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Entre Parêntesis

Tudo o que não digo em voz alta e mais umas tantas coisas.

31
Jan20

As tentações do AliExpress

Ou o facto de eu sair à minha mãe por comprar coisas-giras-mas-inúteis

Há uma fase da nossa vida em que, por uma razão ou por outra, damos por nós a pensar "caraças, sou igualzinho ao meu pai" (ou à minha mãe, é como der jeito). Creio que acontece muito quando já somos pais, numa daquelas inevitáveis alturas em que um filho enraivecido pelas hormonas nos atira à cara exatamente as mesmas coisas que nós atirávamos aos nossos progenitores naquela idade. Eu fui precoce. Não tenho filhos e já penso, muitas vezes: "caraças, estou a ficar igual à minha mãe".

Num Natal, para gozar com ela, ofereci-lhe uma caixa de "Coisas Giras mas Inúteis". Era, basicamente, um compêndio de utensílios culinários - dos mais estranhos, invulgares, estúpidos e inúteis que encontrei no mercado nacional - para brincar com a sua vontade louca de encher as gavetas (e as prateleiras) da cozinha com tudo o que é ferramenta para cozinhar ou para auxiliar esta atividade. O quinto piso do El Corte Inglês ou até o mero corredor da secção Kasa do Continente são locais onde não se deve deixar a minha mãe sozinha. Pelo menos, não com a carteira.

E sim, agora vou dizer aquilo que estão a pensar:

Eu sou igual.

Há meia dúzia de anos gozava com a minha mãe e hoje sou eu que adoro tralhas de todos os géneros. Nesse aspeto até se pode considerar que sou pior: apesar de ter uma pancada particular por items de organização, gosto de tudo aquilo que acho que possa ser uma ideia inovadora - ainda que tenha 99% de hipóteses de ser inútil ou ineficaz naquilo a que se propõe. Há ainda mais uma agravante: eu não preciso de sair de casa para cair em tentação. Nem de um cartão de crédito físico! Abro o AliExpress e ele satisfaz-me todos os desejos-estúpidos-de-coisas-giras-mas-inúteis. Ele sabe o estilo de coisas que eu gosto. Ele sabe que eu sou forreta e não gosto de pagar portes de envio. Ele sabe que as coisas baratinhas devem vir primeiro na lista. E como é que eu posso resistir a um descascador de castanhas a um euro e meio, se tenho sempre medo de cortar castanhas com a faca (e levar um dedo atrás)? E a um cortador de papel de embrulho por meio euro, que nem dá para um café, e é coisa que me chateia tanto (cortar o papel de embrulho é chato, toda a gente sabe)? E aquelas prateleiras extensíveis, que tanto jeitinho davam no meu quarto de banho com tão pouca organização?

Pronto, não resisto. E se há coisas que, quando abro após chegarem do correio, me dão vontade de devolver para a China de tão embaraçosas - de más - que são, há outras que até são bons achados. Diria até que o AliExpress pode ser o paraíso dos freaks da organização. Mas, por outro lado, é um mundo de tentações sem fim - e, acreditem, há tentações muito parvas. Há que saber escolher - e perceber que a expectativa nem sempre corresponde à realidade. Podia - e vou, em breve - mostrar como tenho transformado muitos espaços da minha "nova casa" com a ajuda deste meu novo melhor amigo. Mas, por hoje, ficamo-nos por um bom choque de realidade - que é como quem diz, de "vergonha alheia".

 

"1 par de palmilhas de algodão de apoio para o antepé" (vá, isto trocado por miúdos)

PES.jpg

(e a beleza daquele mindinho que não encaixa, hun?)

 

21
Jan20

Acreditar em mim

Olhei de relance ao espelho enquanto lavava os dentes e se ouvia no meu telemóvel a "Talvez de Eu Dançasse", do Miguel Araújo. Estava a pensar numa série de coisas que me tinham acontecido nos últimos dias. E a rever mentalmente conversas que tive. E, do nada, caiu-me a ficha. Percebi o que era "acreditar em mim".

O assunto colocou-se devido à minha necessidade de, neste ano, perder peso. Se bem se lembram foi este o primeiro objetivo que escrevi na minha lista para 2020 e estou a levar a questão muito a sério, sem dietas malucas ou princípios infundados. Fui ao nutricionista, pedi ajuda naquilo que acho que são as minhas fraquezas, procurei alternativas - e o resto compete-me a mim. Não sou ignorante na matéria e já sabia o que ia ouvir: faltam-me legumes sólidos na alimentação, em substituição dos hidratos, e fazer exercício. Sobre isto, também sei o que me dizem sempre: "tens de encontrar um desporto que gostes". E eu encolho os ombros, sabendo bem que não vale a pena responder a algo que do outro lado não querem ouvir ou aceitar. Rematei apenas: "é mais fácil passar a gostar de legumes". E, acreditem: eu odeio legumes.

Não há nenhum desporto que eu goste e eu não preciso de os experimentar a todos. Porque isto vai muito para além de uma modalidade ou das suas características e idiossincrasias. Sou eu. Eu e os meus demónios. Cada pessoa tem a sua história e é muito fácil dizer que "toda a gente tem de gostar minimamente de desporto, nem que seja uma só modalidadezinha!" quando não estamos na pele do outro. É muito fácil dizer o que quer que seja (sobre qualquer assunto) quando não sabemos as razões, as vivências, as histórias e os fantasmas de quem está à nossa frente.

Não se trata de ser natação, ginástica, futebol, basquetebol, corrida ou andebol. Posso saber as regras de todos mas continuarão a ser, para mim, bichos de sete cabeças. Porque cresci a ouvir que não os sabia fazer. Já escrevi várias vezes sobre o impacto que teve sobre mim, e a minha auto-estima, o facto de ter sido sempre - durante a minha vida escolar - a última a ser escolhida para as equipas em educação física. Não esqueço o olhar de tédio - ou, por outro lado, de divertimento - quando os meus colegas me esperavam na meta da pista de atletismo do estádio, quando eu finalmente conseguia completar um quilómetro de corrida, terminando a prova uns dois minutos depois deles. Não se apaga da minha memória um momento em que, algures no quinto ano, uma professora diz "aí vem o desastre" enquanto eu entro para fazer uma prestação individual de uma modalidade qualquer. E também me recordo bem do olhar de "nhé" da minha professora de dança sempre que apreciava as minhas coreografias, encomendadas por ela nessa mesma aula. Nota para quem não me conhece (mas que, por esta altura, já deve estar a desconfiar do que aí vem): eu hoje em dia não danço.

Há coisas que têm um impacto inigualável e muito pouco expectável na nossa vida. Coisas que às vezes só percebemos mais tarde, quando escavamos até à raiz. Coisas que se disfarçam, com que se vive, mas que não desaparecem. E que vêm ao de cima em momentos de fragilidade. No meu caso apareciam quando ia a aulas de grupo (circuito, GAP ou localizada) e tinha uma vontade tremenda de chorar a meio dos exercícios, que se tornavam em ataques de choro mal punha um pé fora do ginásio; apareciam quando tive a infeliz ideia de contratar um PT e, antes das aulas, tinha vómitos de tão nervosa que ficava. E aparecem agora, quando se toca na ferida, e os outros tratam o assunto como alguém que simplesmente não gosta de exercício. Porque é muito mais que isso.

Ontem, a este propósito, o meu namorado disse-me que acreditava em mim. E perguntou-me: "porque é que tu não acreditas em ti?". E eu levei sempre este cliché, o "acreditarmos em nós mesmos", como um sinónimo de acharmos que somos capazes de algo. Do género: "eu sei perfeitamente que sou capaz de emagrecer, acredito em mim". Mas hoje, ao lavar os dentes, lembrei-me de outra coisa que ele me disse: "porque é que sempre acreditaste nas coisas que os outros te disseram e hoje não acreditas em mim?". E eu percebi que fiz da verdade dos outros, a minha verdade. Não se trata de saber que consigo, que sou capaz. Trata-se de saber aquilo que sou. E não, não é a mesma coisa. 

É saber que tenho duas pernas e dois braços, que não tenho aquela aptidão que muita gente tem para o desporto - que não chuto naturalmente uma bola, que não atiro direito para o cesto e que sou um tanto ao quanto desconchavada a correr - mas que consigo fazer as coisas. É saber que sou chatinha. Que sou organizada. Que cozinho bem. Que não gosto de aspirar. Que devia limpar o carro e não limpo.

É conhecer-me. E saber que posso fazer as coisas, independentemente de gostar ou não, de ser melhor ou pior. E que as opiniões dos outros não têm de ser as minhas. Que é inevitável ouvi-las, porque não controlamos as ações dos outros, mas que é uma escolha (mesmo que isso implique trabalho, racional e emocional) absorvê-las e fazer com que passem a ser as nossas opiniões.

Tenho quase 25 anos e, apesar de ser toda independente e nariz arrebitado, não sabia o que era acreditar em mim. Que bela idade para mudar. Talvez se eu dançasse....

 

16
Jan20

Game fever: os meus jogos de tabuleiro favoritos

Sempre fui fanática por jogos de tabuleiro. As tardes em que os meus primos alinhavam em jogar Cluedo eram de longe as mais felizes para mim - de tal forma que eu dava TUDO para ganhar, para desfrutar daquilo ao máximo, para não perder nenhum detalhe. Era uma festa.

Mas era coisa para acontecer uma vez por ano, se tanto. Se os ajuntamentos não aconteciam com muita frequência, conseguir que jogar fosse vontade de todos era um filme sem fim. Pelo que, na maior parte das vezes, os jogos ficavam a apanhar pó. Os meus irmãos já não alinhavam nessas coisas e só com os meus pais também não dava muito jeito. Restava-me jogar o dominó, as damas e o "Quem é Quem" com o meu pai, que sempre me matavam o bichinho (e que me criaram memórias que guardo com muito carinho).

Ao longo dos anos fui comprando um ou outro jogo, muitas vezes em conluio com a minha mãe, que também acha graça a estas coisas. Mas a verdade é que pouco os usávamos - ora no Natal, transformando a mesa de jantar num autêntico campo de batalha, ora quando o Rei faz anos.

Entretanto, quando me apercebi que o meu namorado era fã destes jogos (que foi, basicamente, logo quando começamos a dar-nos, quando ele me convidou para uma sessão de jogos de tabuleiro) agarrei logo a oportunidade. Já tinha, desde há muito tempo, uma série de jogos debaixo de olho - e esta foi a altura ideal para me fazer a eles. Como agora temos vários grupos com quem experimentar, vamos jogando e vendo o que gostamos mais e que dinâmicas funcionam melhor. Até lá em casa está a pegar o bichinho! E a minha mãe já aproveitou para investir num par de outros jogos, que também trago emprestados de vez em quando, só para lhes dar uso. É ao gosto do freguês, basicamente.

No meio desta game fever também os outros se começaram a aperceber do fenómeno e, neste Natal, uma série de prendas contribuíram para o crescimento da nossa coleção. Posto isto, ainda que não me possa considerar (para já!) uma expert na matéria, achei que podia fazer algumas reviews sobre os jogos que mais temos jogado lá em casa. Para já deixo os nossos três favoritos do momento:

 

Scattergories

Este está longe de ser um jogo novo. Foi lançado pela primeira vez em 1988 e já há mais de vinte anos que tem destaque lá em casa. Sempre foi dos que gostei mais, mas sempre achei que ao lado de colossos como o Cluedo ou o Monopólio não tinha grande projeção. Até há um ano atrás não sabia de ninguém que o conhecesse (fora da minha família), mas esta nova edição da Hasbro veio dar-lhe uma nova vida - e em português!, um pormenor que neste jogo acaba por ter alguma importância (a que tinha antes era inglesa).

Mas vamos à pergunta que se impõe: sobre que é? No fundo, o Scattergories é o jogo do stop mas em bom. Vai muito além das categorias de "nomes", "animais", "capitais" ou "vips". Tem vários conjuntos de categorias (de coisas tão normais como "vegetais" a outras tão parvas como "desculpas para chegar tarde") que têm de ser preenchidas ao rodar do dado, que contém em cada uma das suas faces cada letra do abecedário. O objetivo é completar o máximo de categorias possível (são 12), num determinado período de tempo, com respostas pertinentes e, se possível, diferentes das dos colegas. Não é jogo para quando está tudo mais para lá que para cá, mas garanto ser muito divertido. Para mim continua a ser o melhor de sempre!

 

scattergories.jpg

 

 

Tensão

No Tensão voltam as categorias. Para quem conhece ou já viu o popular concurso de televisão "family feud", a dinâmica deste jogo vai ser familiar. Aqui ninguém joga por si: formam-se duas equipas e não pode haver batotas, pois é a equipa adversária que controla os avanços da outra. Então é assim: é lançada uma categoria e a equipa que responde tem de adivinhar quais as respostas mais típicas dessa categoria. Exemplos: na categoria "doces regionais", dizer "pastéis de Belém", "pampilho" ou "Dom Rodrigo"; quando o tópico é "países frios", potenciais respostas são a Rússia, a Islândia e outros que tais. Não há limites para aquilo que dizemos nem somos prejudicados por dizer algo que não está listado - mas é preciso manter em mente que o objetivo é conseguir acertar nas respostas que estão no cartão (e que serão, supostamente, as mais respondidas). 

Como o jogo é composto por duas equipas, não há limite de participantes. No entanto, quando são muitos, torna-se difícil decifrar as respostas no meio de tantos berros (o que torna a vida da outra equipa, que está a monitorizar as respostas certas, um bocadinho difícil). Diria que o limite razoável é de 10, 12 pessoas no total. 

A pressão (e a dificuldade) acaba por ser bem menor que no Scattergories, mas é um jogo igualmente muito divertido. E tem o lado do jogo de equipa - que, dependendo do perfil de cada um, pode ou não ajudar à festa.

 

tensao.jpg

 

 

Dixit

O Dixit tem, à partida, um entrave: parece difícil de explicar (e, consequentemente, de jogar). Mas a verdade é que não é. Primeiro estranha-se, depois entranha-se - e consegue ser muitíssimo divertido, pois demonstra que a forma como cada um vê as coisas é diferente da do outro ao lado. Dizem que uma imagem vale mais de mil palavras - e aqui se demonstra que vale mesmo!

O jogo baseia-se em descrever uma imagem (de um conjunto de cartas que são distribuídas à partida por cada jogador) através de uma palavra, uma frase, uma canção, um filme... qualquer coisa. O objetivo é que essa pista não seja nem muito óbvia nem muito difícil - de forma a que, no final, algumas pessoas indiquem que aquela foi a carta descrita, mas outras sejam despistadas por outras cartas colocadas em cima da mesa pelos outros jogadores. Em cada ronda há, em cima da mesa, tantas cartas quantos jogadores (pois todos escolhem, do seu próprio baralho, uma carta que se identifique minimamente com a descrição dada pela primeira pessoa). No final, vota-se: qual é, afinal, a carta "inicial", que recebeu aquela descrição? Quem acertou ou conseguiu enganar os outros (com a carta que entregou), ganha pontos; quem não o fez, vai ficando para trás.

Tem a grande vantagem de poder ser jogado com pessoas de todas as idades (algo que não se pode dizer dos dois jogos anteriores, que exigem alguma cultura geral) e de depender apenas da criatividade e imaginação de cada um. Para além de que se podem comprar packs de expansão (mais cartas, com mais imagens), para que o jogo nunca se torne repetitivo. É muito, muito giro ver a interpretação que cada um faz de uma imagem que é, aparentemente, simples. E é surpreendente a quantidade de referências e ideias que uma imagem transmite. 

Foi o jogo escolhido para a noite de Ano Novo e ficamos de tal forma embrenhados que as 12 badaladas estavam a passar e nós a contar os pontos. E a verdade é que, por vontade de alguns, ainda lá estávamos. É incrível!

 

dixit.jpg

 

Como é: partilho mais jogos que tenho descoberto nos últimos tempos?

13
Jan20

Chávena de Letras: "Os Livros que Devoraram o Meu Pai"

oslivros.jpg

Logo no momento da compra deste livro percebi que, aparentemente, eu já não fazia parte do (suposto) target para o qual esta obra teria sido escrita. "Mas este livro é infanto-juvenil", atirou logo a assistente da Bertrand quando lhe pedi ajuda a encontrar o dito cujo, como se eu não tivesse idade para ler o que bem me apetecesse. "Ou então está incluído no plano Ler+", rematou, como quem põe água na fervura.

O tamanho diminuto do livro, inversamente proporcional ao tamanho da fonte, indicam de facto ser um livro para os mais novos. Mas a verdade é que só vejo adultos a lê-lo, talvez por ter associado o nome de Afonso Cruz (a começar pela Inês, que foi quem me aguçou a curiosade sobre este livro). E é indiferente se é lido por miúdos ou graúdos.

Porque "Os Livros que Devoraram o Meu Pai" é um livro sobre livros; é uma óptima porta de entrada para quem está a (re)entrar neste mundo, independentemente da idade que tenha. É um docinho que nos adoça a curiosidade para alguns coloços da literatura, que nos dá a conhecer algumas das suas personagens e da sua história só para nos deixar espreitar um pouco lá para dentro. A "Divina Comédia", de Dante, " O Estranho Caso de Dr. Jekyll e de Mr. Hyde" de Robert Louis Stevenson ou "Fahrenheit 451", de Ray Bradbury são alguns exemplos das obras mencionadas, usadas por Afonso Cruz como mundos onde a sua própria personagem habita, entrelaçando as histórias com a sua própria história.

Paralelamente a esta narrativa principal - sobre livros, livros e livros! -, decorre uma secundária que acaba por ganhar projeção no final. Foi esta que me fez gostar menos da obra. Não percebi qual a intenção do autor em levar a história para aquele caminho. Se havia uma lição de moral a retirar ou uma pescadinha de rabo na boca, não as assimilei como deve ser. E, sendo este um livro dedicado aos mais novos, temo que lhes aconteça o mesmo, e que o travo agridoce do final contrarie todo o propósito do livro: que ler é uma aventura paralela à própria vida.

12
Jan20

O que é a nossa casa?

A minha saída de casa foi o elefante na sala de 2019. Mas um assim daqueles mesmo gordos, que não passava na porta por muito que eu o virasse de pernas para o ar. Foi um processo tão natural como doloroso - e eu aprendi, pela primeira vez, que pode haver muita dor na felicidade.

Nunca tomei a decisão de sair de casa. Nunca fiz as malas e trouxe as minhas coisas para casa do meu namorado. Nunca bati com a porta. 

Simplesmente aconteceu, foi só um passo num processo que se queria mais oleado no que dizia respeito à convivência com o meu namorado. Ambos trabalhadores, decidimos que o momento do dia para estarmos juntos seria o jantar. Depois era aquele bocadinho de televisão enquanto o estômago fazia o seu trabalho de digestão e, logo a seguir, cama, que o dia seguinte era normalmente de trabalho. E eu, que sempre adorei dormir sozinha, dei por mim a querer ficar aquele bocadinho mais com ele; gostava de o ver adormecer, de o sentir relaxado ao meu lado. De eu própria relaxar de um dia de azáfama e stress com a mão dele em cima da minha. 

O que acontecia era óbvio. A maior parte das vezes adormecia. Mas no primeiro momento em que acordava para me virar para o outro lado ou pôr mais confortável, abria a pestana, via as horas e ia embora para minha casa. Podiam ser 23h. Mas também podiam ser duas da manhã. E muito embora os meus pais soubessem perfeitamente onde estava (a não mais de cinco minutos de casa), toda esta incerteza de estar ou não estar em casa, de chegar ou não chegar a certa hora, causava-lhes mau estar - até porque nunca fui pessoa de sair ou de chegar tarde. E se para eles era desconfortável, para mim era cansativo. Foram uns meses a acordar após o primeiro sono, vestir e ir para casa; a interromper o momento de descanso, conduzir, e voltar a deitar-me noutra cama fria. 

Até ao dia em que me disseram que talvez o melhor fosse ficar lá a dormir, para não haver desconforto para nenhum dos lados. E eu assim fiz. Parece simples, não é? Parece que estamos só a discutir meia-dúzia de horas em que nem sequer convivemos com ninguém, horas nulas no nosso dia. Mas que depois, vendo ao detalhe, se transcendem, tanto em questões práticas como psicológicas.

Diria que na nossa cabeça, e vista a questão de um ponto de vista simplista, a nossa casa é o sítio onde dormimos. Casa pode ser o imóvel que compramos ou alugamos. Ou o que herdamos. Pode ser o sítio onde moramos com os nossos pais. Pode ser o local onde nos sentimos mais confortáveis. Onde passamos mais tempo. Ou pode ser uma pessoa, independentemente de qualquer bem material. O significado de casa é diferente para cada um de nós.

Mas a partir do momento em que eu vim dormir para outra casa que não a minha (e que será, eternamente, minha), todo um caos se formou dentro de mim. Mais do que afetar a minha vida do dia-a-dia, afetou o meu bem-estar pessoal. 

Qual é, afinal, a minha casa?

Aquela onde moram os meus pais, onde eu sempre morei? Que é minha por direito e herança, mas que é minha acima de tudo porque tenho lá toda a minha vida? Aquela onde desejei viver para o resto da minha vida, a minha casa de sonho, com tudo aquilo que nunca me imaginei a viver sem? Ou esta, onde estou a tentar lançar raízes para uma família a dois, mas que de facto não é minha, e nunca será minha, para além do sentimento que tenho por ela? São as minhas coisas que fazem a minha casa? Sou eu? É a minha vontade de cá estar?

Há uns dias, enquanto batia com a porta da garagem de casa do meu namorado, falava com a minha irmã ao telemóvel. Veio a pergunta tão inocente como típica, do outro lado da linha: "onde estás?". E eu disse, como digo sempre, aplicando a minha nova nomenclatura no que a habitações diz respeito: "a sair de casa do Miguel para ir para casa dos pais". Ao que ela respondeu: "quando é que vais começar a chamar a essa a tua casa?".

A resposta é que não sei. Nem quero pensar nisso. Mas, engraçado, no meio deste limbo acabei por "perder" a "minha casa". Agora, independente da casa onde viva, digo sempre que é dos outros. Acho que para evitar dores e choques de realidade. Para não ter de decidir. Para não ter de pôr um ponto final numa e fazer um parágrafo na outra. Porque gostava de saber se dá para viver desta forma, com ponto e vírgula.

Tudo isto sabendo, claro, qual é o caminho natural das coisas. Sei que, mais dia menos dia, direi ao final da tarde, quando sair do trabalho para ir fazer o jantar, que venho para "minha casa". Mas também sei que só o vou dizer quando, tanto no meu coração como na minha cabeça, ficar garantido que a minha casa - a casa dos meus pais - será exatamente isso: eternamente minha. Que o meu quarto será eternamente meu, com as coisas que o identifiquem como tal, mesmo que algumas venham comigo para esta nova casa para que, também eu, me possa sentir em casa. E, acima de tudo, sei que só o vou dizer quando estiver de consciência tranquila e fizer as pazes comigo própria, muito em parte por ter deixado os meus pais naquela que lhes disse ser para sempre a minha casa. E que é, e que eu sinto como tal, mesmo não dormindo lá. Porque continua a ser a casa onde passo mais tempo ativo (porque dormir não passa disso, e basta uma cama, independentemente do sítio onde está inserida), a casa com as minhas coisas e a história da minha vida. E a casa onde um dia, se tudo correr bem, gostaria de voltar a viver em pleno, com tudo o que isso inclui.

Depois de tudo isso sarado, de todas as respostas resolvidas e todos os medos apagados, após os outros perceberem esta dinâmica que quero e que sinto ser a melhor para mim... eu talvez consiga dizer que a minha casa é esta. Até lá, não me perguntem onde vivo. Há definições que, apesar de aparentemente fáceis, são difíceis de definir.

08
Jan20

19 objetivos para 2020

Depois do sucesso que foi, para mim, fazer uma lista detalhada com os objetivos para 2019 - que, como disse, fui deitando um olho de vez em quando, para ver se a coisa não saía muito do meu controlo - decidi fazer o mesmo para 2020. Queria seguir a mesma lógica e, este ano, escrever 20 objetivos - mas, por um lado, já não me conseguia lembrar de mais nada para escrever; por outro, e pensando já a longo prazo, vi que em 2050 estaria tramada, com 50 objetivos para delinear. Por isso achei melhor quebrar já o ciclo e ficar-me pelos já clássicos 19 objetivos. Já não é mau! Aliás, já é um risco bastante grande! Neste tipo de coisas, quanto mais escrevemos, maior é a possibilidade de insucesso. Mas eu estou esperançosa!

A verdade é que esta lista não é tão entusiasmante como a do ano passado. 2019 foi um ano de mudanças: algumas que eu sabia que estavam em curso, outras que eu não fazia a mínima ideia de que iriam acontecer e que abalaram todos os meus alicerces. Mais do que ser bom ou mau, foi um buuuum de acontecimentos que tive de interiorizar e cujo impacto tive de amortizar e aprender a gerir. Este ano continuo aberta a surpresas, mas espero acima de tudo que 2020 seja de estabilização: no trabalho (em que a "estranheza" inicial já passou, assim como a fase das "limpezas gerais"), com a família e com os amigos, e com a família que estou a criar (comigo e com o meu namorado - e todas as novas dinâmicas que isso implica). 

Posto isto, aí vai a minha lista para ter em olho nos próximos 366 dias (mais coisa, menos coisa):

 

- Perder, pelo menos, 5 kgs;

- Ler, pelo menos, 12 livros - o equivalente a um por mês;

- Fazer, pelo menos, seis escape rooms;

- Continuar o trabalho de apagar más fotos que, nos meus arquivos de anos e anos, ocupam gigas de espaço no meu computador;

- Não só aprender novas músicas no piano mas também trabalhar as que já sei e que, por não treinar, me esqueci;

- Fazer um curso sobre malhas no estrangeiro;

- Riscar, pelo menos, mais um país do meu mapa de locais visitados;

- Fazer com que a minha empresa volte, tantos anos depois, a ser representada em feiras;

- Depois da missão de tentar manter a minha caixa de email limpa, este ano auto-proponho-me (e prometo tentar) deixar limpo o ambiente de trabalho, sem todos aqueles items que lá guardo "só porque naquele momento não tenho o tempo para os arrumar e que, mal tenha um tempinho, arrumo" e que se transformam em autênticos monos que habitam o meu ambiente de trabalho durante anos;

- Não quero voltar ao ginásio. Não sou feliz no ginásio, não gosto do ginásio e é irrealista pôr isso na minha lista. Mas este ano gostava de encontrar alguma coisa de que gostasse - ou, pelo menos, que não fosse um sacrifício de todos os tamanhos. Não tem de ser algo que me deixe como a Carolina Patrocínio - basta algo que me permita não virar lontra e, já agora, não ganhar os 5kgs que pretendo perder em 2020;

- Escrever, pelo menos, dois posts por semana aqui no blog. Isto seria muito, muito, muito importante para mim, pois sinto uma pressão e um arrependimento enorme quando não escrevo. Duas vezes por semana é o mínimo dos mínimos para quem tinha o objetivo de escrever todos os dias;

- Alimentar o blog das receitas duas vezes por mês. Com a minha nova faceta de "dona de casa", cozinhar acabou por ser um escape; escrever novas receitas é sinónimo de que estou a inovar e de que estou na cozinha por gosto, o que é algo que quero que se mantenha;

- Tornar a vida entre as minhas "duas casas" o mais suave possível, atenuando todas as lombas e solavancos que fui sentindo - e que tanto me martirizaram - ao longo do ano que passou;

- Fazer o álbum de fotos do best of de 2019 e acabar o da minha viagem do Japão;

- Manter a minha lista de trackers atualizada - sou um bocadinho baldas no que toca à minha lista de "do's" e "do not's"  gostava de conseguir completar tudo durante um mês, sem dias de falha;

- Assinar a revista Prima e não empilhar edições para as ler de rajada no Verão;

- Voltar a fazer uma viagem a dois com o meu namorado, mesmo que seja só uma escapadinha de fim-de-semana;

- Continuar a conhecer terras deste nosso maravilhoso e lindo Portugal;

- E, mais uma vez, ser constantemente mais positiva. Tentar ser feliz todos os dias. Fazer um balanço diário do meu dia e perceber a sorte que tenho, mesmo nos dias piores. 

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