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Entre Parêntesis

Tudo o que não digo em voz alta e mais umas tantas coisas.

28
Jan16

Ao fim de uma causa (há muito) perdida

Os 20's são a altura perfeita para lutar por causas perdidas. Temos uma convicção inabalável, uma esperança inquebrável e uma ingenuidade típica que nos deixa acreditar que podemos mudar o mundo.

Isto pode ser bom ou mau. É bom porque, por um lado, há mesmo ideias e convicções que mudam o mundo - e, como diz o ditado, "dos fracos não reza a história", por isso há que lutar para conseguir o que queremos. Por outro lado, podemos ser um chatos sem fim, sem conseguirmos mudar a opinião de uma só pessoa, quando mais do mundo inteiro. 

Aprendi que as nossas convicções, ainda que pouco apoiadas, podem estar tão certas como as outras. Porque as dos outros, para eles, também estão corretas. E, aqui, não se trata ou não de respeitar ou não as convicções dos outros: trata-se de tentar muda-las. O que, pelo que tenho visto, é das coisas mais difíceis de fazer acontecer - principalmente quando as do outros são precisamente opostas às nossas. Até porque, tal como nós, todas as pessoas têm razões para acreditarem no que acreditam. 

Desconfio que crescer é também perceber que, às vezes, não vale a pena. São lutas sem fim, discussões acesas que acabam com o coração na boca e o cérebro e a racionalidade metidos num bolso. É, infelizmente, ter de aceitar que aquilo em que acreditamos piamente, com todas as células do nosso corpo, não é necessariamente aquilo em que os outros acreditam. E termos de engolir esse sapo, porque a vida é mesmo assim. Alias, crescer é mesmo assim: é, por vezes, perceber que as nossas "causa perdidas" são, efetivamente, perdidas e que não há nada a fazer para mudar isso. 

Por estes dias, relativamente a algo que sempre foi uma das minhas "causas perdidas" e que me mexe sinceramente com o íntimo, percebi que não valia a pena continuar a lutar. Pus um fim em todas as minhas discussões, dramas e opiniões alheias e é assim que pretendo que continue daqui em diante; ficarei tão calada como nunca me viram, porque desisti. E é nestes dias que percebemos que crescemos e, ao mesmo tempo, também morremos um bocadinho. Matam-nos a esperança, tão característica da raça dos mais novos. Até que, eventualmente, acabaremos tão iguais e tão adultos como todos os outros. Limpos de causas perdidas e esperança.

26
Jan16

Bom dia!

Acordar com as galinhas, vestir a camisola mais quente que tenho no armário, pôr um bocado de cor nas bochechas para fintar o ar de morta-viva, dar um jeito no cabelo, pegar na mochila com a máquina fotográfica e seguir para a lota para comprar o melhor peixe que há, logo com a praia ali ao lado.

Foi assim que comecei um longo dia de estudo, com o ar gélido a entrar por mim adentro e o cheiro a maresia a entranhar-se em mim. Tem tudo para correr bem.

 

DSC_0303.JPG

 

25
Jan16

Os gatos sem pêlo

Lembro-me bem de, há uns bons anos, me terem falado dos "gatos sem pêlo". Fui pesquisar  no Google e, como 95% da população, fiz cara de poucos amigos para aqueles gatos tão pouco convencionais. Passei assim uns bons anos, a torcer o nariz sempre que me falavam desses bichos (que não eram muitas vezes, diga-se).

Entretanto, a Margarida (um beijinho!) adotou um e, lentamente, eu fui mudando a minha opinião. Lembro-me de ela ter feito um post em que dizia que ia adotar um bichano destes e eu até ter dito, muito sinceramente, que não achava a mínima piada. Mas depois, ao ir vendo fotos e mais fotos que ela ia partilhando, acabei por ficar encantada. É caso para dizer: "primeiro estranha-se, depois entranha-se". Parecem ser gatos super dóceis e dados aos donos, brincalhões quando têm de ser; e têm os bebés mais fofos de todo o sempre! Tudo aquilo que via de mau nos gatos, passou a ser bom: já não me parecem ratos sem pêlo, as ruguinhas no focinho já não me fazem impressão, a suposta falta de pêlo também não me aflige. Apaixonei-me mesmo por estes eles - infelizmente o mesmo não se pode dizer da minha família, que contínua com os olhos inadaptados para a beleza destes gatos.

De qualquer das formas, para já, eles não têm com que se preocupar: neste momento não quero ter mais animais e tenho sempre muito medo que os meus cães façam mal aos gatos; mas um dia, mesmo que seja longuínquo e que ainda demore algum tempo a lá chegar, posso garantir que o próximo gato que tiver vai ser um Sphynx. Podem acha-los feios, uns ratos, uns abortos... o que quiserem. Eu cá acho-os lindos e fofos, com a vantagem que não têm tanto pêlo para largar e me fazer alergias. Melhor é impossível.

Um dia há de ser o dia.

 

sphynx-cat-08.jpg

24
Jan16

Eu não queria Marcelo a presidente

Na verdade, o que eu quero dizer é que não queria sequer que Marcelo Rebelo de Sousa se candidatasse - porque sabia que, mal ele o fizesse, ganharia as eleições num clique. Não por não gostar dele - aliás, pelo contrário.

Passei muitos anos a vê-lo na televisão. Os domingos à noite eram reservados para o meu pai ouvir o "professor veneno", como era "carinhosamente" apelidado cá em casa. No início, não gostava - que criança é que gosta de ouvir falar de política e de coisas que não percebe à hora de jantar? - mas, com o passar dos anos, comecei a apreciar as suas opiniões. Em parte, claro, porque também me identificava com o quadrante político a que ele pertence (não é segredo que eu caio muito mais para a direita do que para a esquerda, pois não?); mas também porque as achava pertinentes e incicivas, verdades ditas muitas vezes na altura certa. Mas, acima de tudo, porque por detrás daquela capa, via alguém com imenso sentido de humor, com energia e boa disposição; alguém sem aquela carga meio pesada típica das pessoas metidas na política. Alguém com quem, sinceramente, gostaria de conversar e privar, por achar que é alguém extremamente interessante. 

No último ano as coisas mudaram bastante; deixei de gostar de o ouvir. Não mudei a minha opinião enquanto à pessoa que ele me parece ser, mas as opiniões suavizaram-se muito e percebi que já estava a construir a sua cama para o cargo que pretendia vir a ascender. Eram paninhos quentes a mais; as opiniões fortes ficaram para o passado, os possíveis comentários mais negativos passaram a ser mais neutros. Como comentador, deixou de ter a autenticidade que apreciava nele e isso chateou-me.

Ainda assim, não deixo de ver nele as características que antes apreciava. E tenho pena que ele vá ser eleito, porque acho que um Presidente da República tem de corresponder a certos requisitos e ter uma postura que vai fazer com que essas características de Marcelo não se enalteçam - pelo contrário, que se escondam ainda mais. Acredito que, em relação a Cavaco Silva, vá ser um PR mais informal, mais light e bem-disposto - mas acho que há piadas que depois não se podem fazer, posturas que não se devem ter, coisas que não se podem dizer. Há toda uma carga formal que este cargo traz que, independentemente da pessoa que o representa, tem sempre de ser suportado.

Não sei o que vamos ganhar em relação a um PR, mas sei que vamos perder um bom comentador, um bom professor universitário e, creio, alguém que já não vai poder demonstrar o seu bom sentido de humor e disposição a torto e a direito. É uma pena.

 

Adenda: com medo de ser mal interpretada, não quero com este texto dizer que Marcelo não será um bom presidente - pelo contrário. Também não quero dizer que não votei nele. Quero, simplesmente, afirmar que tenho pena que ele tenha preferido ser Presidente da Républica em detrimento de toda uma outra vida (pessoal e profissional) que tinha e que me parecia bem melhor do que aquela que ele vai ter a partir de Março deste ano. 

23
Jan16

O que tem de ser, tem de ser

Já fez um ano que a minha avó faleceu. Não assinalei a data aqui no blog porque, na altura, não me sentava ao computador e escrever não era tarefa fácil. Lembrei aquele dia acendendo-lhe duas velas (como, de resto, faço muitas vezes), usando o último anel que ela me deu (que também uso muitas vezes) e indo à missa em que o seu nome foi invocado (o que, ao contrário das outras duas coisas, nunca faço). 

Não foi um dia mais especial que os outros, porque lembro-me dela mesmo muitas vezes. Acendo muitas vezes as tais velas que tenho ao lado de uma foto dela, muito novinha, onde parecia uma autêntica modelo. Há dias em que a sinto comigo e há outros em que a quero comigo - nesses (e são muitos), ligo as velas e uso coisas que ela me deu, para a sentir um pouquinho mais perto de mim. Só não levei o último anel que ela me deu para a cirurgia porque sabia que não podia entrar com nada no bloco - senão, por entre todas as peças e amuletos que tenho, este seria sem dúvida o que vinha comigo.

Ao longo deste ano lembrei-me muito dela e tenho pena que ela não saiba disso; acho que, em vida, não lhe trasmiti todo o amor e carinho que sentia por ela. Na verdade, acho que também só o descobri na totalidade quando ela desapareceu - o que é triste, mas é assim. Nos últimos dias do ano, enquanto batalhava comigo própria e tentava decidir se faria a cirurgia logo no início do ano ou me mantinha no plano original de só a fazer em Fevereiro (e aguentar as dores até lá), lembrei-me muito de algo que ela me dizia, sempre que eu tinha crises de pânico à custa dos médicos. Dizia-me: "nisso não sais nada a mim! Eu sempre enfrentei tudo sem medo: o que tem de ser, tem de ser!" Afirmava sempre isto com ar determinado e peito cheio, com uma mão cheia de experiências que o comprovavam: a cirurgia ao coração (de peito aberto), a cirurgia à anca, ter tido os filhos sozinha em casa.

Foi também nela que pensei quando, no último dia do ano, tomei a decisão de ser operada e, uma semana mais tarde, quando ia a caminho do bloco, de olhos fechados e as mãos juntas ao peito. Quis ser corajosa como ela sempre fora. E sei que hoje, ao lado daquela velinha bem cheirosa que lhe comprei, ela está orgulhosa de mim. Porque "o que tem de ser, tem de ser".

 

960401 NiNosAvósCAvóCarolina (6).jpg

23
Jan16

Com calma

É uma merda quando o nosso corpo não evoluí ou, neste caso, recupera, da forma que nós queríamos. E também é uma merda saber que temos coisas para fazer - e outras que não temos, mas gostávamos - e não nos sentirmos totalmente capazes de o fazer. Não quer dizer que não consigamos, mas dói. Ou chateia. Ou incomoda. Ou fica dorido. E a sensação com que ficamos é a de tentar não repetir. 

Desde segunda que tentei fazer a minha vida normal. Fui ao cabeleireiro, voltei a conduzir, voltei ao curso de fotografia. Fiquei sempre cansada rapidamente, mas só no curso é que me apercebi do quão limitada ainda estava. Depois de três horas sentada, desta vez sem intervalo, a assistir a uma aula muito pormenorizada e a um ritmo demasiado lento, fiquei mesmo muito dorida. Com dores. E extenuada e irritada, tanto por aquilo ainda estar a acontecer como por uma provável quebra de açúcar que me deixou com o humor a níveis negativos. Saí dali derrotada e a saber que tinha de olhar para a agenda, porque as coisas estavam a apertar. Trabalhos para entregar, exames ao virar da esquina (mesmo deixando um para a época de Setembro), coisas por fazer. Pouco tempo, muita coisa e um corpo ainda-não-muito-funcional.

E daí comecei a stressar, porque comecei a ver que algumas coisas iam ser deixadas por fazer: e essa sensação é das piores que tenho - não fazer aquilo com que me tinha comprometido. Foi, aliás, a razão de um sofrimento paralelo enquanto estive em repouso (quase) absoluto: saber que tinha trabalhos para entregar, que não pude completar, deixando uma sobrecarga para todos os meus colegas dos vários grupos que tinha. Eu não sou nem nunca fui a lapa de serviço; sempre fui a que me chateava por os outros não entregaram as suas partes, por o fazerem mal e porcamente ou as entregarem umas horas antes do prazo final; sempre fui aquela que tinha ideias, que ajudava, que impulsionava. E desta vez tive que ser a que não fez, a que deixou para os outros; quis acreditar até à última que ia recuperar o suficiente para, ainda a tempo, fazer algo - mas enganei-me redondamente. E isso, mesmo sabendo que a culpa não é minha e que a saúde vem primeiro, trouxe-me um peso na consciência enorme.

Agora que já me sentia melhor (ou a minha cabeça já me dizia "yey! 'tás boa, faz-te ao trabalho, há um mundo de coisas para fazer!"), senti que o corpo me dizia para abrandar, porque ainda não era hora de levar esta empreitada avante, pelo menos com a envergadura que tinha em mente. Comecei também a ter dores num sítio na cicatriz e todo o medo de algo ter corrido mal e de me ter de submeter a mais alguma coisa tornou a esmagar parte de mim. Queria muito despachar isto, ficar só com uma cadeira por fazer (a tal que vou deixar para Setembro) e tirar boas notas nas restantes; ter um bom trabalho final a fotografia; arrumar e mudar algumas coisas neste quarto; desfrutar de novo da minha liberdade. Mas a dissonância entre o meu corpo e a minha cabeça, a juntar ao medo assoberbado criado pelos macaquinhos da minha mente, fizeram com que caísse.

Voltei à base, ao descanso, à televisão e aos livros por mais um bocadinho. Estou a tentar não dar passos maiores do que a minha perna. 'Bora com calma.

19
Jan16

(Des)Igualdade?

Não percebo, muito sinceramente, qual é o fundamento de toda esta polémica sobre não haver atores pretos nomeados para os Óscares. Se, este ano, não houve filmes onde atores pretos estivessem à altura de um Óscar, porquê que haviam de ser nomeados? Só porque sim, para inglês ver? Só para apregoar a uma igualdade que, de tão obstinada, passa a ser desigualdade?

Acho que é óbvio que há mais atores brancos do que pretos, pelo menos no que diz respeito à ribalta de Hollywood que anda por aquelas andanças. É, por isso, mais provável que a "sorte" calhe a mais brancos do que pretos. Ainda assim, só nos últimos anos, lembro-me bem de várias pessoas de pele negra a receber estes prémios: Morgan Freeman, Lupita Nyongo, Octavia Spencer, Mo'Nique, Jennifer Hudson, Halle Berry, Jamie Fox, Denzel Washington. E só estou a citar vencedores, porque nomeados houve ainda mais. 

Querem fazer isto como na política, em que em vários campos é obrigatório uma percentagem obrigatória de mulheres? Vamos ter de ter sempre nomeados pretos, mesmo que tenham interpretações de treta (ou que tenham participado em filmes de treta, porque muitas vezes trata-se mais disso do que outra coisa), só porque fica bem? 

Não me parece que a Academia tenha uma mentalidade atrasada neste aspeto - aliás, como se pode ver consultando a lista de nomeados e vencedores. A igualdade, para mim, é isto: é este ano poderem ser só nomeados brancos e para o ano serem só nomeados pretos - e também, como de costume, haver uma mistura. Não vejo mal nenhum nisso. Vejo é mal no facto de terem tornado isto numa celeuma, de indiretamente quererem impor que haja uma "quota obrigatória" de atores e atrizes negros nomeados para estes prémios, em nome de uma "igualdade" que não percebo. 

18
Jan16

Um novo corte para uma nova fase

Nos últimos dias desta minha "prisão", não conseguia parar de pensar no quanto queria cortar o cabelo. Aquilo que era só uma mera ideia há um mês atrás tornou-se uma necessidade. Precisava de mudar, de estabelecer um fim num capítulo menos positivo e assinala-lo de alguma forma. Já não é a primeira vez que o faço e as mudanças no cabelo sempre me souberam pela vida.

O meu cabelo, apesar de longo, estava como eu: resignado àquilo, "preso" por circunstâncias (e vontades) que lhe eram externas, sem forma, sem grande vida, sem personalidade. E enquanto estava deitada no sofá durante todas as horas do dia, pensava muitas vezes em como queria mudar, em como queria tanto que isto acabasse e de o assinalar de alguma forma.

Foi por isso que, mal me vi sem os pontos e vi que me conseguia sentar (ainda que por tempo limitado), liguei para o cabeleireiro e marquei para dali a duas horas. Sabia exatamente o que queria - tinha visto, ao longo dos últimos dias, centenas de penteados curtos e tirado ideias dos meus preferidos; gravei imagens no telemóvel, ponderei o que me ficaria melhor. E, quando lá cheguei, disse exatamente o que queria, com todos os detalhes, e mostrei imagens de tudo: de como queria a parte de trás, de como queria a repa, de como queria o ondulado. E mesmo antes de o secar e ver o resultado final, percebi que tinha ficado exatamente como queria. Perfeito.

Pode parecer fútil ou parvo o facto de a primeira coisa que eu fiz mal pus os pés de casa foi ter ido a um cabeleireiro, mas eu não o vejo como tal. Vejo-o como uma marcação de um novo início e de algo que já queria há algum tempo. Uma lufada de ar fresco. Arriscar, sentir aquela adrenalina do corte. Sentir-me viva e bonita como já não sentia há meses. Porque um corte pode não ser (e não é, no meu caso) só um corte; a imagem importa, a auto-estima importa e sentirmo-nos bem connosco mesmos também importa - e muito!

Sinto-me pronta para o que aí vem. Que esta fase seja tão fresca, vibrante e com tanta personalidade como o corte do meu cabelo. Devo admitir que estou ligeiramente apaixonada por esta cortadela. 

 

DSC_0044.JPGDSC_0055.JPG

 

 

(para quem não estava a par, há dois meses, estava assim - ontem já estava, portanto, um bocadito maior:)

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18
Jan16

Liberdade, liberdade, liberdade!

Acabei de vir agora do hospital, sem pontos. Já foram os da perna e já foram os do cóccix - neste fim-de-semana, este últimos já me estavam a incomodar seriamente. Eram pontos muitos grossos, tipo arame, e a maior parte do corte já estava altamente cicatrizado e os pontos a incorporarem-se na carne (não sei explicar melhor isto) - isto fazia com que o mínimo movimento me doesse, em toda a cicatriz. Para além disso, já estava a ficar cansada e sem paciência para esta prisão domiciliária - por um lado tinha aquelas dores, mas por outro já me sentia melhor e sabia que a cicatrização estava a correr lindamente. A impaciência estava a matar-me.

Escrevo-vos sentada, pela primeira vez, desde há quase um mês. Ainda não me sento normalmente, ainda um bocadinho de lado, mas ao menos já me sento. Não sabia que se podia ter tantas saudades de um simples movimento como sentar. Não fazemos ideia de quanto o rabo nos faz jeito, não só para sentar mas para todo um outro mundo de coisas que fazemos no dia-a-dia e nem notamos. Baixarmo-nos, apanhar coisas, esticarmo-nos, deitarmo-nos. Enfim. 

Ainda não estou totalmente livre, porque a cicatrização não está completa e tenho de continuar com o penso. Mas, fora isso, a minha vida pode ir voltando normalmente ao normal. Só o facto de já me poder sentar ajuda-me tanto, tanto, tanto a reaver a minha vida! Poder estudar, trabalhar, escrever aqui, conduzir, escrever postais, andar de carro de uma forma geral (era das coisas que mais me custava, devido aos solavancos). E, claro, poder voltar a sair de casa. Quero ir ao cabeleireiro e cuidar de mim (passar 15 dias de pijama mata um bocadinho a nossa auto-estima), quero ir à praia ver o mar, quero tirar fotos, quero acabar o meu curso de fotografia, quero ir jantar fora, quero cozinhar, quero pôr os exames para trás das costas, quero ir ao cinema, quero ir às compras. No fundo, só quero viver. Fora deste sofá.

Apesar de ainda não totalmente curada, sinto que hoje se fechou mais um capítulo para mim. Daqueles difíceis, mesmo difíceis. Só eu sei (e talvez alguém com paranóias semelhantes às minhas) a prova de superação que isto foi para mim. Uma cirurgia, anestesia geral, ter pontos, um dia de internamento, fazer análises, ter um catéter direto para a veia, fazer o penso umas duas vezes por dia, só sair de casa para ir ao hospital, tirar os pontos. Uau. Uau. Uau. Sinto apenas um misto de alívio, superação e, neste momento, liberdade. 

Hoje, enquanto vinha para casa depois de sair do hospital, chorei. Por sentir que o martírio acabou. Nesse momento, e por coincidência, o Jamie Cullum cantava na rádio (algo raro, o que ainda me soube melhor). Deu-me ainda mais a sensação de um novo início.

O meu ano começa agora. Mais livre, mais feliz e com mais vontade de viver. Sobrevivi (ufa!).

16
Jan16

Chávena de Letras - "Fangirl"

1507-1.jpg

 Este livro provocou em mim uma sensação que nunca tinha tido antes, pelo menos em tão grande escala: uma identificação profunda com a personagem principal. Ridiculamente profunda, ao ponto de ter apertos no estômago quando sabia que a Cath ia ter dores no estômago e sofrer por ela. A tal ponto de ter de o acabar rapidamente par, às vezes, acabar com o meu próprio sofrimento.

A inadaptação à vida universitária e a todo aquele modo de vida que apregoam; a preocupação constante com a família; a isolação, o medo do ridículo, o medo de avançar; a obsessão com uma saga de livros e, claro!, a escrita.
Se há coisas menos perfeitas neste livro? Há, claro. Há cenas que atrasam o ritmo de leitura e há, acima de tudo, demasiadas transcrições da fanfiction que Cath escreve, algo sempre dispensável - primeiro porque não sabemos o suficiente daquela saga para a acompanhar e perceber decentemente e segundo porque não acrescenta nada à história. (Admito que passei um desses trechos à frente.) Mas, de resto, tudo me soube a perfeição: o ritmo, a escrita, as personagens e, claro, a história. Como eu gostei da história!
Comparado com o anterior livro que li de Rainbow Rowell, "Eleanor&Park", este foi muito, muito melhor e ultrapassou todas as expectativas. Não vi aquilo que o primeiro livro tinha de especial, não obstante todos os fãs apaixonados que essa obra tem; neste, no entanto, passou-se exatamente o contrário. E acho sinceramente que apaixonarmo-nos por um ou outro livro vai muito com a experiência de vida de cada um. Eu senti este livro quase como meu, uma extensão de mim ou do que faria se estivesse na pele de Cath. Adorei-o. E só tenho pena que já tenha acabado.
(e sim, neste momento, como diriam os americanos, "I'm fangirling. Hard!")

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