O que tem de ser, tem de ser
Já fez um ano que a minha avó faleceu. Não assinalei a data aqui no blog porque, na altura, não me sentava ao computador e escrever não era tarefa fácil. Lembrei aquele dia acendendo-lhe duas velas (como, de resto, faço muitas vezes), usando o último anel que ela me deu (que também uso muitas vezes) e indo à missa em que o seu nome foi invocado (o que, ao contrário das outras duas coisas, nunca faço).
Não foi um dia mais especial que os outros, porque lembro-me dela mesmo muitas vezes. Acendo muitas vezes as tais velas que tenho ao lado de uma foto dela, muito novinha, onde parecia uma autêntica modelo. Há dias em que a sinto comigo e há outros em que a quero comigo - nesses (e são muitos), ligo as velas e uso coisas que ela me deu, para a sentir um pouquinho mais perto de mim. Só não levei o último anel que ela me deu para a cirurgia porque sabia que não podia entrar com nada no bloco - senão, por entre todas as peças e amuletos que tenho, este seria sem dúvida o que vinha comigo.
Ao longo deste ano lembrei-me muito dela e tenho pena que ela não saiba disso; acho que, em vida, não lhe trasmiti todo o amor e carinho que sentia por ela. Na verdade, acho que também só o descobri na totalidade quando ela desapareceu - o que é triste, mas é assim. Nos últimos dias do ano, enquanto batalhava comigo própria e tentava decidir se faria a cirurgia logo no início do ano ou me mantinha no plano original de só a fazer em Fevereiro (e aguentar as dores até lá), lembrei-me muito de algo que ela me dizia, sempre que eu tinha crises de pânico à custa dos médicos. Dizia-me: "nisso não sais nada a mim! Eu sempre enfrentei tudo sem medo: o que tem de ser, tem de ser!" Afirmava sempre isto com ar determinado e peito cheio, com uma mão cheia de experiências que o comprovavam: a cirurgia ao coração (de peito aberto), a cirurgia à anca, ter tido os filhos sozinha em casa.
Foi também nela que pensei quando, no último dia do ano, tomei a decisão de ser operada e, uma semana mais tarde, quando ia a caminho do bloco, de olhos fechados e as mãos juntas ao peito. Quis ser corajosa como ela sempre fora. E sei que hoje, ao lado daquela velinha bem cheirosa que lhe comprei, ela está orgulhosa de mim. Porque "o que tem de ser, tem de ser".