relação a tudo o que diga "casamento".
Já eu entrei nesta ideia do casamento com um pensamento diferente: quero descontruir um bocadinho o protocolo e tudo aquilo que enraizamos ao longo de anos e anos de casórios. E isso começa aqui: se decidimos que era para casar, não é para daqui a dois anos. É para breve. E breve é Junho. No meio deste pouco tempo em que me vi envolvida no meio, já tive pelo menos dois casos de quintas que nos disseram que tinham uma data livre porque "os noivos desistiram de casar" - isto quando não nos dizem mesmo que se separaram. Eu não sei como vai ser a minha vida daqui a dois anos; sei como gostaria que fosse, mas desconheço efetivamente o seu destino. E, como tal, quero fazer as coisas que quero e que me deixam feliz o mais rapidamente possível. Dois anos pode ser muito tempo.
E apesar de, lá está!, não saber o que me espera, sei que gostava de só casar uma vez. E por isso sendo um acontecimento único, quero que fique registado para sempre. E, tal e qual como numa viagem, não é só o dia que conta; toda a preparação é, em si, uma aventura marcante, que eu quero muito que fique registada. Quero fintar a memória seletiva e, mais uma vez, fazer deste blog um registo público desta viagem que, como todas, terá um bocadinho de todos os ingredientes: partes boas e partes más, coisas emocionantes e outras chatas, decisões rápidas e entraves, cedências e escolhas bem firmes. Sei que, no futuro, posso vir a ser como a maioria dos casais que conheço, que perante a mais simples pergunta sobre o seu casamento responde: "já não me lembro". Mas, nessa altura, terei (como sempre) um bom auxiliar de memória, para me (re)contar como tudo aconteceu.
Passaram praticamente três semanas desde o pedido mas sinto que já tenho um mundo de coisas para contar, e sinto que esta é uma boa desculpa para voltar a escrever com frequência. Lembro-me do quanto gostava de ler o "Boletim da Noiva", d'A Pipoca Mais Doce, e espero que sintam aquilo que eu senti na altura: que fazia parte do processo, que afinal já sabia como era casar.
Como eu ainda não sei - e na verdade tenho muito pouca gente à minha volta que sabe - fico à espera do vosso feedback, conselhos e comentários. Tudo menos: "mas isso é muito pouco tempo!". Isto vai lá, minha gente. E, acreditem, vai ser um dia de sonho.
Eis o primeiro texto da nova rúbrica "Uma história com princípio, meio e sim!"
O Pedido
Têm-me perguntado se desconfiava. Eu digo que não; eu simplesmente sabia. Sabia que ele me ia pedir em casamento.
Não me perguntem como nem porquê: era um feeling que já pairava em mim há alguns dias. Mas não se trata de desconfiar, pois ele não deixou nenhuma pista para que isso acontecesse. Não fazia a mínima ideia de que ele tinha comprado um anel ou orquestrado umas horas comigo para me fazer o pedido. Mas se antes sentia algo, na véspera de Natal (um dos meus dias favoritos do ano) acordei a saber que aquilo ia acontecer.
Foi tudo muito simbólico: primeiro almoçamos no restaurante onde fomos os dois jantar pela primeira vez, ainda em fase pré-namoro (e podem já dizer que isto era uma pista óbvia, mas não, pois o almoço foi combinado umas duas semanas antes e impulsionado até por mim, depois de ter visto uma publicação sobre o sítio e me ter dado a nostalgia e a saudade); depois fomos dar um passeio a uma praia onde, um dia, fomos os dois pensar na vida - ele a correr e eu sentada na areia, tentando meditar e relaxar, ponderando o que havia de fazer perante uma das decisões que mais me custou a tomar na vida: avançar, ou não, para uma relação. Naquele dia não tínhamos nada combinado mas já falávamos muito e eu sabia que aquele era o seu percurso habitual; pedi-lhe que, se me visse, continuasse. E ele viu-me. E eu vi-o. E ele continuou - respeitando, pela milionésima vez, a minha vontade. E pondo cada vez mais em causa, infinitamente, a minha convicção de ser solteira até ao fim dos meus dias.
Mentiria, por isso, se dissesse que foi uma surpresa. Não foi porque eu sabia que ia acontecer - e porque o casamento já era uma coisa muito falada, não só entre nós como também com a família. Foi, "apenas", um marco; o oficializar de algo que, para mim, podia ser simplesmente combinada - mas que, num ato de coragem e cavalheirismo, ele quis que fosse à moda antiga.
Também mentiria se dissesse que ansiava por aquele momento ou que foi um dos mais felizes da minha vida. A felicidade na sua plenitude senti-a nessa noite, quando me deitei no peito dele depois de um dia cheio, já mais calma e sem a alma em ebulição. Já o disse: não sou mulher de paixões - das borboletas na barriga, do nervoso miudinho, da ansiedade de algo novo - mas sim de amor - da calma, da estabilidade, das rotinas felizes. Naquele momento, em que o vi de joelho no chão, senti e pensei muita coisa - de tal forma que acho que estive perto de entrar em pânico.
Pensei imediatamente naquilo que os meus pais iam pensar e na dor que esta oficialização lhes iria causar - uma espécie de dor superlativa do ninho que já está vazio, mas que iria ficar ainda pior; pensei que dali a nada estaria em casa, de anel no dedo e que teria de lhes dar a notícia... embora não soubesse como. Pensei em tudo aquilo que tínhamos falado até há bem pouco tempo, altura em que o casamento não passava de um plano meio que abstrato - e, acima de tudo, em todos os problemas que já sabia que se iam levantar a partir daí. Pensei no facto dos homens se sentirem obrigados a vergar-se perante uma mulher para lhes pedir a mão - e o quão ridículo e injusto isso é, numa altura em que pedimos igualdade de géneros mas, nestes casos culturais, só tendemos a pensar para um lado. Pensei que não queria ter de lidar com o entusiasmo dos outros, que queria que aquilo fosse só meu e dele, talvez porque eu própria não estava a saber lidar com aquele misto de emoções. Foi um momento muito representativo daquilo que tem sido a minha relação até aqui: muitíssimo feliz, mas com a plea consciência de que dentro de toda essa felicidade vive também a dor.
Depois do "desconfiavas?", vem a o outra pergunta clichê: "choraste?" Mas acham que alguém que está mergulhada num poço de questões e sentimentos diversos como eu, consegue fazer alguma coisa para além de chorar?
"E disseste que sim?" Acham que é preciso? A pergunta não era mais que retórica.
Não sei se disse que sim (devo ter balbuciado algo do género), mas a minha prioridade foi arrancá-lo do chão (senti-me muito culpada por, eventualmente, tê-lo feito sentir que precisava de fazer aquilo para formalizar um pedido que eu ia aceitar de que forma fosse) e, mal o vi ao meu nível, agarrei-o com força, tal e qual como o quero agarrar para o resto da vida.
Mal entrei no carro, com a adrenalina a correr pelo corpo quase como se tivesse sido atropelada por um camião de amor - mas que não deixa de ser um atropelamento - construí imediatamente a minha defesa para lidar com tudo aquilo: com todos os problemas que antevi, com todas as perguntas para as quais não tinha resposta, com toda a dor que dali poderia surgir, embora este seja um acontecimento tão feliz. Disse a mim mesma (e ao Miguel) que aquilo não passava de uma oficialização e que não tinha de ser sinónimo de casar imediatamente. Que tínhamos de ir com calma. Que o pedido não era mais que o confirmar de um desejo comum: o de passarmos o resto da nossa vida juntos.
O resto do dia foi o continuar do turbilhão de sentimentos que tomaram conta de mim, dos meus nervos e do meu canal lacrimal. Primeiro fomos trocar o anel, que por causa dos meus dedos atipicamente finos não me servia (muito romântico, não é? Receber um anel de noivado e uma hora depois já o ir trocar...) e, depois, fomos espalhar a notícia. Optei por fazê-lo faseadamente: primeiro ao meu núcleo familiar, depois à restante família e, só uma semana depois, às outras pessoas. Assim fui dispersando as reações e perguntas para as quais não estava preparada, uma vez que estava a tentar lidar primeiro com os meus próprios demónios.
Diria que na Passagem de Ano o acontecimento já estava digerido, assim como muito dos meus medos. Anunciei meio que subtilmente nas redes sociais e todos os que não sabiam passaram a poder saber. Nessa semana troquei ideias com algumas pessoas mas, acima de tudo, falei muito com o Miguel; quis enfrentar logo os problemas que na minha cabeça iam ser entraves e, a partir do momento em que percebi que tinham uma solução fácil ou não eram tão graves como previa, deixei de me preocupar com eles. Não me cansei de lhe agradecer pelo gesto de coragem, pedi-lhe desculpa por de alguma forma o poder ter influenciado a fazer um pedido clássico (algo que eu não queria) e, acima de tudo, por não ter tido a reação radiante que se espera de uma mulher que é pedida em casamento pelo homem que ama.
No fundo, pedi-lhe desculpa por ser como sou - e agradeci-lhe por me aceitar e amar assim, mesmo tendo a racionalidade à flor da pele.
Disse-lhe, como sempre, que o amava.
E que, agora, há um casamento para preparar.