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Entre Parêntesis

Tudo o que não digo em voz alta e mais umas tantas coisas.

10
Ago16

A cidade dos palácios mais bonitos do mundo e dos contrastes [São Petersburgo, Rússia]

Estou de volta com o meu diário de bordo! Depois de uma pausa para eu e vocês recuperarmos energias, trago-vos o maior texto desta viagem - que, como não poderia deixar de ser, se dedica à Rússia. Este é mais do que um texto sobre os monumentos da cidade, mas também da forma como vi um país que ainda vive (e impinge aos outros) uma grande repressão, o que sem dúvida tornou esta paragem muito mais interessante. O texto é grande por ter todas essas minhas reflexões e por termos estado dois dias na cidade, o que deu para ver e explorar mais São Petersburgo do que qualquer outra das cidades onde parámos.

 

São Petersburgo era, provavelmente, a cidade que mais curiosidade tinha para ver, muito pela mística que a Rússia ainda hoje tem. Acho que quando me perguntam qual foi a minha cidade favorita neste cruzeiro, todos esperam que eu diga que foi esta cidade - e não foi, acima de tudo porque eu gosto de cidades coerentes. São Petersburgo não é coerente - é lindo e riquíssimo de um lado, e horrível e paupérrimo de outro. E não é preciso andar muito para se verem tais contrastes. 

Para além disso, uma cidade também é feita de pessoas. E a visão geral que todos temos dos russos correspondeu (pelo menos para mim) à realidade: são pessoas chateadas com o mundo, mal humoradas, mal encaradas e muito pouco simpáticas. 

 

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 Rio Neva

 

 

Poderia dizer que ainda há pela Rússia muitos resquícios da União Soviética, mas a verdade é que são muito mais que resquícios: é uma presença muito pesada, que vive não só nos edifícios da cidade, como na cultura e nas pessoas de uma forma geral. Os prédios (os que não são palácios e se encontram fora do centro da cidade) são horríveis, estilo bairros sociais sem qualquer tipo de manutenção; são edifícios sem acabamentos ou pinturas, só cimento, pelo que estão literalmente comidos pelo tempo. São todos iguais: do mesmo estilo, com as mesmas janelas, as mesmas portas. As montras não têm cor e são muito pouco trabalhadas, com um chamamento muito rudimentar, penso que por aquela economia ainda não estar habituada a ter um mercado concorrencial em vez de ser tudo planificado. Os passeios, em muitos sítios, são muito maiores do que o normal (acima do padrão aqui em Portugal) e dão a sensação de estarem sempre vazios: as poucas pessoas que lá andam são tão cabisbaixas e tristes, com um semblante sempre tão carregado, que todo este cenário me lembrou os vários textos que já li sobre a Coreia do Norte. Em reflexões posteriores, dei por mim a pensar que praticamente não vi crianças e jovens.

Por outro lado, a segurança continua apertada. Logo ao passar na imigração temos um vislumbre do que era a URSS antes de cair o muro. Entramos num cubículo com espelhos a toda a volta, entregamos o nosso passaporte, cartão do barco e bilhete da excursão e ficamos assim durante um par de minutos, sem qualquer troca de palavras. Os senhores que lá trabalham olham para nós com ar ameaçador, com os olhos entre o nosso passaporte, nós e o computador que têm à frente e, quando se dão por satisfeitos, carimbam-nos o passaporte e atiram-no sem dizer o que quer que seja. É giro ignorar o barulho de fundo e concentrarmo-nos no som dos carimbos a bater nos passaportes, algo que imagino ser super característico nos períodos ditatoriais. E na Rússia o poder do carimbo ainda está vivo e isso sente-se na forma como eles nos tratam, como quem diz "tenho o poder de te deixar entrar na palma das minhas mãos".

Para além disso, a vigia é constante. A nossa guia não nos perdia de vista e passava a vida a contar-nos (eu já quase sabia contar em russo!). Nos palácios, por cada sala que se podia visitar (e, acreditem, eram muitas!), estava uma mulher a olhar para nós e a certificar-se que cumpríamos as regras: normalmente tínhamos sempre de usar "pantufas" nos pés e não podíamos levar kispos e mochilas connosco. Noutros não podíamos mexer nos telemóveis ou tirar fotografias. As regras eram variadas e havia sempre alguém disposto a faze-las cumprir.

Mais uma vez, eu e os meus pais optamos por fazer uma excursão: neste caso não tínhamos mesmo outra hipótese, porque não pedimos visto para andar livremente. Visitar a Rússia em cruzeiros tem essa enorme vantagem: comprando visitas guiadas, não temos de ter visto, pelo que é muito mais fácil entrar no país. Por isso, neste destino, a grande parte dos passageiros do barco saíram em excursões.

A nossa primeira paragem foi o palácio Peterhof, a uma hora de São Petersburgo. É um palácio lindo, gigante, difícil de transpor em palavras. É conhecido pelas suas inúmeras fontes e esguichos de água, usados pelo Peter, The Great para fazer partidas aos seus convidados e vê-los todos molhados sempre que este decidia organizar uma festa ou um banquete. Infelizmente não era possível tirar fotos no interior do palácio, por isso só posso mostrar-vos o exterior. Posso, no entanto, dizer-vos que há ouro por todo o lado e um bom gosto inegável por parte dos czars que lá viviam. Cada cidade tem as suas coisas maravilhosas, mas é difícil não relativizarmos: Serralves, ao lado deste palácio, é um autêntico canteiro. A quantidade de fontes, os jardins, as estátuas talhadas a ouro, para não falar do interior do palácio, com interiores incríveis e cheias de histórias para contar. A Rússia, goste-se ou não, tem uma história interessantíssima, e também por isto ter uma guia (ainda que com um sotaque cerradíssimo) tornou a visita ainda mais valiosa.

 

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Nos jardins do Peterhof

 

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Nos jardins do Peterhof

 

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Peterhof

 

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Peterhof

 

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 Algumas das fontes do Peterhof

 

Depois almoçamos num restaurante enorme, na rua principal de São Petersburgo. A comida não era boa, mas conseguia-se comer (o mesmo não se pode dizer do dia seguinte). Destaque para o vodka e o caviar, servido desde o início da refeição, e para o gelado de baunilha, oferecido no fim. Nos dois dias que lá comemos, foi a única coisa que se aproveitou (não posso confirmar a qualidade do vodka, mas o meu pai disse que era bom).

A parte da tarde do primeiro dia foi, para mim, a pior parte desta visita à Rússia. Visitamos o maior museu do mundo, o Hermitage. Eu não sou fã de museus de arte - dou todo o crédito do mundo a quem faz aquele tipo de obras, dignas de deuses muitas vezes, mas sou incapaz de gostar de passar horas a olhar para telas ou esculturas. O cansaço que já sentia na altura e as milhares de pessoas que estavam lá dentro - e a consequente falta de oxigénio - não ajudaram à festa, pelo que foi a parte que menos desfrutei na Rússia.  Para além disso, este museu é tão grande que na hora e meia que lá estivemos não deu para ver absolutamente nada; foi só mesmo para picar o passe e dizer "eu estive no Hermitage!". Segundo a nossa guia, se parássemos dez minutos para apreciar cada peça, precisávamos de mais de mais de três anos (sem paragens) para visitar o museu. Não é definitivamente para mim. No espólio do museu encontram-se dois quadros de Leonardo DaVinci, uma coleção gigante de Remembrant e os ovos de Febargé, que não vimos.

 

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Da Vinci, no Hermitage

 

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Corredor no Hermitage, uma cópia fiel de um que existe no Vaticano e onde é contada em imagens a história da Bíblia Sagrada

 

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Uma sala do Hermitage

 

O segundo dia começou muito cedo - às 7.15h locais (5.15h de Portugal) já estávamos a arrancar para o Catherine's Palace, onde tem o tão famoso quarto de âmbar. Fomos muito cedo para sermos dos primeiros a entrar no palácio, o que facilitou imenso a visita e a tornou muito mais proveitosa. Estes sítios recebem milhares de pessoas por dia e chega-se a um ponto em que a multidão é tanta que já não conseguimos ver um palmo de espaço livre em frente dos nossos olhos. O palácio é do mais luxuoso que possam imaginar, com ouro por todo o lado e os pormenores mais pequenos e perfeitos que já vi. O quarto de âmbar, no meio de tudo aquilo, nem me deslumbrou muito. Para além do palácio em si, o que adorei mais foram os jardins, não tão luxuosos e trabalhados como o do Peterhof, mas com uma beleza natural e genuína que adorei. Na altura em que os visitamos estavam fechados para visitas a público em geral, pelo que pude tirar fotos à vontade. As histórias envolvendo o Peter, The Great e a Catherine, The Greatest são imensas e a cada canto há uma para contar; a nossa guia sabia imenso, o que tornou tudo muito mais real e fascinante, com direito a algumas gargalhadas pelo meio, dada a excentricidade desses czars.

 

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À entrada do palácio, onde uma banda tocava, cantava e dançava

 

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Fachada do palácio

 

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Dentro do palácio (reparem no ouro e na enorme pintura no teto)

 

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Uma pequeníssima parte dos jardins

 

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Uma casa de chá dentro do palácio, onde ouvimos um mini-concerto à capella

 

 Da parte da tarde andamos pela cidade de autocarro a fazer vários photo-stops, vendo por fora mais locais emblemáticos ou com vistas privilegiadas da cidade. Parámos na Saint Isaac Cathedral, nas margens do rio Neva e, claro, a Church of Resurrection on the Spilled Blood, que para mim é de todos os edifícios, o mais bonito que vi. Fizemos também uma breve visita ao forte da cidade, que tem no seu interior a Peter and Paul's Cathedral, onde estão os túmulos dos mais importantes czars da Rússia.

 

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Church of Resurrection on the Spilled Blood

 

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Church of Resurrection on the Spilled Blood

 

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Nas margens do Rio Neva

 

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Nas margens do Rio Neva (e com um vento incrível)

 

 O fim da viagem foi uma paragem para compras. Nas outras tours isso significa ter carta verde para, durante um determinado período de tempo, andarmos sozinhos para comprar souvernirs numa zona da cidade: na Rússia, e como está tudo controlado, deixaram-nos numa loja enorme e disseram "comprem". Não havia muito para além de matrioskas, imitações dos ovos de Fabergé, peças em âmbar, artigos em pele e canecas e t-shirts com a cara do Putin. 

 

Esta foi sem dúvida a paragem mais cansativa de todo o cruzeiro, principalmente porque foram dois dias a andar muito e a acordar muito cedo. No entanto, posso garantir que vale muito a pena, não só pela beleza incrível dos edifícios como pelo choque de culturas - é quase uma viagem na história, ainda dá para sentir o cheiro da União Soviética no ar. Um conselho para futuros visitantes: as visitas guiadas, apesar de terem sempre rédea curta, parecem-me sem dúvida a melhor opção. Primeiro porque podem conhecer um pouco da história dos czars e as suas mil e uma peripécias e segundo porque a cidade é enorme e os principais monumentos estão longe do centro, sendo quase impraticável andar de um lado para o outro sozinho, ainda por cima num país onde as pessoas pouco falam inglês e não se prestam a grandes ajudas.

 

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 Uma série de pormenores captados ao longo dos dois dias na Rússia

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