Uma ode ao trabalho que nos faz feliz [e aos obstáculos que saltamos]
Já na faculdade me acontecia disto: encalhava num trabalho qualquer e, na minha cabeça, aquilo nunca mais ia aparecer feito. As coisas não saíam, eu não conseguia escrever o que quer que fosse, tudo me começava a parecer o apocalipse, o tempo a encurtar, os prazos a aproximarem-se e eu cheia de páginas em branco. Lembro-me que num trabalho de introdução a direito só queria desistir - acabei por fazer o dito quase por milagre e empurrada pela minha mãe e por um amigo que me conseguiram tirar daquele poço sem fundo.
Com o relatório de estágio foi o mesmo drama. As coisas não saíam, era algo que tinha mesmo de ser feito e essencial para refletir um estágio que, na prática, tinha corrido super bem, mas as coisas no papel não estavam a fluir. Andei a bater com a cabeça nas paredes durante tempos a fio e depois escrevi aquelas trinta páginas de uma só assentada, pela noite dentro e com as olheiras a ocuparem-me metade da cara.
Não vejo esses dramas como períodos de desinspiração, que também os tenho - aliás, só agora é que estou a refletir no facto de ter um trabalho que inclui alguma criatividade e de existirem dias em que, de facto, não estou inspirada e ter de saber ultrapassar isso. No entanto, nestes casos, acho que o meu problema é sempre não ter uma linha de raciocínio que me ajude a estruturar o pensamento: no trabalho de direito não tinha grande matéria, no relatório tinha uma estrutura obrigatória que me estava a toldar o juízo e que, na minha cabeça, não fazia qualquer sentido. O problema não era a própria escrita, mas como, onde e o porquê de escrever.
E há dias vi-me a mãos com a primeira situação do género no trabalho. Senti a batata quente a arder-me nas mãos e não conseguia desenvencilhar-me daquilo. Mais uma vez, não estava a conseguir ter a estrutura mental do texto e, por isso, não o conseguia passar para o papel. Mas aqui não podia ir a exame; não podia desistir; não há a questão de reprovar e fazer no próximo semestre. Ou é ou é, porque o nosso trabalho depende disso e se há coisa que com que eu lido mal é em defraudar as expectativas dos outros - e se me tinham dado aquele texto, importante e imponente, foi porque acreditaram que eu o conseguia fazer.
Mais uma vez, foi escrito mesmo à queima e pela noite dentro. No dia anterior tinha-me deitado às 22h: naquele dia deitei-me às 3 da manhã, para na manhã seguinte estar a pé às 7 e seguir para o trabalho. Custou, mas foi aí que percebi que sou mesmo sortuda e uma mulher feliz. Porque escrever é aquilo que adoro fazer, mesmo em períodos desinspirados, e se sentir que conseguimos concretizar algo que à partida não nos parecia fácil é, só por si, uma vitória gigante, sentirmo-nos concretizados é uma conquista ainda maior.